Datas ‘atropeladas’, imbróglio judicial e muita luta: veja a situação dos Estaduais de 2020 que não acabaram

Do grito de 'campeão' que esperará o fim do Brasileiro-2020 à situação surreal nos tribunais, não faltam histórias por gramados do país afora em ano marcado pela Covid-19

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O calendário reajustado do futebol brasileiro já expõe seus holofotes para as últimas fases da Copa do Brasil e a reta final do Campeonato Brasileiro. Mas em alguns estados, a pandemia do novo coronavírus deixa o grito de "é campeão" ainda preso na garganta. Entre datas apertadas e situações surreais, sete campeões locais de 2020 ainda serão definidos.

GOIANO: BRASILEIRO FARÁ FIM DE 2020 'COINCIDIR' COM INÍCIO DE 2021

'Tivemos de reduzir o calendário da fase final devido à pandemia', disse André Pitta (Foto: Divulgação)

A decisão de encerrar a edição de 2020 só no ano que vem proporcionou uma situação esdrúxula. Em reunião do Conselho Arbitral ocorrida na última terça-feira, foi escolhido que dia 27 de fevereiro será o pontapé inicial da edição de 2021 do Campeonato Goiano. Contudo, há projeção do campeão de 2020 só ser conhecido no dia 28 de fevereiro.

Mandatário da Federação Goiana de Futebol (FGF), André Pitta detalhou as razões para a competição desta temporada só ser retomada a partir de 13 de janeiro do ano que vem, a partir da penúltima rodada da primeira fase. 

- Aqui em Goiás, o governo fechou tudo desde o início da pandemia. Quando liberou, já estava em cima do início do Campeonato Brasileiro. Para evitar grandes impactos financeiros nos calendários dos clubes, decidimos fazer algumas mudanças - detalhou, ao LANCE!.

Além da permissão para inscrição de novos jogadores, o atleta que defendeu um clube no início do Estadual poderá atuar na retomada por outra equipe. Houve impacto também na rotina das quartas de finais, semifinais e até na decisão.

- Aprovamos a redução para um jogo em cada fase em virtude das datas. Tentamos ajustar ao máximo. Quando a gente mexe, não é para ficar bom, é para ficar menos ruim - disse.

'Fiz um compromisso com o Atlético e o Goiás de, se pelo menos um deles chegar à decisão, ela acontecerá após o fim do Brasileiro', disse André Pitta, presidente da FGF


O fato da decisão de 2020 acontecer um dia depois do início da edição de 2021 tem a ver com a adaptação do calendário do futebol brasileiro, de acordo com o dirigente.

- Temos dois clubes na Série A. Eles já terão de conciliar a reta final do Brasileiro com as quartas e as semifinais do Goiano, jogando domingo pela competição nacional e quarta pelo Estadual. Mas fiz um compromisso com o Atlético e o Goiás de, se pelo menos um deles chegar à decisão, ela acontecerá após o fim do Brasileiro - declarou.

'Como a maioria concordou, agora a questão é de poder encerrar da melhor forma possível', diz Adson Batista, mandatário do Atlético-GO (Foto: Paulo Marcos / Atlético-GO)

Presidente do Atlético-GO, Adson Batista reconheceu que o cenário em torno do calendário ficou longe do ideal.

- A princípio eu fui contra essa longa paralisação. Queria que a retomada da competição acontecesse na mesma época que voltaram outros estados. Mas como a maioria concordou, agora a questão é de poder encerrar da melhor forma possível - disse. 

O Dragão era o líder da primeira fase, com 23 pontos, até a paralisação ocorrida após o dia 15 de março.

'É o calendário que tem e vamos lutar', diz Harlei de Menezes, diretor de futebol do Goiás (Divulgação / Goiás)

Diretor de futebol do Goiás, Harlei de Menezes também reconhece que há desafios para a fase final da competição. Aos seus olhos, o momento é do Esmeraldino se mobilizar.  

