Uma das insatisfações entre especialistas em doping sobre o código atual da Agência Mundial Antidoping (Wada) é com o controle intensivo, que afeta não só os atletas de alta performance, como também os amadores, classificados pela entidade mundial como recreacionais.
A questão está presente na nova versão do código para 2021, que prevê foco menor no grupo. A grande reclamação é de que as filas de processos nos tribunais são cada vez maiores.
No Tribunal de Justiça Desportiva Antidopagem (TJD-AD), o tempo de conclusão no terceiro e no quarto trimestre de 2018 foi de quase um ano. É por isso que as suspensões costumam ser aplicadas de forma retroativa à data da coleta, como no caso do skatista Pedro Barros, flagrado em 2017 por um dos princípios ativos da maconha.
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A demora pode afetar a programação de um esportista que eventualmente não tenha se dopado de forma intencional e queira lutar por vaga olímpica.
– É um problema que vários tribunais antidopagem estão sofrendo. Temos uma série de atletas que precisam ser julgados rapidamente, para efeito de qualificação olímpica, e entram na mesma fila dos que disputaram a corrida da Adidas no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, por exemplo. Isso nem de longe é o ideal – opinou o advogado Marcelo Franklin, ao LANCE!.
O L! mostrou na última terça-feira, o número de casos de doping no ciclismo brasileiro cresce a cada ano. O país tem 36 suspensos, dos quais 21 foram testados pela ABCD. Na conta, estão diversos amadores, que começaram a ser analisados desde a Rio-2016.
O Campeonato Brasileiro Master, em Senador Canedo (GO), teve pela primeira vez exames antidoping. Em uma das categorias, o segundo e o quarto colocado desapareceram no momento da cerimônia de pódio.
Outro problema é financeiro. Cada teste realizado pela Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) custa cerca de R$ 1.300 aos cofres públicos. Por isso, há um impasse. Ao mesmo tempo em que é desejável o aumento no número de coletas no país, no sentido de proteção da saúde dos esportistas, muitos entendem que o foco dos poucos recursos deve ser o alto rendimento.
– Haverá uma mudança no novo código da Wada, desonerando as entidades de testarem o recreacional, que não deve ser o foco do investimento – diz Franklin.
Conforme o L! publicou na última quinta-feira, o orçamento da ABCD para 2018 e 2019 foi de R$ 6,7 milhões, seis vezes menos do que países europeus. É com a verba que o governo testa os esportistas em território nacional.
Para o professor L. C. Cameron, da UNIRIO, a solução para a questão do doping em atletas amadores deve ser muito mais educativa do que punitiva.
– Acredito que deve haver maior controle, mas quando se testa o amador, sobram menos recursos para testar o atleta profissional. Hoje, sou favorável ao controle extensivo. É comum um jovem de 15 anos entrar em uma academia e toma suplementos sem qualquer orientação profissional qualificada. O amador é submetido a uma ideia de esporte falsa. Ele acha que vai levantar a mesma carga que o atleta que treina 5 a 8 horas por dias. Então, acaba procurando artifícios para isso – diz o professor.
As despesas em casos de doping não são altas só para o governo. Para solicitar de abertura de uma amostra B, por exemplo, o atleta tem de pagar R$ 3.000 ao Laboratório Brasileiro de Controle de Dopagem (LBCD), no Rio de Janeiro.