‘Futuro do esporte estará ameaçado’, diz o presidente do COB sobre cortes

Projeção de redução no orçamento do setor pelo governo federal para 2020 preocupa Paulo Wanderley, que admite o alerta no país sobre a renovação de atletas e cobra ações de entes<br>

imagem cameraPaulo Wanderley tem mandato como presidente do COB até 2020 (Foto: Divulgação/COB)<br>
Avatar
Lance!
Rio de Janeiro (RJ)
Dia 18/10/2019
03:50
Atualizado em 18/10/2019
14:07
Compartilhar

O Comitê Olímpico do Brasil (COB) vive momento crucial na preparação voltada aos Jogos de Tóquio, ao mesmo tempo em que projeta tempos difíceis diante da ameaça de cortes no orçamento federal para os esportes em 2020.

A proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2020 enviada pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional é de R$ 220 milhões para a área, a serem aplicados em programas como o Bolsa Atleta, por exemplo. Despesas operacionais não estão incluídas na conta. Trata-se de uma queda de 49% em relação a 2019, quando a projeção indicava R$ 431 milhões.

Como recebe recursos das loterias federais por lei e conta com outras fontes de renda para abastecer o alto rendimento, o COB não será afetado no curto prazo. Mas o presidente Paulo Wanderley, em entrevista ao LANCE!, admite que existe um alerta sobre os próximos anos.

– O futuro do esporte nos chama a atenção – afirmou o dirigente.

Que impactos o senhor prevê em relação à proposta de Lei Orçamentária do governo federal para o esporte em 2020, com a redução pela metade dos recursos de 2019?
A responsabilidade do COB com o esporte de alto rendimento independe da Lei Orçamentária. Mas serão afetados os projetos voltados para o Bolsa Atleta, Bolsa Pódio e os de apoio ao esporte de base. Como a responsabilidade com a base é do governo federal, nosso futuro esportivo estará obviamente ameaçado com a restrição financeira.

O Brasil foi segundo colocado no Pan de Lima, com recorde de medalhas. No ciclo olímpico, o país está conseguindo resultados expressivos, mesmo após a seca de investimentos da Rio-2016. Por outro lado, é difícil crer em renovação. Como o senhor vê o futuro do esporte por aqui?
O futuro do esporte nos chama a atenção. Já identificamos problemas a médio e longo prazos em relação à renovação das equipes. É necessário o esforço de todos do segmento esportivo para que tenhamos investimentos que possibilitem o surgimento de novos valores para integrar as equipes olímpicas. Além disso, pensa-se muito em surgimento, mas temos atletas já identificados que precisam também de suporte para atingir o alto rendimento. Precisamos da junção de iniciativas do COB, dos clubes, do Ministério da Cidadania, das Confederações, das secretarias esporte dos Municípios e dos Estados, dos patrocinadores, enfim, de todos que participam do sistema e que possam dar suporte, promover o esporte de forma que os programas tenham sustentabilidade, consistência técnica, eficiência e continuidade.

"Pensa-se muito em surgimento, mas temos atletas já identificados que precisam também de suporte para atingir o alto rendimento"

A ginástica artística feminina, por exemplo, não alcançou o objetivo da classificação por equipe para Tóquio-2020. Qual é sua avaliação sobre o modelo de gestão da modalidade, que é exemplo da falta de renovação?
A falta de reposição não é característica da ginástica. É do esporte brasileiro. O número de praticantes de esportes de alto rendimento é pequeno. Nós precisamos de mais pessoas praticando mais atividade física, gerando mais atletas olímpicos. Só assim para chegarmos ao alto rendimento. Isso vale para todos os esportes. O esporte de alto rendimento caminha para levarmos atletas a superar seus limites. Muitas vezes, acontecem lesões e isso faz parte do esporte. Vários países também perderam atletas para lesões. Infelizmente, nossa equipe feminina se viu prejudicada, mas a equipe masculina obteve classificação olímpica com a mesma preparação. 

Haverá mudanças por parte do COB na gestão da ginástica, após ocorrido no feminino?  
O COB e a confederação realizam avaliações permanentes de seus programas, os que obtêm e os que não obtêm sucesso. Para ter melhores processos, a avaliação é permanente e constante. Ao final de cada ciclo olímpico, são realizadas avaliações profundas sobre todo o esporte olímpico nacional. Identificamos pontos fracos e fortes. E tudo é refeito para melhorarmos nossa representação nos esportes.

Ao mesmo tempo em que há previsão de cortes, qual é a previsão de orçamento do COB para 2020? A gestão do legado olímpico pode entrar nesta conta, uma vez que o governo está reduzindo a fatia destinada ao esporte?
A previsão orçamentária é fechada na primeira quinzena de dezembro. A gestão do legado olímpico não é do COB. A única estrutura de legado que está com o Comitê é o Parque Aquático Maria Lenk, que é custeada com nossos recursos. No Maria Lenk, está instalado o Laboratório Olímpico, o Centro de Treinamento do Time Brasil. Atletas e treinadores de diferentes nacionalidades, além de atletas brasileiros, vêm treinando no local, que oferece estrutura de ponta para a preparação de alto rendimento. Seleções da Rússia, atletas da Itália, Grã-Bretanha, Japão, Ucrânia estão entre os estrangeiros que passaram por nosso Centro de Treinamento, em razão de sua qualidade. Para mantê-lo, investimos R$ 11 milhões anualmente e atendemos cerca de 200 atletas brasileiros por mês.

"O projeto de lei da senadora Leila visa gerar oportunidade para que o esporte brasileiro equacione suas pendências, o que será positivo no curto e médio prazo a todos"

O que o senhor acha da possibilidade de as dívidas de confederações serem pagas com recursos da Lei Piva, como propôs a senadora Leila (PSB-DF)? Ou acredita que o COB deva manter o controle que tem hoje sobre entidades?
O COB não controla as confederações. Por força constitucional, elas têm autonomia. O projeto de lei de autoria da senadora Leila visa gerar uma oportunidade para que o esporte brasileiro equacione suas pendências, o que será positivo no curto e médio prazo para todos.

QUEM É ELE

Nome
Paulo Wanderley Teixeira
Nascimento
29/9/1950, em Caicó (RN)
Trajetória
Paulo Wanderley se formou em Educação Física em 1972 e se tornou técnico de judô. Foi treinador da Seleção Brasileira de 1979 até 1993. No período, comandou o país nos Jogos Pan-Americanos de Havana-1991 e nos Jogos Olímpicos Barcelona-1992.

Na ocasião, foi técnico de Rogério Sampaio, hoje diretor geral do COB, na conquista do ouro olímpico. Com o tempo, Wanderley se interessou cada vez mais pelos bastidores. Em 2001, assumiu a presidência da Confederação Brasileira de Judô (CBJ), cargo que ocupou por 16 anos.

Em 2016, assumiu como vice de Nuzman. Com a renúncia do antecessor em 2017, suspeito de intermediar a compra de votos da Rio-2016, ele virou presidente até 2020.

Siga o Lance! no Google News