Há 38 anos, Chiquinho teve missão de socar Mario Soto, mas se negou: ‘Eu queria jogar bola’
Campeão da Libertadores pelo Flamengo em 1981, ex-jogador acumulou rusgas com Paulo César Carpegiani e rumou a Portugal, onde enfrentou um iniciante Jorge Jesus
Na noite do dia 23 de novembro de 1981, no Estádio Centenário, em Montevidéu, faltavam poucos minutos para o fim do jogo do Flamengo contra o Cobreloa, do Chile. Com a partida já liquidada pelo placar de 2 a 0 (gols de Zico) e o título Libertadores nas mãos, Paulo César Carpegiani lançou Chiquinho Carioca no lugar de Nunes. A missão era agredir Mario Soto, capitão da equipe adversária.
O zagueiro chileno havia socado jogadores rubro-negros no segundo jogo da final da competição, em Santiago, quando o Flamengo fora derrotado por 1 a 0. Na primeira partida, no Rio, a vitória havia sido dos brasileiros, por 2 a 1, com dois gols também de Zico. Chiquinho desferiu um violento soco em Soto, que deixou um corte nos dedos da sua mão. Os dois foram expulsos, a confusão se espalhou e houve até prisões.
Esta poderia ter sido a história real conhecida por muitos rubro-negros, não fosse a negativa de Chiquinho a Capergiani. Ao invés do niteroiense, Anselmo é quem entraria em campo em Montevidéu para fazer o serviço sujo, e seria tão festejado quanto o Galinho de Quintino na volta ao Brasil.
- Eu ia entrar no jogo contra o Crobeloa e o Carpegiani chamou o Anselmo para entrar e dar um soco no Mario Soto. Eu não tinha condições de fazer isso, eu queria jogar futebol. Eu ia entrar no jogo e ele preferiu colocar o Anselmo em detrimento a mim, para poder dar o soco no Mario Soto - conta Chiquinho Carioca, com exclusividade ao LANCE!.
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A Libertadores daquele ano teve apenas três fases. A primeira, com 20 times espalhados em cinco grupos, dos quais seis classificados seriam divididos em duas chaves na segunda fase. Flamengo e Cobreloa foram os líderes de seus grupos e fizeram a final.
Ao todo, o Rubro-negro fez 13 jogos na competição. Chiquinho participou de oito, sendo quatro como titular - todos na fase semifinal. Foram dois gols marcados, ambos no Maracanã. Ele foi o quinto melhor marcador da equipe naquela edição, à frente de Tita, por exemplo, que só marcou um.
- Eu comecei o ano como titular, tanto que o camisa 7 da Libertadores era eu. Comecei porque o Tita não queria jogar de ponta. No início da competição eu comecei jogando pela direita com o Baroninho pela esquerda. Depois que chegou o Carpegiani, ele mudou o esquema e o sistema de jogo. O Flamengo jogava com Tita e com o Lico, como se fosse um 4-4-2. É parecido com o sistema de jogo do Flamengo atual - afirma.
CORTADO DE RELAÇÃO PARA O MUNDIAL
Apesar da boa contribuição, a relação com Paulo César Carpegiani não era das melhores. Rusgas durante treinamentos e conflitos de ego resultaram na não ida de Chiquinho ao Japão no final do ano, para o Mundial Interclubes. Para ele, a recusa a dar o soco em Mario Soto foi apenas um dos fatores que resultaram no veto.
- Aconteceram outras coisas entre eu e o Carpegiani que podem ter pesado na hora da escolha de quem iria para o Mundial. Muitos jogadores que foram ao Mundial nem eram jogadores do Flamengo, estavam emprestados. Eu era jogador do Flamengo e não fui. Inclusive, o Domingos Bosco, que era o supervisor, me garantiu que eu iria ao Mundial por ser jogador do Flamengo. No entanto, na última hora, eu não fui relacionado - disse.
Chiquinho garante não guardar mágoas do Rubro-negro por não ter tido a chance de ser campeão mundial. Em relação ao treinador, porém, o acerto de contas parece nunca ter ocorrido.
- Mágoa com o Flamengo? Nunca. Acho que o responsável pela escalação era o treinador. Se o treinador não escala, fazer o que? Eu sempre fui profissional de futebol e respeitei a decisão, principalmente, do treinador. A minha relação com ele não ficou boa, tanto que eu deixei o Flamengo. Tive um problema com ele até em campo, em um treino. Havia vários clubes interessados. Antes desse episódio, era para eu ter ido pro América-RJ. Não fui porque o Carpegiani me disse para ficar, que eu era um dos jogadores mais utilizados. Acabei ficando. Duas semanas depois ele contrata um da minha posição e começa e me afastar. Daí em diante nossa relação não foi das melhores - lembra.
ENCONTRO COM JORGE JESUS
Da Gávea, Chiquinho seguiu para o Brinco da Princesa, onde fez parte da geração de Tite (hoje treinador da Seleção Brasileira), Ricardo Rocha, Evair, João Paulo e companhia, que chegou à final do Campeonato Brasileiro de 1986. No meio do ano seguinte, a carreira continuaria em Portugal. Até o Feirense, clube pelo qual, em 1992, enfrentaria o Filgueiras de um Jorge Jesus dando os primeiros passos como treinador.
- Eu estava em final de carreira como jogador, no Feirense. Nós disputamos a segunda divisão B, que dava acesso para Segunda Liga. Ele (Jorge Jesus) estava começando a carreira de técnico, no Felgueiras, e o clube já tinha uma parceria com Benfica e Sporting. Lá acontece muito isso, equipes maiores que emprestam jogadores para parceiros disputarem em divisões anteriores. Assim como o Tite, ele foi jogador e tem o conhecimento de dentro da teoria e da prática, assim ele se torna um treinador de sucesso como é hoje - conta.
A opinião é de quem também tem experiência como técnico. Após encerrar a carreira de jogador, Chiquinho comandou equipes pequenas de Portugal até retornar ao Rio de Janeiro. A última equipe que comandou foi o São Gonçalo FC, em 2015.
- Tive poucas oportunidades no Brasil, mas me considero capaz de treinar qualquer equipe no país - afirmou.
L!: QUEM É ELE
Nome: Francisco José Marques do Couto
Nascimento: 11/12/1959 (59 anos), em Niterói-RJ
Times como jogador: Olaria, Fortaleza, Flamengo, Sport, Guarani, Boavista, União de Leiria, Deportivo Aves, Feirense, Vila Real
Times como técnico: Cesarense, Arrifanense, Vila Real, Feirense, Paços de Brandão, Cucujães, Várzea-RJ, Itaboraí, Serra Macaense, São Gonçalo FC
TÍTULOS
Olaria: Taça Bronze (1981)
Flamengo: Campeonato Carioca (1981), Taça Guanabara (1981), Campeonato Brasileiro (1982), Copa Libertadores da América (1981), Mundial (1981)
Guarani: Vice-campeão brasileiro (1986)
A reportagem buscou entrar em contato com Paulo César Carpegiani para dar direito de resposta ao treinador campeão da Libertadores 1981 por algumas histórias, mas não teve sucesso.