Contas, vendas e ‘sacrifícios’: diretor financeiro do Corinthians abre o jogo
Em entrevista ao LANCE!, Emerson Piovezan explica detalhes da busca do Corinthians por saúde financeira, defende gestão de Roberto de Andrade e já planeja recursos por reforços
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O momento do Corinthians não é dos mais promissores dentro de campo. O time que foi líder do Brasileirão há 12 rodadas hoje é nono colocado – está nove pontos atrás do G4 e, mesmo com as duas novas vagas abertas, segue em desvantagem de três pontos em relação ao grupo dos seis primeiros que vão para a Libertadores de 2017 – a Copa do Brasil, ao menos, é uma esperança. Fora de campo, porém, a situação parece mais clara, com as contas mais equilibradas.
Ao menos é este o diagnóstico de Emerson Piovezan, diretor financeiro do Corinthians, que concedeu longa entrevista ao LANCE!, na qual dá detalhes da busca do clube por saúde financeira, defende a gestão do presidente Roberto de Andrade e revela que já há planejamento para investimentos em jogadores no ano que vem. O dirigente, no entanto, faz questão de diferenciar “loucuras financeiras” de “sacrifícios financeiros”. O objetivo da direção, segundo Piovezan, é garantir um 2017 melhor para a Fiel.
– Se for preciso fazer um sacrifício aqui ou ali, vamos fazer para ter um time competitivo. Mas sem loucuras, não vamos trazer o fulano que custa R$ 40 milhões – avisa o diretor, que entre janeiro e maio de 2016 auxiliou o Timão a reduzir a dívida de R$ 393 milhões a R$ 344 milhões. O que vem pela frente?
BATE-BOLA com EMERSON PIOVEZAN
DIRETOR FINANCEIRO DO TIMÃO, AO L!
Como a atual gestão encontrou o clube financeiramente?
O Corinthians tinha problemas sérios quando assumimos. Encontramos o clube em situação difícil em função de vários problemas, mas não vou ficar relatando porque não muda nada, temos de olhar para frente. Tínhamos atrasos, despesas maiores que receitas... Havia atrasos de direitos de imagem, pagamentos a fornecedores, premiações. Aí começamos a desenvolver uma série de ações pela reestruturação, para conseguirmos pelo menos conhecer a real situação que estávamos pegando e aí tomar ações pontuais para diminuir o nosso déficit.
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'Nós não tínhamos condição de manter o Guerrero naquelas condições e valores em 2015, bem como foi com o Emerson Sheik. Ali começou o processo de busca pelo equilíbrio financeiro. As demais saídas não foram nessa linha, mas na de que vieram propostas que foram irrecusáveis', diz o diretor financeiro
Que tipo de ação vocês fizeram para deter o aumento da dívida e controlar as contas?
Contratamos uma auditoria nova, que identificou focos de problemas e passamos a trabalhar em cima deles. Começamos uma reforma estrutural e reduzimos pessoas, que era necessário naquele momento. Isso tudo na parte administrativa e social. Começamos a discutir custo de iluminação, água, fizemos revisão de contratos, renegociamos acordos com prestadores de serviços, discutimos multas e juros de atrasos a fornecedores... Os sintomas disso foram aparecer só no começo deste ano. E em paralelo começamos a implantar um sistema de grande porte, ERP (em inglês, planejamento de recursos da empresa, um sistema de informática responsável por cuidar de todas as operações diárias), que já era uma meta do Roberto de Andrade (presidente do clube). O antigo sistema já não suportava mais o crescimento do clube, que precisava de algo potente e sofisticado, para integrar informações do clube. Só estamos conseguindo isso agora. Investimos em software, equipamento, modernizamos toda a parte de TI... Tudo isso para obter um controle maior do que tínhamos de despesas, receitas, o clube como um todo. E por aí foi, seguimos melhorando a infraestrutura para o clube ter uma gestão o mais profissional possível.
E no futebol, que é o carro-chefe do clube, como foi a adaptação?
Teve aquele primeiro evento, que foi o Guerrero. Não tínhamos condição de mantê-lo naquelas condições e valores, bem como o Emerson Sheik. Ali começou o processo de busca pelo equilíbrio financeiro. As demais saídas não foram nessa linha, mas na de que vieram propostas irrecusáveis, como Renato Augusto, Jadson... Não tínhamos nem como pensar em igualar as propostas recebidas.
Então não era uma necessidade vender tantos jogadores assim?
Em nenhum momento a gente precisava vender jogadores, mas era preciso equilibrar despesas e receitas. E isso não quer dizer só cortar. Em uma empresa, você quebra se só cortar. A gente foi buscar mais receita, como patrocínio, para bancar o que tínhamos. Só que chegou proposta e o jogador tem total direito de aceitar, não tem como prender o atleta aqui.
O Corinthians brigou para manter todos os jogadores que saíram? São 20 transferências...
Cada jogador é uma situação. Teve situações em que não conseguiríamos brigar. Posso citar aqui alguns casos. A gente só tinha o Renato Augusto, por exemplo, porque lá atrás fizemos um acordo com o Bayer Leverkusen (ALE) para que, se chegasse proposta, tinha que vender, era quase um empréstimo. Eu iria falar não? Era contratual. E não dava para cobrir. Esse é um caso, mas tem outros. O Vagner Love veio e não gastamos um centavo, mas ele falou que se chegasse uma proposta de 1 milhão de euros ele iria embora. Apareceu, o que a gente poderia fazer? O Ralf fez um um pré-contrato e só recebemos graças a isso. Não é questão de não brigar, a gente conseguiria segurar alguns jogadores, mas não cabe a nós. Brigamos para manter o Bruno Henrique, mas ele tinha passaporte italiano, família lá e quis ir embora.
