Bola levantada por Zé Maria na área que resvala na cabeça de Basílio e sobra para Vaguinho bater de esquerda. A bola bate no travessão e volta para Wladimir, que cabeceia com firmeza, mas em cima do zagueiro Oscar. No rebote, Basílio enche o pé e estufa as redes do Morumbi. Corintiano que é corintiano já viu esse lance trocentas vezes. É o gol que marcou a conquista do Paulistão de 1977, que encerrou um jejum de 22 anos, oito meses e sete dias sem conquistas importantes do time mais popular do Estado.
O título que marcou o fim do prolongado sofrimento e até hoje é lembrado como uma das conquistas mais importantes da história do Corinthians completa 40 anos nesta sexta-feira, 13 de outubro de 2017. Muitas histórias já foram contadas ao longo das décadas sobre o feito que "enche de lágrimas os olhos desse povo e enche de felicidade o coração dessa gente", na inesquecível narração de Osmar Santos.
Por isso, o LANCE! ouviu personagens e buscou histórias desconhecidas (ou mesmo pouco conhecidas) a respeito do Paulistão de 1977. Ou você sabia que um jogador trancou a faculdade para se dedicar à campanha vencedora? E que muitas pessoas atribuem ao médium Robério de Ogum uma parcela do título? Você sabe qual filme foi usado na preleção e motivou os jogadores? Sabe quem é o jogador que tentou fugir da concentração antes do título?
Descubra abaixo sete curiosidades do título da libertação corintiana. Ou, como diz o clube nas ações em homenagem ao feito, 1977 vive!
1 - Corinthians conquistou títulos durante a fila. Oi?
Na verdade, o Corinthians não ficou quase 23 anos na fila. Entre 1954 e 1977, anos de títulos estaduais marcantes, o suposto jejum foi interrompido por uma série de títulos de menor importância. Mas ainda assim títulos. Em 1955 veio o Torneio Internacional Charles Miller contra o Benfica (POR), no ano seguinte a Copa do Atlântico e depois taças como o Torneio de Brasília, o Pentagonal do Recife, a Taça Piratininga, o Torneio Costa do Sol... Ao todo, foram 15 títulos nacionais e seis taças fora do país. Nenhum deles, no entanto, com o peso que tinha o Campeonato Paulista naquela época.
2 - Oswaldo Brandão resolveu crise na base da conversa
O Campeonato Paulista de 1977 foi decidido em três turnos antes da final. O terceiro turno contava, além da Ponte Preta, com Santos, Palmeiras, São Paulo, Guarani, Botafogo e Portuguesa, e os dois melhores na disputa todos contra todos avançavam. O Corinthians não começou bem. Foram três pontos nas primeiras três partidas, restando apenas quatro jogos até o fim. A eliminação parecia iminente e se tornou ainda mais clara com uma derrota por 1 a 0 para o Guarani no quarto jogo. O resultado deixou todos os jogadores abatidos. Pelo visto, um novo fracasso se aproximava.
Revoltava com o vexame, a diretoria representada pelo presidente Vicente Matheus, o vice Isidoro Matheus e os diretores Leonel Marconi e Aloísio Santos entrou no vestiário para distribuir broncas, mas o técnico Oswaldo Brandão interrompeu o ato antes mesmo de ele começar. De acordo com relatos, o treinador anunciou ao grupo o cancelamento da folga do dia seguinte para que houvesse treino para titulares ou reservas. Ele ainda teria dito: "Aqueles que acham que não dá mais para se classificar nem precisam ir treinar". Todos foram, o desafio esfriou os ânimos e o Corinthians venceu Botafogo, Portuguesa e São Paulo até se classificar para a decisão.
3 - Teve jogador que fugiu da concentração antes da decisão!
O título do Campeonato Paulista era decidido em formato melhor de três jogos. Mesmo desfalcado o Corinthians venceu o primeiro por 1 a 0 e bastava uma vitória no segundo jogo para evitar o terceiro e garantir o título. Oswaldo Brandão queria repetir a tática e a escalação do primeiro jogo, em que não contou com o ponta Vaguinho, que havia cumprido suspensão. Para repetir o time, no entanto, era necessário que Vaguinho seguisse fora e Basílio fosse mantido como titular. Aí Brandão foi ao quarto de Vaguinho na concentração dizer que ele havia perdido a posição de titular. O novo reseva não aceitou a condição. Mal Brandão deixou o quarto ele já arrumou as malas a caminho da portaria do hotel.
