Quando o Rio de Janeiro sediar os Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil será o primeiro país da América do Sul a organizar o evento nos 110 anos dos Jogos Olímpicos modernos. Os Jogos no Brasil ocorrerão em meio a um cenário de escândalos envolvendo o Comitê Olímpico Internacional (“COI”) e dois outros grandes escândalos de corrupção atuais. No contexto nacional, o escândalo da Petrobras, denominado como Lava Jato, provocou a prisão de dezenas de executivos e líderes políticos, causando instabilidade na economia brasileira. Internacionalmente, as investigações sobre a Federação Internacional de Futebol (“FIFA”), conduzida sobretudo pelo governo dos EUA, têm implicações para os envolvidos com a Copa do Mundo de 2014 no Brasil. Em conjunto, esses escândalos servem de lição para as empresas globais sobre os riscos relacionados à corrupção nos negócios no Brasil e em outros países. Este artigo discute as bases dos escândalos do COI e da FIFA, os riscos relacionados à corrupção associados aos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro, as autoridades responsáveis por conduzir as investigações sobre corrupção corporativa e argumentos práticos para empresas que enfrentam riscos relacionados à corrupção.
O exemplo do COI
Este não é o primeiro caso de corrupção no Comitê Olímpico Internacional (COI). Em 1998, surgiram alegações de que alguns membros do COI aceitaram suborno em troca de voto para que os Jogos Olímpicos de Inverno de 2002 fossem realizados em Salt Lake City. Após este escândalo, dez membros do COI foram expulsos da organização, e o comitê implementou medidas corretivas com relação ao processo de licitação e transparência dentro da organização. Na expectativa dos Jogos Olímpicos de Verão de 2016, no Rio de Janeiro, o presidente do COI Thomas Bach ressaltou aos delegados do COI a responsabilidade em manter o processo transparente e aderir os valores do comitê. O presidente Bach anunciou ainda que o COI divulgará todos os seus detalhes financeiros, incluindo a origem e a distribuição das receitas da organização. O COI separará suas funções de auditoria e finanças e nomeará um diretor de ética. Ao explicar essas alterações, o presidente Bach declarou: “O esporte não funciona de forma isolada do restante da sociedade. Vivemos em meio a uma sociedade moderna e diversificada que nos cobra responsabilidade pelo que fazemos”.
O exemplo da FIFA
O escândalo da FIFA estourou no dia 27 de maio de 2015, quando 14 membros de seu alto escalão (nove dirigentes e ex-dirigentes da FIFA, quatro executivos de marketing esportivo e um executivo do setor de radiodifusão) foram indiciados nos Estados Unidos por extorsão, suborno, fraude, lavagem de dinheiro, obstrução da justiça e aquisição ilegal de naturalização. As autoridades prenderam alguns dos oficiais indiciados da FIFA em Zurique (Suíça), onde se reuniram dias antes da reeleição agendada de Joseph Blatter, presidente de longa data da organização. As prisões foram o resultado de uma longa investigação por autoridades americanas, revelando que, desde a década de 1990, os oficiais da FIFA receberam subornos totalizando aproximadamente US$ 150 milhões em troca de votos que decidiram quais empresas de televisão teriam a concessão para exibir os jogos, o país sede, e quem controlaria a organização. Como algumas das contravenções, tais como a origem de transferências bancárias, ocorreram nos Estados Unidos, as autoridades americanas obtiveram o “gancho jurisdicional” necessário para fazer as acusações. Após as prisões, vários outros países, incluindo Austrália, Colômbia, Costa Rica, e Suíça anunciaram publicamente suas próprias investigações sobre corrupção relacionadas à FIFA.
