A temporada 2014/15 ficará marcada para sempre na carreira de Jonathas de Jesus. O atacante chegou desconhecido ao pequeno Elche. Seria mais um clube a ter um brasileiro no futebol espanhol. Seria. Mas o jogador fez valer a aposta e despontou, brilhou e ajudou a equipe a permanecer na elite no país.
Não apenas salvou a pele do Elche. Jonathas marcou 14 gols no Campeonato Espanhol e deu oito assistências, sendo o segundo brasileiro com mais bolas na rede daquela temporada se contar as quatro principais ligas da Europa. Somente Neymar fez mais, mas ele atua pelo poderoso Barcelona, que viria a ser campeão nacional.
- Quando cheguei na Espanha, estava com muita confiança. O diretor do time foi a São Paulo, se reuniu comigo, depositou toda confiança, falou que iria dar certo e faria um grande campeonato, que me encaixaria muito bem no time. Foi um ano muito legal, que todo mundo conheceu o Jonathas de verdade - comemora, em entrevista ao LANCE!.
Atualmente, Jonathas atua pelo Rubin Kazan. A equipe não vem bem no Campeonato Russo, mas o atacante está mostrando mais uma vez seu faro de gol. Em 14 jogos, foi às redes em oito oportunidades. É o vice-artilheiro da competição, perdendo apenas para Smolov, do Krasnodar, que tem dez.
- Estou a dois gols do artilheiro, que já joga na Rússia há algumas temporadas, está adaptado ao campeonato. Ele leva vantagem nisso. O segredo é que fiz um bom início de temporada e coloquei na cabeça que quero ter um ano melhor do que no Elche - disse o brasileiro.
Jonathas de Jesus passou por diversos times no futebol europeu. A trajetória no Velho Continente começou no Az Alkmaar, da Holanda. Depois passou pelos italianos do Brescia, Pescara, Torino e Latina Calcio, antes de chegar ao Elche, onde teve o maior destaque. Do pequeno clube espanhol foi para a Real Sociedad antes de chegar ao Rubin Kazan. No Brasil, foi revelado pelo Cruzeiro, passando por empréstimo por Ipatinga e Villa Nova, também de Minas Gerais.
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Como vem sendo a sua adaptação no futebol russo, que tem cultura e estilo diferentes? O frio intenso também é um adversário a ser enfrentado?
A minha adaptação está sendo muito boa. Do presidente ao treinador, passando pelos jogadores e torcida, ninguém esperava uma adaptação tão boa, principalmente em relação ao frio. Há jogos em que não conseguimos render o esperado, pois a gente fica um pouco travado, a jogada não sai. Aí preferimos fazer o simples a arriscar. São coisas que precisamos nos adaptar. Mas vamos tirar de letra, pois a vontade de vencer tem que ser maior que os empecilhos que encontramos no caminho.
Você já passou pelo futebol italiano, espanhol, holandês e agora está na Rússia. Qual a diferença entre esses países?
O futebol, hoje, está muito competitivo, não há grande diferença. Todas as equipes estão se preparando muito, apesar dos estilos que cada país tem de jogo. O futebol italiano é mais brigado, com muitas disputas de bola. Na Holanda, é mais guerra. Todo lance é como se fosse o último. Na Espanha, é mais qualidade técnica, mais toque de bola. O futebol russo é mais contato, mas que me surpreendeu muito com a qualidade dos jogadores.
Você ficou mais conhecido pelos no Elche, da Espanha, sendo responsável por 62,8% dos gols do time na temporada 2014/15, participando de mais gols até do que CR7 no Real e Messi no Barcelona. Qual foi o segredo para o sucesso no time espanhol?
Quando cheguei na Espanha, estava com muita vontade. Depositaram muita confiança em mim. O diretor do time foi a São Paulo, se reuniu comigo, depositou toda confiança, falou que iria dar certo, faria um grande campeonato e que me encaixaria muito bem no time. Ele me queria no elenco. E fiquei muito balançado com isso e me convenceu. Não são todos os diretores que fazem isso, que saem do seu país e viajam longas distâncias para conversar com o jogador. Abracei o projeto, o treinador me ajudou muito, era um 'paizão'. Nos primeiros jogos, marquei gols, que me ajudaram a pegar ainda mais confiança. E começou e acabou bem, o Elche se livrou do rebaixamento. Foi um ano muito legal, que todo mundo conheceu o Jonathas de verdade.
Com 14 gols, você foi o segundo maior artilheiro brasileiro - atrás apenas de Neymar - na temporada 2014/15, contando as quatro principais ligas da Europa. Esperava esse rendimento?
Quando cheguei, queria apenas trabalhar, me adaptar ao jogo e ao país. Com o passar do tempo, fui melhorando. Nos treinos, fui percebendo que poderia ser importante para o Elche, que o time precisava de mim. Depois de alguns jogos, os meus companheiros sabiam que poderiam confiar em mim, passar a bola, que eu poderia fazer algo para resolver a partida. Quando é assim, o jogador se sente livre, pode fazer o que sabe e se torna mais decisivo. Fico muito feliz por ter brigado pela artilharia com o Neymar. E no Espanhol tem muita diferença dos jogadores que atuam no Real Madrid ou Barcelona. Eles têm muitas oportunidades de gol durante um jogo. E eu não tinha muitas, mas as que apareciam eu procurava empurrar para a rede. Nosso objetivo era de evitar o rebaixamento e sabíamos que tínhamos time para isso.