'Não consigo te falar quanto vou gastar (em 2017), porque depende muito. Mas a diferença entre loucura e sacrifício é a capacidade que temos de pagar. Apareceu um jogador interessante, queremos, ele vai tornar o time competitivo, aí vemos quanto custa, tentamos buscar patrocínio, enfim...', diz Piovezan
E nenhum dos transferidos quis ficar no Corinthians em 2016?
O difícil é conseguir fazer com que o jogador fique. Se você tem uma condição financeira totalmente favorável, tudo bem. Mas o jogador fala: “Vou ganhar um milhão. Quantos vocês vão me dar? 300? Obrigado!”.
Como clubes como o Santos, por exemplo, seguraram alguns de seus principais jogadores?
Tudo isso faz parte de um contexto. Com o Santos, que você deu como exemplo, foi outro tipo de estratégia. É difícil avaliar. Não posso falar se estamos acertando ou errando. Se você traz um jogador, já corre risco.
Todo o dinheiro das vendas foi para pagar dívidas do clube?
Foi para o regime de caixa. Por exemplo: tenho R$ 10 milhões em patrocínio. Vai para o caixa. Mais R$ 10 milhões com venda. Vai para o caixa... Aí apareceu um jogador que quero contratar, de R$ 20 milhões. Pego do caixa. Eu não tenho separado quanto vou gastar só para contratar jogador. Como agora, temos necessidade de melhorar o time, ter uma equipe competitiva, até porque não adianta só cortar despesa, se não tiver time competitivo, não tem patrocínio, perde Fiel torcedor... É como numa empresa. Se você corta funcionário, deixa de vender, de produzir... Aqui é a mesma coisa. O futebol é carro-chefe, precisamos ter time competitivo e vamos buscar isso. De que forma? Estamos fazendo planejamento, mas isso não compete a mim e, sim, ao departamento de futebol do clube.
Já existe uma perspectiva de gastos do futebol para 2017, um planejamento em execução?
Sim, sem dúvida alguma. A gente está pensando, o que precisamos, há um trabalho com atletas mapeados, conversas iniciais com empresários... isso existe, mas eu não participo. Não definimos quanto vai ser gasto, porque não adianta falar antes. Hoje você tem vários formatos para contratar um atleta, pode ser por empréstimo, compra parcelada... Isso dentro do fluxo de caixa. Mas vamos buscar. Se for preciso fazer um sacrifício aqui ou ali, vamos fazer para ter um time competitivo. Mas sem loucura, não vamos trazer o fulano que custa R$ 40 milhões. Além disso tudo estamos indo atrás de patrocínios melhores, outras receitas que possam vir compor. Não adianta só cortar, preciso buscar novas receitas. Não consigo te falar quanto vou gastar, porque depende muito. Mas a diferença entre loucura e sacrifício é a capacidade que temos de pagar. Apareceu jogador interessante, queremos, ele vai tornar o time competitivo, aí vemos quanto custa, tentamos buscar patrocínio, enfim...
Como se fosse uma estratégia diferenciada de marketing?
Como o Guerrero foi para o Flamengo? Vocês noticiaram que foi um patrocínio que arcou com o custo desse atleta. Por que nós não podemos? Como o Ronaldo veio para cá? Tudo isso vem de marketing e das partes que negociamos, como direitos de transmissão, pay-per-view, Fiel torcedor, que aumenta quando temos time competitivo. Vários elementos.
Isso faz parte da busca pela saúde financeira do clube?
Pegamos o clube com R$ 120 milhões de valores a honrar em curto prazo e uma Arena para administrar sem receita de bilheteria. Podem falar o que for, mas o que estamos trabalhando aqui para manter isso, o que o Roberto está fazendo e sendo injustiçado como pior presidente da história é uma grandeza. Ele se propôs a deixar um legado de saúde financeira. Salários religiosamente em dia e tributos também. Hoje não se atrasa nada. Não temos um centavo de atraso. É tudo contado, correto e documentado dentro da possibilidade.
A gestão Roberto de Andrade antecipou alguma cota para poder honrar compromissos?
Pedimos ano passado a antecipação do pay-per-view. Era um valor para janeiro e fevereiro e antecipamos para novembro por causa das três folhas de pagamento.
Qual o impacto financeiro que o Corinthians vai sofrer caso não consiga se classificar para a Libertadores do ano que vem?
Para o clube em si, o reflexo é a nível de patrocínio, talvez dificulte um pouco mais. Mas o grande problema são as contas da Arena, de no mínimo três jogos cheios, o que é altamente significativo dentro do nosso modelo. Aí faz falta. Para o clube em si, da mesma forma que o Fiel Torcedor cai, dois meses depois sobe se o time for bem no Paulista, é cíclico. Pay-per-view é a mesma coisa. Mas renda não, bilheteria não, e outras propriedades: posso vender patrocínio específico na Libertadores... Isso faz diferença. Premiação, cota de Libertadores, isso dá para empatar. Não vejo grandes problemas. Mas em nível de receita, sim. Não só isso, mas também deixar de participar de finais, Copa do Brasil, é tudo significativo. Em qualquer circunstância, tendo lucro ou prejuízo, temos que ser competitivos. Porque somos um clube grande, de tradição. E eu sou torcedor, quero ganhar.
Em meio às críticas que você mesmo mencionou, qual recado é possível deixar para o torcedor corintiano neste momento?
A mensagem é de que hoje a saúde financeira do clube é muito melhor do que quando a gestão começou e a tendência é ter um ano (2017) melhor, que nos permita ir em busca de um time competitivo. Essa saúde financeira permite mais tranquilidade para analisar em busca de recursos e de atletas que formem um elenco competitivo. Mais do que foi neste ano.
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