Na prática, as investigações dizimaram a liderança da FIFA. No dia 2 de junho de 2015, Blatter anunciou que ele se demitiria do cargo de presidente da FIFA, e convocou uma eleição especial a fim de escolher o seu sucessor, posteriormente marcada para fevereiro de 2016. Logo depois, as autoridades dos EUA revelaram que a investigação de corrupção sobre a FIFA teria se estendido para a escolha dos países sede da Copa do mundo de 2014, 2018 e 2022 – Brasil, Rússia e Qatar, respectivamente. No foco das investigações sobre a Copa do Mundo de 2014, no Brasil, estão as ligações entre o antigo presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira, e o secretário-geral da FIFA, Jerome Valcke. Em 17 de setembro de 2015, a FIFA anunciou a demissão de Valcke e a imediata destituição de suas funções. Em 8 de outubro de 2015, o Comitê de Ética Independente da FIFA suspendeu Blatter, Michael Platini, um dos vice-presidentes da FIFA, e Jerome Valcke, secretário-geral da FIFA, com investigações de ética em curso, além de uma investigação de corrupção conduzida por autoridades suíças sobre a FIFA.
Quem está vulnerável?
Como instrumento de desenvolvimento econômico, eventos globais como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos causam impactos de longo alcance para as comunidades sedes, ao mesmo tempo que também expõem as empresas envolvidas em casos de corrupção. O conteúdo a seguir detalha os segmentos corporativos que correm um risco maior de serem investigados pelas autoridades.
Patrocinadores
O COI e a FIFA são cada vez mais dependentes de patrocínios corporativos como uma fonte de receita. As empresas, por sua vez, têm demonstrado interesse em pagar um bônus para superar as concorrentes e obterem o título de empresa patrocinadora, garantindo assim uma plataforma global onde elas possam anunciar seus produtos e marcas. Em 1984, o COI reduziu o número de patrocinadores olímpicos para 35. As corporações responderam a esta mudança com a oferta de lances cada vez mais altos, em um esforço para garantir uma posição como patrocinadoras olímpicas. Por exemplo, durante os Jogos Olímpicos de 2012, algumas empresas pagaram mais de US$100 milhões cada para o pacote de patrocínio “Os Parceiros Olímpicos” (“TOP”). Em 2013, a FIFA arrecadou US$404 milhões com direitos de comercialização associados à Copa do Mundo de 2014 – valor que representou 29% de sua receita anual.
Os patrocinadores corporativos reconhecem o risco inerente de serem associados à uma conduta corrupta e a necessidade de se distanciarem imediatamente. Por exemplo, logo após às detenções dos dirigentes da FIFA, os patrocinadores divulgaram comunicados reiterando seus compromissos com a conduta ética e transparente. No dia 2 de outubro de 2015, os patrocinadores da FIFA aumentaram a pressão e emitiram comunicados exigindo a renúncia imediata de Sepp Blatter, presidente da entidade. Em 8 de outubro de 2015, a FIFA afastou Blatter de seu cargo.
Mídia
Entre os indivíduos acusados no caso da FIFA estão quatro executivos de marketing esportivo das Américas do Norte e Sul e o sócio majoritário de uma empresa de transmissão, acusados de servirem como intermediários entre os dirigentes da FIFA e os executivos de marketing. O segmento de mídia e comunicações em eventos globais como a Copa do Mundo e as Olimpíadas é um grande negócio, que gera oportunidades e riscos para organizações como a FIFA, o COI e as empresas que prestam esses serviços. Por exemplo, em maio de 2014, uma empresa de mídia e comunicação global firmou um acordo de US$ 7,75 bilhões de dólares com o COI para garantir os direitos de transmissão dos Jogos Olímpicos nos EUA até 2032. Este acordo estendeu a concessão prévia, obtida em 2011, que garantia os direitos de transmissão nos EUA até 2020 por um valor de US$ 4,4 bilhões.
Construção
Infelizmente, o Brasil tornou-se exemplo mundial de como a indústria da construção é vulnerável à corrupção, à medida que o País amplia sua infraestrutura para atender a eventos como as Olimpíadas.
