Luiz Gomes: ascensão e queda
Declarações recentes de Sergio Malucelli e Carlos Augusto Montenegro no ambiente de Londrina e Botafogo foram um tiro no pé, jogando contra o próprio patrimônio
Nas últimas edições do Brasileirão da Série B o Londrina andou batendo na trave, por pouco não conseguiu uma vaga para voltar à primeira divisão. Campeão paranaense de 2014, o clube do norte do estado teve uma ascensão meteórica, desde a Série D, subindo de divisão ano após ano. Em 2017 foi campeão da Copa da Primeira Liga, batendo o Atlético-MG em uma final histórica para o seu torcedor, na cobrança de pênaltis em pleno Estádio do Café. Mas, esse ano, a situação mudou e o Tubarão, como é tratado, briga para escapar da zona do rebaixamento e corre o risco de afundar-se de novo na Série C.
No sábado, após mais uma derrota, dessa vez para o Operário-PR, jogando em casa, o "dono" do clube, o empresário Sergio Malucelli, soltou às feras contra o elenco. "Eu não culpo os jogadores, culpo eu mesmo por contratar essas porcarias. Quero pedir desculpas para o torcedor pela vergonha que passamos", disparou o dirigente que prometeu anunciar uma lista sumária de dispensas - os primeiros nomes foram anunciados ainda nesse domingo.
O dirigente, ao menos, disparou sua metralhadora verbal em público, durante uma entrevista coletiva. Antes dele, mas na mesma linha que ele, Carlos Augusto Montenegro, o ex-presidente do Botafogo e ainda homem poderoso na política alvinegra foi flagrado na sexta-feira em um áudio vazado de WhatsApp criticando o elenco e, em particular, alguns nomes como o gleiro Gatito Fernández e Rodrigo Pimpão que nos últimos anos, nos bons e nos maus momentos – com salários atrasados, inclusive - estiveram suando a camisa do em defesa do clube.
Ambos deram um tiro no pé, jogaram contra o próprio patrimônio.
Malucelli faz parte de uma geração de cartolas paranaenses intempestivos, falastrões mas reconhecidamente empreendedores que tem no presidente do conselho deliberativo do Athletico, Mario Celso Petraglia, seu representante de maior expressão. Foi em sua gestão que o Londrina voltou a ter relevância no futebol, após uns bons anos de ostracismo. O clube se reestruturou financeiramente, mantém salários e as contas sempre em dia e ganhou, inclusive, um novo CT, hoje considerado um dos melhores do país sem nada deixar a desejar em relação aos de clubes da elite nacional.
Ao assumir a responsabilidade pelo iminente fracasso do Londrina na Segundona – “Anos atrás sempre tomei a medida que eu tinha de tomar no momento certo, este ano demorei demais, já deveria ter feito isso antes” – ele deixa à mostra a fragilidade do modelo amadorístico de gestão que impera nos clubes brasileiros, por vezes, como no caso do Londrina, baseado em indivíduos e não em uma estrutura sequer minimamente profissionalizada. Não são raras histórias desse tipo, como o Cruzeiro dos irmãos Perrela, o Fluminense de Celso Barros, o Santos de Marcelo Teixeira onde períodos de prosperidade e títulos acabam por tornar-se um pesadelo quando termina a relação.
O Londrina, que está a apenas um ponto da zona da degola e hoje enfrenta o Figueirense, lanterna do torneio e outro que está mergulhado numa crise institucional sem precedentes - é, de fato, obra completa da instabilidade de Sérgio Malucelli. O Tubarão começou o ano no G4, chegou a liderar o torneio no melhor início de temporada desde que subiu para a Segundona. Mas, além de trocar quatro vezes de treinador – um deles dirigiu o time em apenas um jogo, goleado pelo Bahia por 4 a 0 na Copa do Brasil – o time sofreu um verdadeiro desmonte durante a parada da Copa América quando quatro de seus principais jogadores, revelações da base, acabaram negociados para o futebol português, para clubes de segunda linha como o Portimonense e o Marítimo. Foi o início da derrocada.
Todo mundo perde quando uma força emergente, como parecia ser o Londrina, naufraga tropeçando nas próprias pernas. Malucelli afirma ainda acreditar em “um milagre” para evitar o rebaixamento. Mas o milagre que o Tubarão precisa – que o futebol brasileiro precisa – é bem outro: o fim do amadorismo, do mecenato, sua substituição por administrações profissionais que adotem modelos empresariais de gestão. É essa a maior contribuição que os Malucellis que existem por aí poderão dar ao esporte.