Logo depois, foi para a Real Sociedad. Como foi a experiência em um time com nível maior na Espanha?
Depois do Elche, tive muitas propostas, de times grandes a médios, mas não sei o que aconteceu que não deu certo em equipes que jogam a Liga dos Campeões e fiquei um pouco chateado. Mas recebi depois uma boa proposta da Real Sociedad e abracei o projeto. Encontrei um clube muito organizado, com estrutura fantástica e com pessoas maravilhosas, comprometidas. E encontrei uma coisa que não era muito favorável: no País Basco, não consegui me adaptar bem, a cultura é bem diferente. E quando não me adapto bem, quero logo procurar um outro ambiente. A temporada foi boa, com os jogos que fiz, marquei sete gols. Todos queriam a minha permanência. Do presidente aos torcedores, todos confiavam em mim, que eu faria muito nessa temporada, que estouraria definitivamente, mas preferi sair pela porta da frente, como amigo de todos. A proposta do Rubin Kazan foi boa para mim e para eles, e agradeço a todos da Real Sociedad. Queria mudar de ambiente e de clube, eu não iria dar certo lá.
A sua primeira experiência no futebol europeu foi no Az Alkmaar, da Holanda. Logo em sua primeira temporada, ajudou o time a conquistar o Campeonato Holandês, feito que não ocorria desde 1981. Como foi essa sensação? Como estava a atmosfera no clube?
Era muito novo, encontrei um grupo muito maduro, de onde saíram jogadores para várias equipes europeias. Foi a adaptação mais difícil que eu tive, era a primeira experiência fora do país. Mas aprendi muita coisa, amadureci. Passei por coisas boas e ruins, e fico feliz por ter jogado. O presidente queria renovar comigo, todos queriam a minha permanência, mas aconteceu um problema familiar e tive que ficar no Brasil. Nada é mais importante para mim que minha família. Quando voltei para a Holanda, eles preferiram rescindir o meu contrato, aceitei para ficar com minha mãe, que tava com câncer no pâncreas e veio a falecer, mas foi uma coisa que me deixou muito chateado e triste. Eles chegaram a mencionar nos jornais que eu era o 'novo Romário' enquanto minha mãe estava doente. E aquilo me chateou muito, mas só pensava nela e não fiquei muito presente nas redes sociais e jornais. Depois eles colocaram na internet as condolências, mas já não adiantava mais nada. Não me arrependo do que eu fiz, se voltasse a acontecer isso, faria tudo de novo. Poderia ser com o Real Madrid ou Barcelona que eu os trocaria pela família. Foi por isso que não me alonguei minha trajetória no AZ.
Você era muito jovem quando foi para a Europa. Quais os principais desafios para um garoto de 18 anos em mudar?
Todo jogador tem um sonho de jogar na Europa, mas muitas vezes se equivoca, pois às vezes é melhor ficar no Brasil, amadurecer para depois sair. Quis ir rápido, nesse sonho, e fui. Na época, tudo estava bom. Todo mundo acha que você ficou milionário, o que não é o caso. Muitos jovens saem do país e, muitas vezes, quem ganha dinheiro é o clube e o empresário, e o jogador não ganha nada. Mas precisa lutar, se adaptar rapidamente e procurar jogar e construir uma carreira ali. Os contras são muitos. É difícil ir para um lugar com outra língua, com culturas diferentes, com comida na qual você não está acostumado. Quando cheguei, só comia hambúrguer e batata frita, pois não sabia pedir outras coisas e nem se havia outras coisas. Na Holanda, se come do jeito deles, que para gente é muito ruim.
Da Holanda, você foi para o futebol italiano. Como foi atuar no Calcio?
Estava parado no Brasil há quase três meses por conta do problema da minha mãe, tive ofertas do país, mas preferi ir para Europa, onde joguei no Brescia. Fiz 16 gols e dei oito assistências na Série B. E passei a receber outras propostas da Itália e de outros lugares. Mas não fiz boa escolha, fui para o Pescara. Mas Deus não falha. Se eu fui para lá, é porque tinha um propósito. E acabei muito feliz na Itália.
Você foi revelado pelo Cruzeiro e foi emprestado a outros clubes menores de Minas Gerais. O que você acredita que faltou para você conseguir sequência no time principal da Raposa?
Subi para o profissional com 16 ou 17 anos. Mas não fui promovido pelo tempo na base, mas por necessidade do time. Eu não estava tão bem preparado, era muito novo, sem experiência. Não peguei o time em uma fase muito boa e isso me prejudicou bastante. O clube tinha que ter mais tempo comigo, mais confiança em mim. Não foi a que eu esperava, pois nos jogos que fui mal, jogaram a responsabilidade nos jovens do elenco e não para os mais experientes. Fiquei muito triste, mas não guardo mágoa. Lembro com muito carinho do Cruzeiro, onde cheguei com dez anos de idade e saí com 19. Isso a gente não esquece e só tenho a agradecer por ter me tornado jogador profissional pelo Cruzeiro.