É lugar comum que são as federações as principais interessadas na manutenção dos estaduais. Além de uma robusta fonte de receitas – em alguns estados as cotas chegam a 25% do valor da renda de cada jogo –, esses campeonatos ainda são um instrumento eficiente da politicagem que visa, agradando aos chamados pequenos, a manutenção do status atual e do poder da cartolagem.
Neste cenário, é uma contradição constatar-se que os maiores inimigos desses torneios não são as críticas da imprensa. Quem mais trabalha contra os estaduais são... as próprias federações.
Amadoras, desorganizadas, sem um mínimo de estrutura na maior parte dos estados, acabam metendo os pés pelas mãos. E, onde poderiam funcionar melhor, em centros maiores como o Rio e São Paulo, pecam pela arrogância dos dirigentes ou a insensibilidade de tratar dos mais simples assuntos.
Esta semana foi farta em exemplos de como as federações sabotam os estaduais que, por mais irrelevantes que sejam, deveriam ser tratados, ao menos por elas, como um produto nobre. Talvez o que ainda lhes garanta sobrevivência.
No Paraná, o Coritiba, sem tempo para se planejar, teve de mandar parte de sua delegação de ônibus até Cascavel (498 Km de viagem) já que, a pouco mais de 48 hora de entrar em campo, simplesmente não sabia ainda quem seria o seu adversário nas quartas. Isso por conta de recursos judiciais sobre escalação irregular de um jogador. Mérito que, aliás, não foi julgado e que ainda pode interferir nos resultados do campeonato com uma decisão de tapetão.
No Rio, a irresponsabilidade da Ferj armou uma cilada para o Vasco. O caso é surreal: apesar de o zagueiro Jomar ter tomado três cartões amarelos, sua ficha na federação indicava apenas dois, por conta de uma trapalhada do juiz do clássico contra o Botafogo, que atribuiu na súmula a Rafael Marques o cartão que dera ao zagueiro. Só que a Ferj, em vez de corrigir o imbróglio, autorizou a escalação do jogador contra o Boavista, como se nada tivesse acontecido. Coisa que o Vasco sabiamente não fez, já que obviamente seria alvo de recurso e poderia perder pontos no momento em que briga com Nova Iguaçu e Botafogo por vaga na semifinal do Estadual.
Já em São Paulo, a federação errou feio ao permitir que o Linense vendesse seu mando de campo, marcando para o Morumbi os dois jogos com o São Paulo pelas quartas do Paulistão. Uma brecha do regulamento permitiu a manobra que até a CBF, quem diria, teve o cuidado de eliminar do Brasileirão: a renda das duas partidas será dividida ao meio pelos dois clubes. Se jogar hoje, na casa do adversário, para o Linense será um ótimo negócio, para o campeonato é um desastre: gera prejuízos técnicos e a credibilidade vai para o espaço. A FPF. ao menos, deveria ter marcado o jogo para o Pacaembu, em tese um campo neutro.
Vejam que estamos falando de três das principais entidades regionais do futebol brasileiro. O que nos permite voltar a uma daquelas perguntas que, há anos, não quer se calar: para que servem afinal essas tais federações? O que fazem elas de útil ao esporte? A que se dedicam de fato a não ser a interesses particulares, por vezes inconfessáveis, de um bando de cartolas entrincheirados em seus pequenos feudos?
E o pior é que, como se sabe, ao invés de perder força, essa cartolagem menor continua a ganhar poder. Como se viu na imoral decisão da CBF de multiplicar por três o voto das federações em seu colégio eleitoral. Zico e Leonardo, ilhas de lucidez no nosso futebol, em entrevistas ao LANCE! e ao UOL, outra vez bateram forte nesse modelo. “Não tem sentido mais existirem as federações! Em nenhum outro lugar do mundo elas fazem campeonatos. Há ligas regidas pelos clubes, e as federações cuidam somente das seleções”, disparou o Galinho.
É a pura realidade. Este sistema – e os estaduais são apenas a fatia mais boleira desse bolo estragado – claramente está falido, desgrudado do que acontece no mundo civilizado da bola. Mantê-lo apenas contribui para aumentar o abismo aberto entre o Brasil e o lado de lá do Atlântico.