Uma das grandes promessas da base do Santos, Caio Henrique deixou a Vila Belmiro sem mesmo atuar entre os profissionais. O jovem acertou em janeiro de 2016 com o Atlético de Madrid. Na Espanha, o meia passou cinco meses na equipe B e logo foi pinçado por Diego Simeone para o elenco principal.
Ainda pouco conhecido do torcedor brasileiro, Caio Henrique foi inscrito na última Liga dos Campeões pelo treinador argentino e ficou no banco em algumas oportunidades ao longo da temporada. Foi titular em uma partida da Copa do Rei, sua primeira como profissional, e tem multa rescisória de 30 milhões de euros (cerca R$ 110 milhões), com contrato que vai até 2021.
Em entrevista exclusiva ao LANCE!, Caio Henrique fala da experiência no clube espanhol, a vontade de atuar com mais frequência nesta temporada e a oportunidade de ser treinado por Diego Simeone.
Você foi criado na base do Santos. Como começou sua carreira no futebol? Com quem jogou nas categorias inferiores do Peixe?
Eu comecei a jogar bola aos seis anos em uma escolinha aqui de Praia Grande, chamada Delta. Com dez anos, fiz uma peneira no Santos e fui aprovado. Daí, fiz a minha base até os 18 no Peixe. Pude jogar com o Thiago Maia, Zeca, Daniel Guedes, Caju e outros jogadores.
Você chegou a jogar no profissional do Santos?
Não cheguei a estrear, estava para subir e me disseram que eu começaria a treinar com os profissionais. Mas logo depois acertei minha transferência para o Atlético.
Como surgiu o interesse do Atlético de Madrid?
Foi uma conversa de alguns observadores com o meu representante, o Deco, e eu estava em fim de contrato com o Santos. Achei bem interessante a proposta, conversei com a minha família. Os olheiros do Atlético já estavam observando em alguns jogadores e acabei indo para o futebol espanhol.
Você chegou muito jovem ao futebol europeu. O que mais atrapalhou a sua adaptação? Teve problemas com o idioma?
Eu cheguei em janeiro de 2016, uma época que faz muito frio em Madri por conta do inverno. Não estava acostumado e sofri muito com o frio nos três primeiros meses. E tive problema também com o idioma, não sabia falar espanhol. As pessoas falam muito rápido e eu ficava um pouco perdido. Agora, com um ano e meio na Espanha, já estou completamente adaptado. É uma situação que quase todos os jogadores passam quando se transferem para fora. Já consigo falar fluentemente o idioma, já vejo filmes, leio jornais. Estou completamente adaptado.
Você chegou a ter aulas de Espanhol em Madri?
Não. Foi mais de ouvir mesmo, assistir filmes. Eu tinha alguns amigos brasileiros que moravam há muito tempo em Madri que me ajudaram muito.
Quando chegou ao Atlético de Madrid, foi para ficar um tempo na base do clube. Como foi esse período? Os dirigentes lhe deram algum prazo para chegar ao profissional?
As coisas aconteceram muito rápido na minha vida. Cheguei em janeiro do ano passado no Atlético, fiquei cinco meses na equipe juvenil, fomos campeões da Copa do Rei em cima do Real Madrid, que era um título que o Atlético não conseguia há 50 anos, e logo depois dessa conquista vim para o Brasil e fiquei sabendo que teria que voltar para Espanha para fazer a pré-temporada com a equipe principal. Voltei, fiz a pré-temporada, viajamos para a Austrália, atuei no amistoso diante do Tottenham. Me destaquei na pré-temporada e fui efetivado na equipe principal, passando a treinar com eles o restante do ano.
Quando foi efetivado no time de cima, passou a trabalhar com Diego Simeone, um dos treinadores mais conceituados do mundo na atualidade. Como é trabalhar com ele?
Todo jogador quer trabalhar com bons treinadores. Eu estou tendo a oportunidade de aprender com um dos melhores. Não é à toa que o Atlético de Madrid chegou em duas finais de Liga dos Campeões em quatro anos, e o Simeone tem muita participação nisso. É um cara que está sempre procurando ensinar, que você evolua. Com certeza é uma pessoa que me completou bastante. Cheguei na Europa um jogador, agora sou completamente outro. Todo treinamento é um aprendizado para mim. Procuro observá-lo, é um cara que jogou, vencedor, e hoje é um dos top-5 do mundo. Está sendo uma experiência maravilhosa.
