40 anos de uma virada: da proibição do futebol feminino à Copa do Mundo 2023

Seleção Brasileira chega à disputa na Austrália quatro décadas depois de ter a prática futebolística liberada e regulamentada em seu território

Escrito por

A Seleção Brasileira estreia nesta segunda-feira na Copa do Mundo Feminina de 2023 em busca de um sonho. O tão esperado troféu mundial, que esteve próximo em algumas outras ocasiões, será o objetivo da jornada na Austrália e na Nova Zelândia. A estreia será contra a equipe do Panamá, às 8h (horário de Brasília).

Sob o comando de uma das melhores treinadoras do mundo e com uma estruturação cada vez mais evoluída, as Guerreiras do Brasil de hoje são fruto de uma longa história, que passa por barreiras sociais, políticas e legislativas. Vencendo o machismo, o preconceito e o destratamento, o futebol feminino no país, de dribles, gols e jogadas plásticas, teve que driblar também alguns paradigmas em mais de 100 anos de história. Por isso, o Lance! preparou um especial contando a história do esporte da bola esférica no âmbito feminino no Brasil.

+ Torça pela nossa Seleção Feminina com camisas a partir de R$29,90

QUANDO TUDO COMEÇOU
Após a popularização paulatina do esporte, durante a década de 1910, as mulheres também se interessaram em começar a jogar futebol. A primeira partida oficial aconteceu em 26 de junho de 1921, quando, em uma celebração de festa junina, as senhoritas tremembeenses enfrentaram o time das senhoritas catarinenses na Zona Norte de São Paulo. Porém, este não é o ponto de partida do futebol feminino, já que, antes desta data, mulheres já praticavam o futebol.

Há indicadores da prática no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Norte e em São Paulo já entre os anos de 1915 e 1920. Porém, tudo era visto como uma forma de entretenimento e não como um esporte em si. O panorama era diferente da esfera masculina, já que havia um grande incentivo à prática e já existiam grandes clubes no país, além de campeonatos estaduais ganhando forma.

+ ANÁLISE: o que esperar da Seleção Brasileira na Copa do Mundo Feminina?

DISPUTA NA LEGISLAÇÃO
Com a popularização da prática entre as mulheres, as autoridades viram na situação um problema. Depois de 20 anos da primeira partida tida como oficial, o então presidente em exercício, Getúlio Vargas, vivia a época ditatorial do Estado Novo e decidiu agir. Apesar de ter sido o primeiro a permitir o voto feminino no país - decisão tomada em 1932 -, Vargas baixou o Decreto-Lei 3.199 em 1941, que no artigo 54, impedia as mulheres de praticar certas modalidades esportivas, como o futebol, por ser “incompatível com as condições da natureza feminina”.

A decisão não chocou em nada a sociedade da época, mas viria a refletir nas gerações posteriores. A decisão basicamente criou um legado preconceituoso no qual considera-se que o futebol é um esporte de homens e que não é para mulheres. Frases como "chuta que nem homem", "para jogar tem que ser macho" e "mulher tem que brincar de boneca" surgiram a partir dos pensamentos machistas da época. Porém, há registros de que, mesmo assim, times femininos existiam, disputavam competições e não ligavam para a proibição governamental. Tomada corajosa de decisão que, querendo ou não, impediu um atraso ainda mais exorbitante no futebol feminino.

Manchete de um jornal exposto no Museu do Futebol, em São Paulo (Foto: Reprodução)

O fim do decreto viria quase 40 anos depois, em 1979, já nos últimos anos da Ditadura Militar. Porém a regulamentação oficial do esporte no Brasil só viria em 1983, exatas quatro décadas atrás. Isso só foi possível graças à luta de jogadoras e à relevância da prática no cenário internacional. A partir deste ano, o panorama mudaria no futebol feminino.

+ Conheça a história da Seleção Brasileira na Copa do Mundo Feminina

DIFICULDADES INICIAIS
Com um atraso de 40 anos, o futebol feminino passou por diversas complicações em seus primeiros passos. Times como o Radar e o Saad começaram a surgir e dar base para o que, em 1988, formaria a primeira Seleção Brasileira. Três anos depois, o primeiro Mundial, ainda com um time cru, viu uma vitória surpreendente sobre o Japão, por 1 a 0, com gol de Elana. A geração das Pioneiras, como são conhecidas até hoje, viria a perder seus jogos seguintes, mas desatar alguns nós que viriam a gerar grandes craques nos anos seguintes.

A visibilidade da competição aumentaria nas edições posteriores. Craques como Formiga, Sissi, Cristiane, Pretinha, Katia Cilene, Roseli e Maycon fizeram uma grande jornada ao longo dos anos. Além destas, o crescimento do esporte no Brasil passa pela rainha Marta. Maior artilheira da história das Copas - somando masculino e feminino -, seis vezes Bola de Ouro e principal marcadora da edição de 2007, a habilidade e encantamento de uma genial jogadora fizeram o público voltar seus olhos para o futebol feminino cada vez mais nos últimos vinte anos.

Seleção Feminina celebra gol em amistoso (Foto: Thais Magalhães/CBF)

Hoje, a Seleção Brasileira conta como uma grande estrutura. A liga nacional tem crescido em tamanho e visibilidade, além de times melhores e mais preparados. A experiente treinadora Pia Sundhage mudou um pouco a cara da equipe, fez surgir novas jogadoras jovens e uma geração que está em processo de crescimento. Ainda há atraso, ainda há machismo e ainda há preconceito, mas para quem um dia respirou por aparelhos, viver a oportunidade de marcar o seu nome e, como afirma o lema da Copa do Mundo de 2023, correr "atrás da grandeza", é um privilégio.

+ !Bom para o Brasil! França não sai do zero com a Jamaica em estreia na Copa do Mundo feminina

JORNADA NA COPA DO MUNDO
A trajetória da Seleção de Pia Sundhage nesta Copa do Mundo de 2023 começará na próxima segunda-feira (24), frente ao Panamá. Cinco dias depois, a equipe enfrentará a França, carrasco do último Mundial; no dia 2 de agosto, as Guerreiras do Brasil decidem a fase de grupos contra a Jamaica.

Siga o Lance! no Google News