Apesar do trabalho feito para preparar o Rio de Janeiro para os jogos da Copa do Mundo, toda a infraestrutura necessária ainda não foi concluída. Segundo o site da Rio 2016, 13% ou quase R$ 1 bilhão do orçamento total gasto, é dedicado a projetos de infraestrutura. O orçamento total no momento da candidatura em 2009 foi de R$ 4,9 bilhões, valor que foi ajustado em 2013 para R$ 5,5 bilhões devido à inflação, e novamente em 2015 para R$ 7,4 bilhões (mais de US$ 2,1 bilhões), devido a uma nova alta da inflação. A “inclusão de quatro novos esportes desde à candidatura, novas tecnologias, segurança do evento, aumento médio dos salários acima da inflação, despesas de uso da Vila Olímpica e a taxa de câmbio” também contribuíram para o reajuste.
Além disso, este orçamento pode aumentar novamente, devido às preocupações recentes sobre a qualidade da água em muitos locais de eventos aquáticos, embora ainda não esteja claro como isso será resolvido. A candidatura olímpica da cidade em 2009 incluiu a promessa de limpar 80% da Baía de Guanabara, local dos eventos de windsurfe e vela. Os resultados desses esforços permanecem inferiores a 50% de sua meta, com dirigentes afirmando que eles não alcançarão esse objetivo quando a tocha olímpica for acesa.
Muitas das instalações olímpicas também estão sendo construídas por meio de parcerias público-privadas (PPPs), que diminuem o custo total para a cidade. Após os jogos, as empresas públicas serão capazes de reestruturar as instalações com fins lucrativos. Assim, como em qualquer lugar do mundo, essas parcerias no Brasil apresentam diversos problemas e dificuldades de crescimento, incluindo as considerações financeiras, garantias de mecanismos e regimes jurídicos efetivos, regulamentação adequada, interação com o público e responsabilidade social.
As instalações olímpicas, como áreas para o público e locais projetados para competições específicas, não são as únicas obras que continuam a ser realizadas no Rio, em preparação para o evento. O desenvolvimento e modernização da infraestrutura de transporte por toda a cidade e a garantia de que haverá acomodações suficientes para absorver o fluxo de atletas e público para a cidade também são pontos de grande preocupação. Neste contexto, é significativo o número de partes interessadas, tanto públicas como privadas.
Um novo nível de controle
O contexto jurídico
Atualmente, o Brasil é o centro de numerosos escândalos de corrupção, investigados pela Polícia Federal, Departamento de Justiça dos Estados Unidos (“DOJ”) e a Comissão de Valores Mobiliários (“SEC”). Em um cenário de escândalos como a Operação Lava Jato da Petrobras e da FIFA, as autoridades de todo o mundo estão cada vez mais focadas em investigar e processar os infratores, sejam essas pessoas físicas ou jurídicas.
As partes envolvidas
Brasil
O combate à corrupção é prioridade no Brasil. Liderado pelo Ministério Público, uma autoridade de procuradoria independente, vários importantes processos demonstram a repressão em larga escala no Brasil contra crimes corporativos e corrupção. Além do inquérito de investigação da Petrobras, a Polícia Federal do Brasil abriu uma investigação contra mais de 70 empresas, 15 escritórios de advocacia e 24 indivíduos pelo seu potencial envolvimento em suspeitas de sonegação de impostos como parte da “Operação Zelotes”. Em 2012, mais de 25 pessoas, incluindo cidadãos, políticos e funcionários antigos e atuais do governo, foram condenadas em um escândalo de suborno e lavagem de dinheiro conhecido como Mensalão. Assim, o foco na luta contra a corrupção no Brasil tem se tornado prioridade nacional.
O Brasil demonstrou seu comprometimento no combate à corrupção corporativa quando, em 18 de março de 2015, regulamentou a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846), que, entre outras áreas, proíbe prometer, oferecer ou fornecer, direta ou indiretamente, um benefício indevido a um funcionário público ou a terceiros relacionados a um funcionário público. Isso impõe a entidades corporativas estrita responsabilidade sobre tais atos, independentemente do conhecimento da empresa ou intenção relativa ao suborno. Além disso, não há nenhuma exceção feita para pagamentos de “facilitações” ou “propinas” feitos em boa fé. A Lei Anticorrupção aplica-se a todas as entidades legais com operações no Brasil, incluindo as entidades sucessoras, podendo a jurisdição estender-se ao exterior. A lei prevê considerável leniência caso uma empresa coopere com as investigações, informe as violações e faça acordos com o governo em relação à conduta da empresa. Se essas condições forem atendidas, as multas podem ser reduzidas em até dois terços do valor total e a empresa pode ser isenta de uma série de sanções.