O que você se viu no estilo dele que ficou gravado para você?
Foi em uma partida que eu estava no banco de reservas contra o Sporting Gijón. O Atlético estava goleando e, faltando dois minutos, ele estava pulando, gritando na beira do campo. Eu e meus companheiros nos olhamos e falamos: 'Mas estamos ganhando de 4 a 1'. Pode estar ganhando de 1 a 0 ou de 10 a 0, a motivação dele é a mesma. Isso passa muita confiança para a gente. É um cara que não gosta de perder, que quer sempre melhorar. Gosto muito disso nele.
Tem diferença no tratamento dele no vestiário quando o Atlético ganha ou perde?
O tratamento é sempre o mesmo. Mas quando perde ele fica mais bravo, mais chateado, pois ninguém quer perder. Ainda mais ele, com o espírito de garra, de entrega, que ele tem. No dia seguinte, ele mostra os erros da equipe nos treinamentos, tenta corrigi-los. Mas não tem muita diferença do tratamento dele na vitória ou derrota.
Neste ano, você foi promovido ao elenco principal do Atlético de Madrid e estreou em um jogo da Copa do Rei. Como foi essa primeira partida?
Um dia antes da partida, ele armou o time em um treinamento e vi que estava entre os titulares. Foi uma situação muito legal, vi que estava chegando o meu momento, era a oportunidade que eu precisava agarrar. Quando chegou o dia da partida, eu estava um pouco nervoso, ansioso. Para mim, era um jogo muito importante, tinha chegado a hora e eu precisava mostrar meu futebol. Mas quando a bola rolou, fiquei tranquilo, fiz uma boa partida. Estrear pelos profissionais era o sonho que eu tinha desde pequeno. Em cinco meses, eu já estava estreando pelo Atlético de Madrid, ao lado de grandes jogadores. Foi um momento maravilhoso.
O Simeone deu alguma orientação especial?
Ele pediu para eu ficar tranquilo, para eu fazer o que vinha fazendo nos treinamentos. Que os companheiros iriam me ajudar, que me passariam tranquilidade. E me disse para desfrutar daquele momento.
Em outras partidas, você acabou ficando no banco de reservas, mas não atuou. Inclusive pela Liga dos Campeões. Ficou alguma ponta de frustração por não ter conseguido jogar mais?
Desde que eu saí do Santos, eu tinha a consciência que no Atlético de Madrid seria mais complicado, até pelo momento que o Atlético vivia e o elenco que tem, um dos melhores do mundo. Não vejo isso como frustração. Muito pelo contrário, só pelo fato de estar convivendo, ser relacionado, viajar com os meus companheiros, foi um grande passo. Agora, quero buscar meu espaço, quero jogar. Mas essa primeira temporada serviu de aprendizado, foi uma experiência muito legal, fui para o banco contra o Bayer Leverkusen, viver aquilo de perto... foi um sonho, desde pequeno sempre tive essa vontade.
E como foi essa experiência de ser relacionado para um jogo da Liga dos Campeões contra o Bayer Leverkusen? A atmosfera da competição é realmente diferente?
A ficha não cai, né? Tudo aconteceu muito rápido comigo. Há um ano eu estava vendo pela TV e depois estava no banco de reservas, podendo entrar a qualquer minuto. Fiquei vendo todos aqueles jogadores de perto, não estava acreditando. O futebol muda muito rápido. Foi um momento muito maravilhoso, vou guardar sempre na recordação. Era um sonho que estava sendo realizado.
Você atua no meio de campo e disputa posição com nomes como Saúl, Gabi, Koke... Como é essa situação no elenco do Atlético? A briga é sadia? Você acredita que terá mais chances nesta temporada?
O ambiente do Atlético é muito bom, a competição pela vaga é sadia, os jogadores são muito unidos. Eu jogo no meio de campo como segundo volante, gosto de estar sempre em contato com a bola. Desde que eu cheguei no Atlético, me espelhei muito em dois jogadores, o próprio Saúl e o Tiago, que se aposentou nesta temporada. São jogadores que procurei me espelhar, aprender muito com eles, me ajudaram tanto fora como dentro de campo.
O Simeone já sinalizou se você terá mais chances no time titular?
