O deputado federal Eduardo Bolsonaro decidiu participar da discussão entre Caio Ribeiro e Walter Casagrande. O político acusou a Globo de "favorecer esquerdistas”, apoiou Caio e classificou Casão como “militante comunista”. E o rótulo imposto ao ex-camisa 9 do Corinthians ganhou coro nas redes sociais. O LANCE! escutou especialistas que analisaram declarações do ex-atleta para verificar se ele teria algum real envolvimento ideológico com o comunismo.
- Eduardo Bolsonaro critica Casagrande usando critérios subjetivos. Os argumentos do ex-jogador vão em direção à liberdade de expressão. Não faz sentido classificar o Casagrande como comunista por essas falas, pois em nenhum momento ele menciona abolição da propriedade privada ou do controle do Estado dos meios de produção e de distribuição - avaliou Eduardo Ferraz Fellipe, doutor em História e professor da Uerj.
A polêmica teve início após Caio Ribeiro criticar Raí, diretor do São Paulo, por se manifestar politicamente contra o presidente Jair Bolsonaro. O ídolo do Timão contestou o companheiro do Grupo Globo e disse que, em um regime democrático, todas as pessoas poderiam e deveriam expressar as suas opiniões livremente, independentemente da profissão e sem censura.
- Há um marco referencial: a liberdade de expressão. Esta postura evidencia que ele está muito mais próximo da social democracia, de matriz liberal, à moda franco-alemã, do que de qualquer expressão histórica do comunismo - apontou o cientista político Lier Pires Ferreira, PhD em Direito e professor do Ibemec.
O passado de Casagrande carrega posicionamentos e atitudes ele dentro dos gramados por vozes censuradas na década de 1980, enquanto o país vivia em uma ditadura militar, entre 1964 e 1985, que ficou conhecida como “Democracia Corintiana”. As ações que o fizeram possivelmente ganhar o rótulo de “comunista” anos depois.
- Em resumo, “esquerda”, para o referido deputado, é todo aquele que não concorda com os rumos do Executivo, ditados pelo pai dele. Fora isso, tudo é “comunista” como Casagrande - aponta Eduardo Ferraz, que lembrou o tom pejorativo empregado ao termo político nesta década.
MAS CASAGRANDE É REALMENTE COMUNISTA?
O LANCE! levantou frases e ações de Casagrande que foram interpretadas, dentro de seus contextos, pelo cientista político Lier Pires Ferreira para tentar entender se o ex-atacante realmente é alinhado com a corrente política.
LANCE!: Em dezembro de 2019, Casagrande disse que os brasileiros necessitavam pensar mais em atitudes democráticas e lembrou: “Não é a Democracia Corintiana que deve ser colocada em pauta, é uma democracia nacional”.
Lier Pires Ferreira: A trajetória de Casagrande não se afina com qualquer das perspectivas (do comunismo) de modo que, no sentido filosófico, sociológico ou jurídico, não se pode afirmar que o popular Casão seja comunista. Ele tem sua trajetória político-desportiva ligada ao processo de redemocratização.
L!: Na década de 1980, o então atacante apoiou e viveu a ascensão política do Partido dos Trabalhadores antes do fim da ditadura militar. Embora nunca tenha se candidatado, o passado dele no PT justifica o termo?
Lier: O PT tem forte base sindical, na qual coexistem várias expressões político-ideológicas, como o comunismo, o anarquismo. O partido historicamente abraçou o socialismo democrático, sendo certo que, ao longo do tempo, inclinou-se para a social-democracia. Dessa forma, a identidade histórica de Casagrande ao PT em nada o credencia como comunista, uma vez que o próprio partido não pode ser classificado como tal.
L!: Entre campanhas e movimentos dentro dos gramados, Casagrande foi um dos grandes nomes do período neste sentido do fim do regime. Lutar contra a ditadura é um ato comunista?
Lier: A luta pela redemocratização agregou um amplo espectro político. No Brasil, está simbólica e politicamente situada entre o socialismo-democrático de Lula e o social-liberalismo de Ulisses Guimarães, e outros nomes como Leonardo Boff, Dom Evaristo Arns e Leonel Brizola, sem qualquer conexão significativa com o comunismo.
L!: Em 2018, enquanto fervilhava fora dos gramados a corrida presidencial no Brasil, Jadson, à época no Corinthians, e Felipe Melo, do Palmeiras, se mostraram apoiadores de Jair Bolsonaro. Casagrande, então, disse que todos têm o direito de opinar e refletiu a influência dos atleta aos torcedores. O que se pode tirar de conclusão desses posicionamentos?
Lier: Pelé até hoje é cobrado pela sua proximidade relativa com a ditadura. Casagrande e tantos outros são próximos do PT, da mesma forma que a atual secretária nacional de cultura, Regina Duarte, é face de adesão ao governo Jair Bolsonaro. Somos responsáveis pelas escolhas que fazemos. Mas isso não faz de Casagrande um comunista, assim como Felipe Melo e Jadson não necessariamente são fascistas.
*sob supervisão de Tadeu Rocha e Fabio Storino