No Morumbi, Japão estreia na casa de Oliver Tsubasa ‘de carne e osso’

Seleção japonesa estreia na Copa América em palco que foi casa do nipônico Musashi Mizushima, ex-jogador do São Paulo e inspiração para o personagem Oliver Tsubasa

imagem cameraMusashi Mizushima e Oliver Tsubasa, protagonista do mangá e anime Super Campeões (Imagens: Reproduções)
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Lance!
São Paulo (SP)
Dia 16/06/2019
09:23
Atualizado em 17/06/2019
08:30
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Nesta segunda-feira, a seleção do Japão inicia sua caminhada na Copa América 2019, diante do Chile, às 20h (de Brasília), no Morumbi. É a primeira vez que o Japão vai atuar no estádio, mas o palco do jogo e o futebol do país têm ligações profundas e pouco conhecidas. O ponto central deste elo é o personagem Tsubasa Ozora, protagonista do mangá e anime "Capitain Tsubasa", desenho que ajudou a popularizar o futebol no território japonês. No Brasil, a série recebeu o título de "Super Campeões" e Tsubasa Ozora ganhou o nome de Oliver Tsubasa. A curiosidade central é: Tsubasa Ozora foi inspirado em um jogador japonês que vestiu a camisa do São Paulo entre 1975 e 1985. Seu nome é Musashi Mizushima e ele foi um astro no território japonês. 

Inscrição de Musashi na Federação Paulista (Foto: Arquivo/São Paulo)

A história começa em 1975. Naquele ano, o São Paulo deixou que o jovem meia-atacante de 11 anos Musashi Mizushima treinasse na base do clube. Era uma recomendação de Pelé, que o descobriu durante ida ao Japão. Musashi deixou tudo para trás na Terra do Sol Nascente e sua determinação para vencer no mundo do futebol ficou conhecida em todo o país. Na época, o futebol no Japão não era profissional e os nipônicos nunca tinham disputado uma Copa do Mundo. Logo, as esperanças por dias melhores no esporte estavam nos pés de Musashi, que ganhou fama por isso. Anos depois, em 1981, o fã de futebol e escritor iniciante Yoichi Takahashi decidiu produzir seu primeiro mangá e usou o futebol como tema, empolgado com a globalização do esporte. O objetivo era tornar o futebol mais popular no Japão. Usando personagens carismáticos e sonhadores, criou "Capitain Tsubasa", que logo caiu nas graças do público.

"Capitain Tsubasa" foi apoiado pela Associação de Futebol do Japão. Sua primeira versão no mangá foi publicada entre 1981 e 1988. Na saga, um garoto prodígio chamado Tsubasa Ozora disputava um torneio interescolar e tinha o sonho de ir para o Brasil para se desenvolver mais e ser o melhor do mundo. Qualquer semelhança com Musashi Mizushima não era coincidência. A inspiração era no jovem do Tricolor. E, para dar um tempero ainda maior à expectativa que cercava o garoto, o atleta era homônimo de um herói japonês, o samurai Miyamoto Musashi. Então, o escritor Yoichi Takahashi aproveitou a semelhança dos nomes para criar seu enredo. Miyamoto Musashi, no épico histórico, tinha como arquirrival um samurai chamado Sasaki Kojirõ – tal qual Tsubasa Ozora possui um adversário no mangá: o atacante Kojiro Hyuga.

Tsubasa Ozora e Kojiro Hyuga (Imagem: Reprodução de internet)

Após sua ida ao Brasil, Musashi Mizushima foi apelidado no Japão como "Asas de Ícaro", pela ambição de voar mais alto. Por isso, o personagem do mangá foi batizado como Tsubasa Ozora, que significa "Asas do Céu" em japonês.

Em São Paulo, Musashi Mizushima, o "Tsubasa Ozora de carne e osso", dava mostras de evolução. Na reta final de 1984, com 20 anos, ele passou a treinar entre os profissionais e tal fato foi registrado pela revista "Placar" em 28 de setembro de 1984. "Ele é bom de bola, mesmo", disse o meia Pita, um dos destaques do time do São Paulo. O Tricolor não arcava com custos para manter o jogador. O salário era pago pelas empresas japonesas Mizuno (fabricante de material esportivo) e Yashica (fabricante de câmeras), que tinham escritórios no Brasil e criavam publicidades com a participação do jovem talento para o Japão.

Musashi em publicidade de Mizuno (Imagem: Reprodução de internet)

No fim de 1984, Musashi Mizushima vivia o auge do sonho. Com destaque nos juniores do São Paulo, recebeu um convite para se naturalizar brasileiro, o que, de fato, aconteceu. No mesmo período, o São Paulo foi sondado com uma oferta japonesa de 200 mil dólares para que fizesse cinco amistosos no país, desde que Musashi estivesse em campo em todos os duelos. Então diretor de futebol do São Paulo, Juvenal Juvêncio se mostrou empolgado com o que poderia vir pela frente com o japonês: "Já começamos o processo de naturalização de Musashi, que poderá ser aproveitado ainda neste ano pelo técnico Cilinho", falou Juvenal à revista "Placar" de 28 de setembro de 1984.

