Vieram à tona na última semana os prejuízos astronômicos causados ao Fluminense pelo ex-presidente Pedro Abad e seu diretor de futebol, Marcelo Teixeira, com a demissão, via WhatsApp, de oito jogadores do elenco, Diego Cavalieri e Henrique à frente, no final de 2017. Uma ação que foi apresentada à época como uma medida de economia para o clube, acabou, pelo descumprimento de acordos firmados, transformando-se em uma dívida trabalhista impagável, hoje estimada em torno de R$ 26 milhões, e que já levou à penhora das cotas de direitos de transmissão pagas pela TV Globo e das receitas dos escassos patrocínios que o clube ainda ostenta na camisa.
Muito se tem comentado sobre as disparidades entre o Flamengo e os rivais cariocas, dentro e fora das quatro linhas. Enquanto o Rubro-Negro surfa em uma onda de estabilidade, investindo cada vez mais alto, Fluminense, Botafogo e Vasco naufragam num pântano de dívidas e turbulências políticas e administrativas. Há quem defenda que, em nome da competitividade regional, o Flamengo deveria ajudar, inclusive financeiramente, os "coirmãos do Rio", como forma de garantir assim sua própria sobrevivência esportiva. Uma balela.
Em primeiro lugar, sejamos objetivos, para que o Flamengo precisa de adversários regionais? Para disputar um falido campeonato estadual? Para jogar clássicos sem nenhuma atratividade e com públicos irrisórios, vexatórios, como ocorreu repetidamente no Carioca desse ano? Não. Definitivamente, o Flamengo – e isso pode se aplicar a tricolores, vascaínos e alvinegros, apesar de tudo – já não precisa mais de um campeonato estadual. Como não precisam os paulistas, os mineiros, os gaúchos, os paranaenses. O jogo, agora, tem de ser jogado é nacionalmente, com o fortalecimento do Brasileirão e da Copa do Brasil e o estímulo às rivalidades além dos limites de cada estado.
A ajuda que o Flamengo podia dar aos outros "grandes" do Rio já foi dada, na forma de um exemplo, um bom exemplo a ser seguido. Um exemplo de responsabilidade fiscal, de equacionamento das contas, de construção de um regime de governança equilibrado, que reduz a influência de grupelhos políticos internos, do amadorismo e, principalmente, do descaso de maus dirigentes com o dinheiro e o patrimônio do clube. É perfeito, um modelo ideal? Obviamente que não. Mas é, indubitavelmente, um avanço para os padrões tupiniquins.
O que se vê do outro lado, em contrapartida, é uma mixórdia. O caso do Fluminense e seu novo rombo não é único, é apenas a mais recente das mazelas que se tem notícia no futebol carioca. O Vasco, além das dificuldades financeiras de sempre, não consegue se libertar, continua a viver o clima de eleições, mesmo um ano e meio meses depois do pleito, deixando amarrado o presidente Alexandre Campello, sempre obrigado a equilibra-se no fio da navalha de sucessivas tentativas de afastamento. Já o Botafogo, no último estudo realizado pelo banco Itaú BBA aparece com a pior situação entre os clubes brasileiros, com uma dívida de R$ 672 milhões e receitas em queda, numa situação que o faz caminhar à insolvência.
Tanto Pedro Abad quanto Marcelo Teixeira já não estão mais no comando do Fluminense. Mas sua gestão temerária continua impune. E certamente assim ficará. Mesmo porque, essa é a ordem vigente no futebol brasileiro. O que não fariam em suas próprias empresas, os cartolas não hesitam em fazer quando chegam ao poder nos clubes. É a lei do “dinheiro não é meu”. Mas já há na legislação formas de se punir individualmente essa gente, inclusive com a imobilização do patrimônio pessoal, dirão os mais otimistas. É uma meia verdade, ganha um doce quem apontar quando e onde isso aconteceu de fato.
Não foram poucas, nos últimos anos, as tentativas de mudar esse cenário. Projetos tramitaram no Congresso propondo a obrigatoriedade ou criando atrativos para a transformação dos clubes em sociedades empresariais. Essa seria, por exemplo, uma contrapartida do Profut, o programa de renegociação das dívidas fiscais e previdenciárias, ainda em vigor, mas que foi derrubada à última hora pela chamada bancada da bola. Agora o tema pode voltar à baila pelas mãos do botafoguense presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Em que pese a prioridade que exigem as reformas estruturais do país, o futebol é um tema que não pode ser esquecido. Urge rapidez na tentativa de corrigir seus rumos, de uma vez por todas.