Em 1964, eu estava um dia na lateral do gramado em Álvares Chaves, campo do Fluminense, que seria campeão carioca naquele ano. Era manhã de treino coletivo, que acontecia em geral às quartas e sextas feiras.
A meu lado, Elba de Pádua Lima, mais conhecido como Tim, grande jogador no passado e naqueles dias técnico do Fluminense, observava o que se passava em campo, depois de ter instruído o time.
De repente, quase que falando para si mesmo, ele disse:
"Enquanto a bola está com seu time, não está com o time adversário."
Ora, amigos, digam-me se isto não é, sem tirar nem por, a filosofia do "tiki-taka", da posse de bola, que consagrou Pep Guardiola como um dos maiores técnicos de todas as gerações.
Certa vez, em uma entrevista, Guardiola descreveu o gol que mais gostaria de assistir: dez jogadores de seu time trocando passes, de pé em pé, sem o adversário tocar na bola, até ela chegar ao 11° companheiro, que simplesmente a empurrava para as redes vazias.
Tenho certeza de que Tim diria a mesma coisa.
O futebol mudou muito em preparo físico, em material, desde a bola até as chuteiras ultra leves e as camisas que "respiram", sem grudarem, ensopadas de suor, no corpo dos jogadores, mas sua essência pode ser resumida nesta simples verdade: "enquanto a bola está com seu time, não está com o time adversário".
Mas vou recuar ainda mais no tempo, até 1962, ainda no campo do Fluminense, mas com o time, naquela ocasião, sob o comando de outro famoso ex-jogador e, naquele momento, técnico consagrado: Zezé Moreira.
Ele dizia, a mim e a quem mais estivesse disposto a ouvir: "a defesa nunca deve sair jogando com passe paralelo à sua grande área".
Simples, não? Mas quantas vezes, ao longo dos anos, da décadas e provavelmente até dos séculos, não seremos obrigados a ver times punidos por este erro elementar, ainda mais agora quando técnicos exigem que seus goleiros saiam jogando com os pés?
Quem terá esquecido o catastrófico passe paralelo à nossa grande área com que Toninho Cerezo presenteou Paolo Rossi naquela fatídica derrota do Brasil para a Itália em 1982?
E, entretanto, não foi também o que se viu ontem, 40 anos depois, pelas quartas-de-final da Champions League, quando o goleiro Édouard Mendy, do Chelsea, sepultou as esperanças de reação de seu time antes mesmo de completar-se o primeiro minuto do segundo tempo?
Postos à parte os méritos do Real Madrid e de seu centroavante Karim Benzema, o Chelsea tinha diminuído o marcador desfavorável de 2 a 0 para 2 a 1 no fim do primeiro tempo.
O time entusiasmou-se e creio que o técnico Thomas Tuchel deve ter traçado planos táticos para serem usados depois do reinício da partida.
Mas que táticas podem superar um erro como aquele? Édouard Mendy está com a bola nos pés, o time do Real Madrid está recuado, Rüdiger, o zagueiro do Chelsea, está a três metros de Mendy, exatamente na mesma linha.
A linha paralela à grande área.
Vem o passe de Mendy para Rüdiger, passe que é interceptado por um atento Benzema. Ele marca o terceiro gol, terceiro gol seu e de seu time, praticamente decretando o sepultamento de qualquer reação do Chelsea.
Méritos, evidentemente, para Karim Benzema, um extraordinário atacante, que sempre foi bom, excelente mesmo, mas que começou a aparecer mais, a brilhar mais, depois que Cristiano Ronaldo saiu do Real Madrid.
Mas há verdades que não mudam em futebol. A posse de bola é fundamental. Começar o jogo a partir da defesa com um passe paralelo à grande área é fatal.
E eu poderia acrescentar outra: em matéria de Champions League, o Real Madrid é uma presença letal.
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Brasil Copa70 e José Inácio Werneck