Processos de doping de amadores no Brasil atrasam julgamentos da elite

Atletas em período de qualificação olímpica chegam a esperar um ano para terem casos julgados pelo tribunal do país. Novo código da Wada prevê menor foco nos recreacionais

imagem cameraO Brasileiro Master de ciclismo de 2019 teve presença da ABCD para testar amostras (Arte: Marina Cardoso/Lance!)
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Lance!
Rio de Janeiro (RJ)
Dia 27/09/2019
05:26
Atualizado em 27/09/2019
15:16
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Uma das insatisfações entre especialistas em doping sobre o código atual da Agência Mundial Antidoping (Wada) é com o controle intensivo, que afeta não só os atletas de alta performance, como também os amadores, classificados pela entidade mundial como recreacionais.

A questão está presente na nova versão do código para 2021, que prevê foco menor no grupo. A grande reclamação é de que as filas de processos nos tribunais são cada vez maiores.

No Tribunal de Justiça Desportiva Antidopagem (TJD-AD), o tempo de conclusão no terceiro e no quarto trimestre de 2018 foi de quase um ano. É por isso que as suspensões costumam ser aplicadas de forma retroativa à data da coleta, como no caso do skatista Pedro Barros, flagrado em 2017 por um dos princípios ativos da maconha.

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A demora pode afetar a programação de um esportista que eventualmente não tenha se dopado de forma intencional e queira lutar por vaga olímpica.

– É um problema que vários tribunais antidopagem estão sofrendo. Temos uma série de atletas que precisam ser julgados rapidamente, para efeito de qualificação olímpica, e entram na mesma fila dos que disputaram a corrida da Adidas no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, por exemplo. Isso nem de longe é o ideal  – opinou o advogado Marcelo Franklin, ao LANCE!.

Conclusão de processos no país é lenta (Arte: Marina Cardoso/Lance!)

O L! mostrou na última terça-feira, o número de casos de doping no ciclismo brasileiro cresce a cada ano. O país tem 36 suspensos, dos quais 21 foram testados pela ABCD. Na conta, estão diversos amadores, que começaram a ser analisados desde a Rio-2016.

O Campeonato Brasileiro Master, em Senador Canedo (GO), teve pela primeira vez exames antidoping. Em uma das categorias, o segundo e o quarto colocado desapareceram no momento da cerimônia de pódio.

Outro problema é financeiro. Cada teste realizado pela Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) custa cerca de R$ 1.300 aos cofres públicos. Por isso, há um impasse. Ao mesmo tempo em que é desejável o aumento no número de coletas no país, no sentido de proteção da saúde dos esportistas, muitos entendem que o foco dos poucos recursos deve ser o alto rendimento.

– Haverá uma mudança no novo código da Wada, desonerando as entidades de testarem o recreacional, que não deve ser o foco do investimento – diz Franklin.

Conforme o L! publicou na última quinta-feira, o orçamento da ABCD para 2018 e 2019 foi de R$ 6,7 milhões, seis vezes menos do que países europeus. É com a verba que o governo testa os esportistas em território nacional.

Para o professor L. C. Cameron, da UNIRIO, a solução para a questão do doping em atletas amadores deve ser muito mais educativa do que punitiva.

– Acredito que deve haver maior controle, mas quando se testa o amador, sobram menos recursos para testar o atleta profissional. Hoje, sou favorável ao controle extensivo. É comum um jovem de 15 anos entrar em uma academia e toma suplementos sem qualquer orientação profissional qualificada. O amador é submetido a uma ideia de esporte falsa. Ele acha que vai levantar a mesma carga que o atleta que treina 5 a 8 horas por dias. Então, acaba procurando artifícios para isso – diz o professor.

As despesas em casos de doping não são altas só para o governo. Para solicitar de abertura de uma amostra B, por exemplo, o atleta tem de pagar R$ 3.000 ao Laboratório Brasileiro de Controle de Dopagem (LBCD), no Rio de Janeiro.

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