Musashi Mizushima em foto no Morumbi (Imagem: Reprodução)

Em 1985, finalmente Musashi Mizushima passou a integrar, efetivamente, o elenco do São Paulo para os campeonatos da temporada. No entanto, como o grupo era recheado de bons nomes, o japonês não conseguiu sair do banco em nenhum jogo oficial. Ele disputou só uma partida com a camisa do Tricolor: foi um amistoso com um time misto entre profissionais reservas e aspirantes contra o Bragantino, fora de casa, em 21 de abril de 1985. Vitória do Bragantino por 4 a 3. Porém, Musashi fez parte do grupo campeão paulista de 1985.

Musashi está em destaque com círculo (Foto: Reprodução de internet)

No período com a camisa do São Paulo, Musashi também ajudou na criação e desenvolvimento da chuteira Morelia, da Mizuno, além de ter sido garoto propaganda de uma empresa de computadores, a Panafacom, com direito a propaganda no Morumbi (veja abaixo). Em 86, o japonês foi jogar no São Bento-SP. Já entre 87 e 88, defendeu a Portuguesa-SP. Em 88, foi para o Santos. Neste tempo, ele ainda criou uma escolinha de futebol voltada para o atendimento de jovens da comunidade nipônica em São Paulo. O lado triste da história é que os anos se passaram e Musashi não chegou a "explodir" como craque. Inclusive, não há registros de que ele tenha sido convocado para a seleção japonesa.


Em 1989, Musashi retornou ao Japão para defender o Hitachi FC, precursor do Kashiwa Reysol. Já em 1991, ele foi para o AS Flügels, precursor do Yokohama Flügels, onde parou. O meia-atacante aposentou-se em 92, entre os jogadores fundadores da J League, a liga de futebol profissional do Japão. Ele jogou a Copa Nabisco Yamazaki da J League de 92, o primeiro torneio da nova liga.

Atualmente, Musashi Mizushima tem 54 anos e trabalha como profissional ligado a Associação de Futebol do Japão. Após ter passado na função de técnico por times universitários de sua terra natal, ele, em 2018, virou treinador da seleção sub-19 do Camboja, país parceiro da Associação do Japão. Já agora, em 2019, Musashi tornou-se assistente técnico da seleção sub-17 do Tajiquistão, outro país que recebe suporte da federação japonesa. Curiosamente, o projeto de Musashi envolve outro sonho no Brasil: o Tajiquistão disputará a Copa do Mundo Sub-17, que será jogada por aqui. A disputa começará em 26 de outubro e terá a ilustre presença do "Tsubasa Ozora da vida real".

Musashi Mizushima hoje tem 54 anos (Foto: Reprodução de internet)

CARINHO PELO SÃO PAULO

A saga de Musashi Mizushima não terminou com sucesso no São Paulo, mas no mangá e anime "Capitain Tsubasa" o personagem Tsubasa Ozora chega a vestir a camisa 10 do Tricolor e marcar gol de título do Campeonato Brasileiro contra o Flamengo. O roteiro é fruto de carinho do escritor Yoichi Takahashi pelo São Paulo. Explica-se: em 1994, Yoichi escreveu uma segunda parte da história, que recebeu o nome de "Captain Tsubasa: World Youth". Nela, é contada a saga de como Tsubasa Ozora vira um grande jogador no Brasil. O caminho natural da inspiração em Musashi Mizushima já seria suficiente para fazer o personagem vestir a camisa do São Paulo, mas o autor tinha outros dois grandes motivos para destacar o Tricolor: os dois títulos mundiais do São Paulo conquistados no Japão, em 1992 e 93. Yoichi viu os títulos de perto e se apaixonou pelo clube.


Há relatos de que Yoichi Takahashi assistiu a final da Copa do Mundo de 1994 de dentro do estádio, nos Estados Unidos, e torceu para o Brasil. Depois, ele viajou para o Brasil e visitou o Morumbi, sendo recebido pelo São Paulo.

Capa de edição do mangá "Captain Tsubasa: World Youth"

O legado da obra de Yoichi Takahashi, hoje com 58 anos, teve impacto direto na cultura e na sociedade japonesa, colaborando na formação de jogadores e no desejo de sediar uma Copa do Mundo, o que ocorreu em 2002. Depois de 1994, outras versões de "Capitain Tsubasa" foram escritas para mangá e adaptadas para anime, influenciando novas gerações. Agora, caberá aos jogadores da seleção japonesa escreverem seu próprio capítulo na casa de Tsubasa Ozora.

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