Estados Unidos
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos é conhecido por sua longa história de combate ao suborno e à corrupção. Em 1970, os EUA aprovaram a Lei Racketeer Influenced and Corrupt Organizations, popularmente conhecida como “RICO”, que responsabiliza indivíduos por seu envolvimento em organizações criminosas. No âmbito da RICO, um indivíduo é responsável pelos atos cometidos por outros membros da organização da qual ele é membro, mesmo que não tenha participado pessoalmente dos atos. Em 1977, os EUA também promulgaram a Lei Americana Anticorrupção no Exterior (“FCPA”), como forma de combater a corrupção corporativa generalizada. Imposta tanto pelo Departamento de Justiça quanto pela Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC), a lei tornou-se um modelo de combate à corrupção em todo o mundo, com sua abordagem dupla. Em primeiro lugar, ela proíbe diretamente atos de corrupção envolvendo funcionários estrangeiros que buscam assegurar vantagens comerciais. Em segundo, a lei exige que as empresas façam e mantenham livros e registros precisos, a fim de reforçar a sua capacidade de manter controles contábeis adequados. A rigorosa lei é uma das principais ferramentas do arsenal do DOJ para descobrir tanto o suborno quanto as tentativas de corrupção que poderiam ser escondidas por meio de registros financeiros falsificados. Um fator importante é que as disposições do FCPA se aplicam às condutas dentro e fora dos Estados Unidos. Como resultado das ações da FCPA que visam o cumprimento da lei, os EUA têm contribuído para uma cultura corporativa centrada no treinamento sobre prevenção de suborno e corrupção, por meio de esforços preventivos de Compliance.
O DOJ tem um histórico de incentivar corporações a cooperar com suas investigações. Recentemente, o DOJ atualizou suas políticas para responder às críticas e a uma percepção pública de que a entidade não havia processado executivos individuais de empresas, na sequência da mais recente crise financeira dos EUA. Em 9 de setembro de 2015, em um pronunciamento da sua procuradora-geral adjunta Sally Yates, o DOJ apresentou um novo conjunto de políticas relativas às investigações e procedimentos penais para delitos corporativos. O que ficou conhecido como “Memorando de Yates” inclui uma diretiva de que o DOJ não ofereça a uma empresa benefício pela cooperação, a menos que ela identifique todos os funcionários responsáveis pelo delito em questão.
Reino Unido
O Reino Unido também não é indiferente ao combate contra a corrupção e construiu uma reputação por ter uma das mais severas leis anticorrupção do mundo, a Lei Antissuborno do Reino Unido, promulgada em 2011. Imposta pelo Serious Fraud Office (“SFO” ou Serviço Antifraude do Reino Unido), a lei é uma importante atualização da antiga Lei de Prevenção Contra a Corrupção (1906), que foi usada no ano passado para condenar a empresa de serviços de impressão Smith & Ouzman, juntamente com dois de seus ex-funcionários, por pagamentos a funcionários públicos para garantir contratos de negócios no Quênia e na Mauritânia.
Assim, embora o escândalo da FIFA em si não implique determinados regimes de regulamentação contra a corrupção (como a FCPA ou a Lei Antissuborno do Reino Unido), corporações ligadas aos Jogos Olímpicos no Brasil devem compreender as principais leis nacionais e internacionais contra a corrupção, para garantir que estejam tomando as medidas de conformidade necessárias para impedir o suborno e a corrupção.