- Reuniões virtuais anteriores indicaram que íamos acumular esta situação. Como a competição não pôde fechar antes, acabaria ficando mesmo para 2021. Não é o ideal, mas é o calendário que tem. Vamos lutar muito para conquistar essa competição - garantiu.

O ex-goleiro apontou que o desgaste com a reta final do Brasileirão causa impacto em campo.

- Para nós isso fica bem delicado. Já encontraremos bastante desafio na Série A. Vamos usar nossa garotada da base nas primeiras partidas do Estadual e esperamos que o Goiás esteja na final - indicou.

RORAIMENSE: CONFUSÃO NOS TRIBUNAIS RENDE CENÁRIO ESTRANHO

Zeca Xaud é o mandatário da Federação Roraimense (Divulgação)

Já a retomada do Campeonato Roraimense é temperada por situações rocambolescas e imbróglio judicial que culminaram em um cenário curioso. Nesta quinta-feira, GAS e São Raimundo decidirão o título do segundo turno. Porém, ainda não se sabe quem é o campeão do primeiro turno da competição.

O GAS era líder isolado do primeiro turno, com dez pontos. Contudo, após uma denúncia do Rio Negro, o clube de Caracaraí perdeu 16 pontos no TJD-RR, que interpretou que o jogador Fábio Gomes foi escalado de maneira irregular em três jogos (foram sete pontos obtidos pelo clube em campo, enquanto os outros nove equivalem à soma dos pontos das partidas nas quais ele foi escalado "irregularmente"). O zagueiro, que também foi suspenso na Comissão Disciplinar por 180 dias, não havia cumprido suspensão automática após sua expulsão na final do Campeonato Estadual de 2019, quando ainda defendia o Baré.

O Leão Dourado recorreu ao Pleno. O julgamento estava em 3 a 2 a favor da ratificação da punição ao GAS. No entanto, o auditor Luis Gustavo Marçal Costa não deu seu voto porque seu celular descarregou. Após esperar o restabelecimento da conexão, o presidente em exercício do Pleno do Tribunal de Justiça Desportiva (TJD-RR), Johnson Araújo Pereira, suspendeu a sessão.

Diante de pendências nos tribunais que deixaram primeiro turno indefinido, Roraimense conhecerá antes o campeão do segundo turno 


Diretor de futebol do Rio Negro, Cláudio Santos se queixa do impasse em torno do último voto. 

- Já vi tanta coisa na minha vida, mas essa é a primeira vez. O Pleno estava composto de cinco auditores, três votaram a favor da punição do GAS, que realmente botou o jogador irregular em campo. Estava em 3 a 2. Esperaram dez minutos, mais dez e dizem que a bateria do celular do doutor Gustavo caiu. Mesmo assim, foi suspenso para esperar o voto dele e até agora nada. A gente não tem onde obter as informações. Não tem local certo. É uma situação difícil. Trabalhamos, fazemos um futebol difícil e acontece cada coisa, muito complicado. A gente não entende - e ressaltou:

- Tento ligar para o presidente (em exercício do TJD, Johnson Araújo Pereira), ele não me atende. Tivemos a decisão por unanimidade na comissão, eles (o GAS) recorreram ao Pleno e aí está acontecendo isso - completou. 

Presidente do GAS, Jander Cavalcante também falou sobre a espera pelo último voto.

- O presidente do TJD (Johnson Araujo Pereira, em exercício) pediria para que o auditor gravasse o vídeo onde ele iria expor seu voto nesse caso. Caso acompanhe o relator, que se mostrou favorável à prescrição da punição, acontecerá o empate e precisará do "Voto de Minerva" do doutor Johnson. Aí sim, teriamos uma chance de reverter essa situação - destacou.

O LANCE! apurou que o auditor, em viagem a São Paulo, não foi localizado na última quarta-feira. Segundo Dakson Leal, secretário da Federação Roraimense de Futebol, uma nova audiência esta marcada para esta sexta-feira, às 10h, em reunião por meio do Google Duo.