Tenho a pré-temporada que já começou, mas também vejo com bons olhos um empréstimo. O importante é ter minutos em campo. Para evoluir, um jogador precisa atuar. Quero fazer uma boa pré-temporada, me preparar, pois a temporada europeia é bastante longa, com muitos jogos. O restante eu deixo com o pessoal que cuida da minha carreira.
"No Brasil, as pessoas não veem o empréstimo como uma coisa boa. Eu preciso ter mais minutos em campo para mostrar o meu futebol"
Você não descarta ser emprestado para outros clubes para ter mais tempo em campo?
Não descarto. No Brasil, as pessoas não veem o empréstimo como uma coisa boa. Na Europa é diferente. O próprio Saúl, quando subiu para o profissional, foi emprestado por uma temporada para ganhar experiência. Isso pode ser bom para mim, posso evoluir como jogador. Então, vejo com bons olhos.
Foi o que aconteceu com o Casemiro, que foi emprestado pelo Real Madrid ao Porto...
Sim, o Casemiro fez uma grande temporada pelo Porto, voltou muito valorizado, já tinha evoluído bastante e acabou ficando. Hoje, é um dos melhores jogadores que o Real Madrid tem.
Quem é o jogador mais próximo de você no Atlético?
Eu tenho mais afinidade com o Filipe Luís, até por ele ser brasileiro. É um grande amigo meu, um cara espetacular, que eu sempre procuro aprender. Tenho muita afinidade com ele dentro e fora de campo.
O Atlético continua com essa proibição de contratar jogadores. Como isso prejudica vocês?
Prejudica, pois o Atlético tinha alguns nomes para contratar nessa janela de transferência, para reforçar o elenco. Com essa proibição, fica difícil. Ainda mais que podemos perder alguns jogadores. O elenco é pequeno, se sai alguém, teria que repor. Mas com a proibição, não terá como.
O Atlético de Madrid mudará de estádio nesta temporada. Como você vê essa saída do Vicente Calderón? O que os seus companheiros falaram, como foi o sentimento da torcida?
O Calderón sempre foi a nossa casa, onde o jogador e o torcedor sempre se sentiram à vontade. Eu pude ter essa experiência de estar praticamente todos os fins de semana no estádio, fiz muitos jogos ali. Realmente é um local que ficará marcado na nossa história. Mas o novo estádio está ficando muito legal. O Atlético cresceu muito nos últimos anos, precisava de uma arena como essa que está sendo construída, até pela grandeza do clube. Acredito que vai ser uma boa combinação entre o Atlético e o estádio, que é muito moderno. Vejo com bons olhos essa mudança.
Já conheceu o Wanda Metropolitano, novo estádio do clube?
Sim, fizemos uma visita ao estádio, pudemos acompanhar um pouco esse final das obras. Ele está previsto para ser entregue em breve. Vai ficar bem legal.
Como é a rivalidade entre Atlético e Real Madrid na capital?
Por ser os dois clubes da mesma cidade, sempre foi um clássico muito acirrado. Depois dessas duas finais da Liga dos Campeões que eles ganharam da gente, a rivalidade só aumentou. Hoje, quando Atlético enfrenta o Real, a cidade para. Todo mundo fica na frente da televisão ou no estádio. O clima é bem legal.
Um dos seus empresários é o ex-jogador Deco. Como é essa relação com ele? Como vocês se conheceram?
Eu comecei a trabalhar com o Deco depois de um torneio que eu participei no Rio Grande do Sul, e o irmão dele - que também trabalha para ele - me observou, entrou em contato com o Falcão, que foi meu primeiro empresário e que também continua comigo. E a partir daí comecei uma parceria com os dois, que já faz uns três anos. O Deco me ajudou bastante, sou muito grato a ele, que está sempre me passando conselho. Procuro sempre ouvi-lo, é uma pessoa que ganhou tudo como jogador.
Qual é o seu objetivo nesta temporada?
Meu objetivo é jogar, quero poder ser visto pelas pessoas do Brasil. Como saí muito novo do país muita gente não me conhece. O principal objetivo é jogar, ano que vem começa o ciclo das Olimpíadas e minha geração é que vai jogar. Então é sempre bom estar no radar da Seleção, as pessoas estarem vendo a gente jogar. Espero ter minutos em campo para poder ser visto.