Suíça
Ainda que não seja uma lista exaustiva, os países acima são os principais reguladores potenciais em casos de corrupção global. A Suíça, no entanto, também tem voltado sua atenção à corrupção no meio esportivo, com a abertura de uma investigação criminal sobre as atividades de Joseph Blatter, recentemente suspenso do cargo de presidente da FIFA. Em 25 de setembro, Blatter foi interrogado por agentes do escritório da Procuradoria Geral da Suíça. Os agentes também informaram que foram realizadas buscas em seu escritório. A natureza do inquérito, eles dizem, centra-se nas alegações de que Blatter violou seus deveres fiduciários para a FIFA por meio de má gestão criminosa e apropriação indevida de fundos. Autoridades suíças estão conduzindo essa investigação em cooperação com o Departamento de Justiça dos EUA. É importante ressaltar que o contrato de mídia em questão resultou em uma modesta soma de US$ 600.000, demonstrando que entidades de diversos níveis de interesse financeiro enfrentam determinados riscos no âmbito de um evento esportivo.
O que está em jogo?
O que as empresas têm a perder ao se envolverem em negócios ilícitos?
Implicações legais
Sob cada um dos instrumentos regulatórios acima, as sanções para as empresas que praticam suborno e corrupção são custosas. Sob a Lei Anticorrupção do Brasil, as multas podem alcançar 20% sobre a receita bruta anual da empresa. Caso essa não possa ser determinada, a multa pode variar entre R$ 6.000 (aproximadamente US$ 2.500) e R$ 60.000.000 (aproximadamente US$ 25.000.000), não podendo ser inferior à vantagem obtida pela empresa pela atividade ilícita. De acordo com a RICO, indivíduos podem ser condenados a 20 anos de prisão por uma única acusação, podendo chegar à prisão perpétua no caso de outras acusações, como assassinato, que permitam tal pena. As multas aplicadas pela RICO são de US$ 250.000 ou duas vezes o produto do delito. Além disso, a RICO contém disposições de perda substancial. Da mesma forma, as violações da FCPA podem resultar em multas que variam de US$ 2 milhões por violação ou duas vezes o valor do ganho pecuniário obtido na transação de suborno, podendo alcançar até US$ 25 milhões por infração contábil. Os indivíduos condenados no âmbito da FCPA também estão sujeitos a multas de até US$100.000 por violação, bem como uma possível pena de prisão; para infrações contábeis, os indivíduos podem receber multas de até US$ 5 milhões e uma pena máxima de 20 anos de prisão por ofensa. Finalmente, a Lei Antissuborno do Reino Unido permite, em certos casos, uma multa ilimitada e prisão por até 10 anos. Organizações e indivíduos condenados sob esses estatutos podem ser impedidos de participar em contratos governamentais e serem desqualificados para futuros cargos públicos ou em estatais.
Risco para o investidor
A corrupção é cara. É cara quando ela ocorre, e é cara quando é descoberta. Em ambos os cenários, não é uma despesa que pode ser prevista ou pré-calculada pelos investidores que buscam investir seu dinheiro sabiamente.
Os investidores normalmente não aderem ao princípio jurídico dos EUA de “inocente até que se prove o contrário”, especialmente no que se refere ao próprio dinheiro. As respostas das partes interessadas após o anúncio de uma investigação de corrupção variam, desde demandas por maior transparência, ações corretivas, rompimento de relações e retirada de investimento, e até mesmo ações litigiosas para ressarcir supostas perdas. Além disso, para as partes interessadas que optam por manter relações com a empresa, os custos associados à investigação – potenciais multas, encargos jurídicos, outros honorários profissionais, desenvolvimento e implantação de programas de conformidade – podem ter um impacto significativo nos resultados financeiros da empresa, e consequentemente no retorno ao investidor. Por exemplo, desde 2008, a Siemens gastou aproximadamente US$ 3 bilhões em multas e investigações internas.