Julgamento que pode ratificar punição de 16 pontos ao GAS foi suspenso porque celular de auditor descarregou. Continuação será nesta sexta-feira


Caso o auditor Luiz Gustavo Marçal Costa siga incomunicável, o resultado de 3 a 2 do Pleno da última terça-feira será confirmado.

ANTECEDENTES DE IMPASSES

Em campo, o confronto entre GAS e Rio Negro já havia rendido outro episódio curioso. Após o clube de Caracaraí marcar o gol que virava a partida para 2 a 1, os jogadores do Galo cercaram o árbitro José Ordilo. Seguranças e policiais tentaram conter o tumulto mas, em meio ao clima quente, atletas do Rio Negro foram atingidos com spray de pimenta e saíram de campo aos 26 minutos do segundo tempo do duelo do dia 14 de março.

O árbitro inicialmente encerrou o jogo por falta de segurança. A diretoria do Rio Negro, por sua vez, pediu a anulação da partida. No fim das contas, a Primeira Comissão Disciplinar decidiu retomar o jogo a partir dos 26 minutos do segundo tempo. Com um intervalo de 238 dias, a bola rolou para o reinício. Mesmo sem Fred, autor do gol que causou tanta polêmica, o GAS manteve em 5 de novembro a vantagem obtida antes da paralisação. 

Clube que protestou contra continuação dos jogos em meio à pandemia foi absolvido em duas instâncias (Foto: Luan Soares)


Os tribunais também decidiram outro impasse. Equipe que abandonou o confronto com o São Raimundo em protesto ao fato da Federação dar prosseguimento ao Estadual em meio à pandemia (recorde aqui o caso), o Baré foi absolvido em duas instâncias. 


FINAL DE SEGUNDO TURNO A CAMINHO

GAS e São Raimundo tentam se superar para, na final do segundo turno, mostrar quem é o melhor em campo. Porém, o dirigente do Leão, Jander Cavalcante, reconheceu que o imbróglio tem afetado a rotina antes da decisão.

- O clima aqui é de muita ansiedade, muita angústia. Estamos aguardando o desfecho desse julgamento. O TJD ficou de se pronunciar. Vamos aguardar para saber se teremos tranquilidade de que ganhamos essa causa e passar uma régua, trabalhar só campo. Vamos acompanhar o desfecho dessa novela que fez com que o segundo turno começasse depois do primeiro - disse.

Do lado do Mundão, o presidente Sérgio Caranguejo evita polêmicas em relação ao impasse envolvendo o adversário da final desta quinta-feira. 

- A gente está tranquilo, pois não envolve o clube diretamente. Vamos disputar o segundo turno e o primeiro se resolve no dia 23. Estamos preocupados em ganhar esse jogo contra o GAS e depois fazer a final com quem quer que seja - disse.

A DURAS PENAS: FEDERAÇÕES 'SUAM' POR FINAIS AINDA EM 2020

'Era uma promessa minha acabar o Estadual neste ano', diz Aron Dresch, presidente da FMF (Divulgação / FMF)

Estabelecer que seu campeão estadual fosse conhecido ainda em 2020 rendeu momentos desafiadores em alguns locais. Presidente da Federação Mato-Grossense, Aron Dresch contou como foi lidar com o longo intervalo de paralisação.

- É extremamente complicado lidar com um campeonato que parou por tanto tempo. Tivemos de fazer um novo Arbitral, no qual definimos a data de retorno e também permitimos a entrada de novos jogadores - disse.

Após o fim da primeira fase, restavam os jogos de ida e volta das quartas de final e das semifinais. Faltam dois jogos para o campeão ser conhecido.

- Vai ter a final entre o Nova Mutum e o União Rondonópolis. Felizmente, acabaremos a competição no dia 23. Era uma promessa minha de acabar a competição ainda em 2020, mesmo com o calendário apertado e os jogos da Série B, no caso do Cuiabá, e dos nossos representantes na Série D nos proporcionando desafios  - frisou.