Revoltado com a decisão do treinador, Vaguinho pediu um táxi para ir embora da concentração, mas a recepção já estava avisada de que não era para deixar ninguém ir embora. A desculpa oficial, então, foi que não havia nenhum veículo disponível. Vaguinho, então, ligou para Maria do Carmo, sua esposa, que começou a desfazer seus pensamentos de fugir da concentração: "Se você abandonar a concentração e o time perder você será responsabilizado. E se houver uma vitória você será esquecido e desvalorizado". Vaguinho ficou. Foi para o banco de reservas e acabou entrando. Fez o gol de honra do Corinthians na derrota por 2 a 1 do segundo jogo. O gol que manteve o Timão vivo.
- Após o jantar na véspera do terceiro jogo reunimos os concentrados em um dos salões do hotel para assistirem à projeção de um filme que tinha uma mensagem referente ao que estávamos passando naquele momento. Sentido de mentalização. "Como se faz um campeão?". Três corredores recordistas, mas em competições diferentes. Iriam participar de uma prova onde seriam comparados. EUA, Inglaterra e Alemanha. Reta final empatados, até que um passa. "Era emocionante ver-se quão difícil era liderar e ganhar uma competição, quando os adversários se equivalem". Todos emocionados.
4 - Um filme foi exibido aos jogadores e serviu de motivação
Na véspera do terceiro jogo, após o jantar realizado na concentração, a comissão técnica reuniu o grupo de jogadores em um dos salões do hotel para assistirem a um filme motivacional. A ideia era exibir algo que tivesse uma mensagem referente ao que o elenco estava passando, entre contestações e dúvidas. O filme escolhido foi "Como se faz um campeão?", em que três corredores recordistas de Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha participam de uma prova em que seriam comparados entre si. Os três estão empatados até a reta final, até que um deles toma a dianteira e vence. O filme não é encontrado na internet, mas emocionou a todos os corintianos em 1977.
5 - Um jogador trancou a faculdade para se dedicar ao time
Os 806 jogos tornaram Wladimir o jogador que mais defendeu o Corinthians na história, em recorde que dificilmente será batido. A trajetória no futebol, porém, foi dividida com os estudos até... 1977. O jogador estava no último ano do curso de Educação Física na Faculdade do Clube Náutico Mogiano, em Mogi das Cruzes, mas a classificação do Corinthians para as fases mais avançadas e depois o título impediram que ele frequentasse as aulas. Para não bombar ele trancou o curso na metade do ano. Sorte que depois foi campeão estadual.
6 - Título teve união de magia e ciência nos bastidores
Magia e ciência se uniram para que o Corinthians fosse campeão paulista de 1977 na pele do médium Robério de Ogum e do preparador físico José Teixeira.
O guru, que anos mais tarde trabalharia lado a lado com o técnico Vanderlei Luxemburgo se tornou protagonista do cenário esportivo no ano do fim do jejum corintiano. Na ocasião, ele teria desenterrado um sapo no gramado da Fazendinha, que fica no Parque São Jorge, local de treinos do Corinthians. Era atrás de um gol. Robério de Ogum identificou as forças maléficas e retirou de lá a ossada do animal que atrapalhava os caminhos do Timão por um título. O médium ainda teria conversado com Oswaldo Brandão recomendando a escalação de Basílio, que estava em um período mais profícuo.
A ciência entrou em campo por meio da ciclobiologia. O Corinthians jamais havia realizado um trabalho tão forte de preparação para competições como foi em 1977, com mapeamento de informações de jogadores e novos métodos de treino. José Teixeira, preparador físico naquela conquista, estabeleceu a tal ciclobiologia, que é uma mistura de estatística e astrologia que diz que a vida e os comportamentos de uma pessoa são influenciadas pela data e hora de seu nascimento e as posições dos planetas. Um caso emblemático de uso desse estudo foi quando Teixeira notou que Rui Rei estaria em um dia crítico na final do Paulista por conta desse alinhamento planetário. Por isso, o Corinthians entrou com o propósito de irritar o jogador da Ponte Preta contratando um falso repórter para fazer perguntas sem sentido e incomodando o jogador com ameaças e faltas em campo. Rui Rei foi expulso no começo do jogo e o Corinthians venceu.
7 - Campanha marcou recorde histórico de público
O maior público da história do Morumbi, e que dificilmente será batido, foi de 138.032 torcedores no segundo jogo entre Corinthians e Ponte Preta. No jogo final o público foi menor, mas pintou o estádio do São Paulo de preto e branco para celebrar o fim da fila. Naquele dia, os números do placar foram roubados e diversos setores do estádio danificados. Tanto é que o São Paulo, que foi campeão nacional naquele ano, só voltou a jogar no Morumbi na reta final do Brasileirão.