Além disso, tal risco para o investidor não existe em um vácuo, podendo ainda estender-se além da empresa ou empresas implicadas. Países com altos índices de corrupção e fraude são vistos como ambientes incertos e arriscados para os investidores. Isto explica parcialmente por que os governos ao redor do mundo investem em sua infraestrutura e programas legislativos, visando reduzir sua percepção de risco e atrair o investimento estrangeiro, esperando que isso fortaleça o crescimento econômico e as oportunidades. Portanto, um escândalo de corrupção não tem um efeito prejudicial apenas para as entidades envolvidas, mas também para as empresas em toda a região, independentemente da indústria ou setor. Por exemplo, após o anúncio da renúncia de Joseph Blatter como presidente da FIFA, as ações da bolsa do Catar imediatamente perderam US$ 4,5 bilhões. Isso deve-se ao fato de que o Catar, eleito como sede da Copa do Mundo de 2022, também estava sob investigação e os investidores bancários, no contra fluxo de oportunidades econômicas, viram seus investimentos em risco. Escândalos relacionados às tais atividades invariavelmente levam à pergunta: “Se isso está acontecendo lá, o que mais... quem mais? ”
Danos à reputação
Independentemente de participarem voluntariamente ou involuntariamente na atividade ilegal, tanto a organização envolvida quanto seus altos executivos correm sérios riscos de credibilidade e reputação após o escândalo vir a público.
As organizações podem enfrentar crises de um grande escândalo, geralmente, por meio de mudanças drásticas em sua liderança ou da execução de programas de Compliance abrangentes e atualizados. Outras medidas de contenção podem derivar da virtude de uma marca reconhecida, cujas parceiras estão dispostas a correr o risco de manter suas relações comerciais e continuar colhendo os frutos após o enfraquecimento do escândalo. Algumas organizações ainda ressurgem mais fortes das cinzas após um escândalo de corrupção, tendo empreendido medidas corretivas que demonstram às autoridades e ao mundo dos negócios uma dedicação sincera aos padrões de transparência e ética. No entanto, uma vez que uma empresa teve seu nome ligado à corrupção, suborno, lavagem de dinheiro ou sanções, seus futuros parceiros em potencial certamente pensarão duas vezes antes de dar continuidade a uma relação que pode colocar seus próprios negócios em risco.
Os indivíduos, por outro lado, correm um risco ainda maior. As decisões das organizações são tomadas por indivíduos, e são as pessoas quem decidem agir legalmente ou ilegalmente nesse âmbito dos negócios. Além de perder sua posição dentro da organização, os indivíduos que praticam uma irregularidade podem enfrentar anos de prisão, multas e sanções substanciais, proibição vitalícia de participar em certas atividades e barreiras significativas na obtenção de outras posições dentro do mundo corporativo.
Por exemplo, após o escândalo dos Jogos Olímpicos em Salt Lake City, a diretoria do COI seguiu uma recomendação de investigar internamente e aprovou a demissão de seis dos membros do COI envolvidos na recepção de subornos nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2002. Além disso, após ser envolvido pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos no escândalo da FIFA, Enrique Sanz foi demitido de seu cargo como secretário-geral da CONCACAF (Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe). Sanz foi anteriormente colocado em “licença indefinida” pela organização, bem como suspenso de todas as atividades relacionadas com o futebol pela FIFA. O presidente da CONCACAF, Jeffrey Webb, também foi indiciado.
Como evitar as armadilhas
Como e quais medidas as empresas podem tomar para minimizar os riscos relacionados à corrupção?
As empresas podem tomar certas medidas para minimizar os riscos relacionados com corrupção associados às operações no Brasil e em outros países. O principal é que a empresa desenvolva, implemente e mantenha um programa de Compliance efetivo. Um programa criado sob medida e de acordo com os riscos e o perfil da empresa é uma consideração importante para garantir a conformidade com as leis de combate à corrupção em todo o mundo. Em alguns casos, a existência do programa pode reduzir as sanções financeiras se a empresa for condenada. As principais características de um programa de Compliance incluem uma política claramente articulada contra a corrupção, um código de conduta com políticas e procedimentos de compliance, supervisão, autonomia e recursos, avaliação de riscos, treinamento e consultoria contínuos, medidas disciplinares e incentivo, due diligence e pagamentos por terceiros, informações confidenciais, melhorias contínuas, testes e revisões periódicas.