Também no dia 23 será o conhecido o campeão do Campeonato Sul-Mato-Grossense. A competição trará uma final em dois jogos entre Aquidauanense e Águia Negra, reedição da edição anterior.

Calendário apertado em função de competições nacionais foi visto como obstáculo para novas datas dos Estaduais


Outra competição que teve de lidar com empecilhos de datas foi o Campeonato Piauiense. A Federação só conheceu na última quarta-feira os seus finalistas. Enquanto o Picos já estava classificado, o 4 de Julho se deu ao luxo de perder por 2 a 0 para o Altos, mas a equipe de Piripiri garantiu sua vaga.

Mandatário da Federação Piauiense de Futebol (FPF), Robert Brown apontou os desafios para a retomada. 

- Realmente, essa pandemia é complicada não só para nós para todos os estados. A gente aqui é cheio de dificuldade, e agora com essa questão dos casos aumentando, mas felizmente estamos terminando a competição - e ressaltou a conciliação com as datas de competições nacionais como outro obstáculo:

- São duas equipes na Série D, o River e o Altos. O River perdeu para o Galvez no domingo passado, mas o Altos prossegue na competição nacional. Na primeira fase, tivemos de encaixar tabelas para não coincidir com os jogos Estadual. Foi difícil, só que conseguiremos encerrar o Piauiense na próxima semana com a final entre Picos e 4 de julho - completou. 

O jogo de ida acontecerá neste sábado. Já a final será realizada na próxima terça-feira, dia 22. 

CAPIXABA: MUDANÇA DE ROTA E LUTA NO MERCADO

'Lutamos para dar suporte aos clubes neste momento difícil', diz o presidente da FES, Gustavo Vieira (Gustavo Louzada)

A pandemia do novo coronavírus também trouxe mudanças para o Campeonato Capixaba. Presidente da Federação de Futebol do Estado do Espírito do Santo (FES), Gustavo Vieira, contou como foi o desafio para voltar.

- Esticamos a corda ao máximo que pudemos vislumbrando a retomada. Em outubro, voltou a Série B do Estadual. Por fim, em novembro, de comum acordo com os clubes, definimos a data de retorno e conseguimos ajustar. A competição acabará dia 30 de dezembro - e destacou em seguida:

- Neste ano não será viável a realização da Copa Espírito Santo (que define uma das vagas da Série D), infelizmente. Mas lutamos para dar suporte aos clubes neste momento difícil. Adotamos os protocolos mais seguros, mais rígidos possíveis - completou.

A final da competição será entre Rio Branco, maior campeão estadual, e o xará Rio Branco de Venda Nova do Imigrante. Há uma novidade: ambos serão os representantes do estado na Série D, uma vez que a Copa Espírito Santo não foi realizada.

O dirigente da FES detalhou o aporte que conseguiu para a edição realizada com portões fechados.

- Em um ano no qual não tivemos público, selamos acordo para termos partidas transmitidas pela TV Educativa daqui e também por streaming. Além do contrato de TV, as despesas de arbitragem, inclusive da Série B foram arcadas pela Federação. Não é o cenário ideal, mas tínhamos de contribuir - disse.

Outro Estadual deixou a definição de sua edição de 2020 para o início do ano seguinte. O Campeonato Tocantinense só será retomado em janeiro, para os jogos de volta das semifinais. Palmas e Araguacema brigam por uma das vagas, enquanto a outra chave traz o encontro entre Interporto e Tocantinópolis. 

Em contato rápido, o vice-presidente da Federação Tocantinense de Futebol, José Wilson Soares foi categórico sobre a decisão.

- Não tínhamos como pensar diferente. Marcamos para janeiro devido à preocupação com a pandemia. Ainda vamos aparar as arestas para definir como será com os clubes para essa fase final - declarou.

Com direito a reviravoltas, limitações e fortes emoções, ainda tem muita água para rolar em alguns estaduais pelo país afora.

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