‘Castelo de Cartas’

Luiz Fernando Gomes analisa as prisões dos dois ex-governadores do Distrito Federal que envolvem a Copa do Mundo de 2014 em um suposto esquema de corrupção

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'Em nada surpreende a prisão de dois ex-governadores do Distrito Federal. O que é surpreendente, nesse caso, é que se tenha demorado três anos para concluir algo que desde antes da bola começar a rolar na Copa de 2014 era voz corrente no meio político, nas esferas administrativas ou nos bastidores do futebol: o escandaloso superfatutamento das obras de reforma do Mané Garrincha.

As delações-premiadas da Odebrecht e da Andrade Gutierrez apenas documentaram, portanto, o que já era sabido: um conluio entre empreiteiras e a conduta libertina de José Roberto Arruda e Agnelo Queiroz, fez com que a reconstrução do estádio, orçada inicialmente em cerca de R$ 690 milhões, custasse ao final da obra, em 2014, R$ 1,575 bilhão, indicando um superfaturamento, que pode ter chegado a R$ 900 milhões.

Mesmo no mar de lama regado às cifras bilionárias das propinas pagas pelos empreiteiros, valor de tal monta chama a atenção. Ao que se sabe, nem Sérgio Cabral com sua ganância sem limites foi capaz de abrir um rombo tão grande nas também contestadas obras do Maracanã. Mas, mais do que pelo valor desviado dos cofres públicos para alimentar os bolsos e as campanhas dos inescrupulosos, o Estádio Nacional tornou-se um símbolo, um verdadeiro monumento à malandragem, à inconsequente miscigenação do público com o privado e à ousadia dos larápios que se apoderam do governo do DF, bem no coração da República.

Basta caminhar pelos corredores internos do Mané garrincha - e foi assim mesmo logo depois da inauguração – para perceber-se que algo está errado. Embora tenha sido o mais caro estádio da Copa, o acabamento é rudimentar. Paredes mal revestida, fiação exposta, concreto irregular, um sinal claro que não apenas faturou-se demais como não se fez o que deveria ter sido feito numa obra que custou tanto.

O fio da meada, para escancarar a corrupção que correu solta nas obras da Copa, apenas começou a ser puxado. O Maracanã, o Mané Garrincha,,, outros virão por aí. Delatores já citaram as arenas das Dunas, da Amazônia e do Pantanal. Até sobre o estádio do Corinthians, em Itaquera, já se levantaram suspeitas. Não há divisões geográficas, ideológicas, partidárias. Não há sequer a cor da camisa que o time veste. De norte a sul do país, se o trabalho da Polícia Federal e do Ministério Público continuar no mesmo ritmo, o legado do Mundial – aquele que não deveria ter um centavo de dinheiro público, segundo a farsa de Ricardo Teixeira – vai tombar como um castelo de cartas.'

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