Nos últimos anos, a discussão sobre o uso de gramado sintético no futebol tem se intensificado, gerando um debate entre clubes, jogadores e especialistas. A rejeição ao gramado sintético persiste entre jogadores de elite. Nesta semana, nomes como Neymar, Gabigol, Lucas e Thiago Silva se posicionaram contra seu uso, argumentando que a dinâmica de jogo é afetada.
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Enquanto alguns defendem a superfície artificial por sua durabilidade e baixa manutenção, outros questionam seus impactos na incidência de lesões. Para entender melhor essa relação, diversos estudos científicos têm investigado as diferenças entre os dois tipos de gramado, com destaque para a frequência e o tipo de lesões observadas.
— Deixando claro, reforçando, é um ponto totalmente técnico, jogabilidade, dinâmica de jogo, não tem nada a ver com questão de lesão. Eu sei que tem vários estudos, alguns que dizem que aumenta o risco de lesão, outros dizem que não tem nada a ver. Enfim, o nosso ponto é técnico, a dinâmica de jogo, o gramado natural, o jogo é diferente do gramado sintético — falou Lucas, um dos idealizadores do movimento.
Uma das pesquisas mais relevantes foi publicada na revista The Lancet em 2023. Nessa meta-análise, pesquisadores examinaram 1.447 estudos e selecionaram 22 que atendiam aos critérios de inclusão. A conclusão do estudo indicou que a incidência geral de lesões no futebol é menor na grama sintética do que na natural. Conforme os dados, o risco de lesão não pode ser usado como argumento contra o gramado artificial (The Lancet, 2023).
Outro estudo significativo, realizado na Major League Soccer (MLS) entre 2013 e 2016, comparou a incidência de lesões em grama natural e sintética. A análise revelou que a taxa média de lesões por jogo foi semelhante entre as duas superfícies, com uma leve variação (1,54 lesões por jogo em gramado sintético e 1,49 em grama natural). No entanto, foi identificada uma maior incidência de lesões no tornozelo e no tendão de Aquiles no sintético, enquanto outras categorias de lesões não apresentaram diferenças significativas (MLS Injury Surveillance, 2013-2016).
No futebol universitário, um estudo baseado nos dados do Sistema de Vigilância de Lesões da NCAA (2004-2014) analisou a ocorrência de lesões do ligamento cruzado anterior (LCA) em diferentes superfícies. Os resultados indicaram que jogadores que treinavam em grama natural apresentavam um risco 26% maior de lesão do LCA em comparação com aqueles que treinavam em gramado sintético. Já em partidas oficiais, a diferença entre as superfícies não foi estatisticamente significativa (NCAA Injury Surveillance, 2004-2014).
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O estudo de Jan Ekstrand para a Aspetar (que segundo especialistas é um dos maiores centros de medicina esportiva do mundo), sobre lesões na coxa também trouxe contribuições importantes para a compreensão das diferenças entre os gramados. Ekstrand analisou a incidência e os padrões de lesões musculares em jogadores de elite, concluindo que a superfície de jogo pode influenciar o tipo de lesão, embora os riscos gerais permaneçam semelhantes. No entanto, podem existir diferenças nos padrões de lesões em cada uma dessas superfícies. Há indícios de um menor risco de distensões musculares ao jogar na nova geração de gramados artificiais, embora também haja sugestões de um maior risco de entorses no tornozelo em gramados artificiais.
Por fim, um estudo sobre o futebol americano e futebol masculino e feminino no esporte colegial americano apontou que as lesões do LCA foram mais comuns em gramado sintético do que em grama natural, tanto no futebol americano quanto no futebol feminino. No entanto, no futebol masculino, essa associação não foi estatisticamente significativa. Entre as lesões nos membros inferiores, o LCA teve maior probabilidade de ocorrer em gramado sintético no futebol masculino e feminino, mas no futebol americano, a diferença não foi significativa (High School Reporting Information Online, 2007-2019).
— Nas principais ligas da Europa não se usa gramado sintético. A Fifa não usa gramado sintético nas competições que ela organiza. O nosso futebol é visto como o melhor futebol, o futebol que produz mais jogadores, e a gente não pode ter gramado sintético aqui — explicou Lucas.
Diante desses estudos, percebe-se que a relação entre gramado sintético e incidência de lesões não é tão direta quanto muitos acreditam. Enquanto alguns padrões de lesões podem variar entre as superfícies, a diferença geral na taxa de lesões não é significativa. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF), ciente dessa controvérsia, produziu um estudo para avaliar a incidência de lesões no Campeonato Brasileiro de 2024, cujo resultado pode influenciar mudanças futuras nas regras do torneio.