‘Bragantines 12 anos’: quando o Bragantino encerrou invencibilidade do Palmeiras e manteve rival na fila
Detentor da Taça dos Invictos em 1989, Verdão parecia que ia encerrar o jejum de títulos que vinha desde 1976. Mas aí apareceu o Massa Bruta de Luxemburgo no caminho...
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Não há torcedor do Palmeiras com mais de 40 anos que toda vez que olha para a garrafa de um conhecido whisky do mercado e não se lembre de 1989. Tal como acontece neste sábado (26), naquela temporada o Verdão, também invicto, tinha pela frente o Bragantino em seu caminho pelo Campeonato Paulista. Era um triangular das quartas de final. Mas o Massa Bruta, sob o comando de Vanderlei Luxemburgo, surpreendeu, venceu por 3 a 0, eliminou os alviverdes e impôs a indigesta piada dos rivais, citada no título desta reportagem, uma alusão aos anos da indigesta e sofrida fila que terminaria somente em 1993.
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O ano de 1989 parecia predestinado aos palmeirenses, afinal montara o melhor elenco desde 1986, outro doído ano em que o Verdão chegou à final do Estadual e perdeu em pleno Morumbi para a Inter de Limeira.
Para técnico, a aposta da diretoria foi em Emerson Leão. ídolo das metas alviverdes, havia encerrado a carreira há menos de três anos e ganhava ali sua primeira oportunidade em um time grande.
Para reforçar o time, vieram nomes de peso, como o zagueiro uruguaio Darío Pereira, ídolo do rival São Paulo, o centroavante Gaúcho, que depois faria história no Flamengo, e o ponta Mauricinho, conhecido em Vasco e Botafogo.
Mas as atenções da torcida estavam voltadas para dois nomes que vieram a peso de ouro do Guarani: o meia-atacante Careca, idolatrado até hoje por ter sido envolvido em 1991 na troca que trouxe Evair ao Verdão, e Neto. Sim, o Craque Neto, hoje na TV, corintiano histórico, que tinha sua segunda oportunidade em um grande da capital - passara por empréstimo pelo São Paulo em 1987.
Haviam também pratas da casa festejados, como o zagueiro Toninho, o Cecílio, ex-técnico e hoje dirigente, o goleiro Veloso, que tinha seu primeiro ano como titular do Verdão, e o meia Edu Manga, há anos já apontado como a principal peça do elenco. Também sobravam destaques das temporadas anteriores, como o lateral Édson, o popular 'Abobrão', que veio do rival alvinegro, e Júnior, o Dorival, então um volante que repetia com a camisa alviverde, em partes, o bom desempenho de seu tio Dudu, esse ídolo máximo das duas academias dos anos 1960 e 1970.
Campanha foi histórica (pelo menos até o tropeço)
O resultado veio de forma imediata e o Palmeiras começou a empilhar vitórias. O regulamento previa que na primeira fase, os 22 clubes participantes daquela edição foram divididos em dois grupos com onze equipes cada. No primeiro turno, equipes do Grupo 1 enfrentaram as do Grupo 2; no segundo turno, as equipes jogaram entre si em seus grupos. Classificaram-se os três primeiros colocados de cada grupo, mais os seis melhores de todos os restantes para a segunda fase. O sistema de pontuação privilegiava os vencedores que fizessem três ou mais gols (independentemente da diferença), e também os que empatassem com marcação de gols.
Já garantido nas quartas de final com oito rodadas de antecedência, restava ao Palmeiras na disputa desta fase inicial a disputa da Taça dos Invictos. Prêmio criado pelo jornalista Tomás Mazzoni e entregue em seu início pelo jornal A Gazeta Esportiva, ganhara uma nova versão nos anos 1980 pela própria Federação Paulista de Futebol e estava em posse do Corinthians desde o ano anterior.
A conquista simbólica veio no 25 de maio, após um empate em 1 a 1 com o... Bragantino, fora de casa, em jogo marcado pela violência. Torcidas organizadas do Palmeiras arrumaram brigas antes, durante e depois do jogo, na estrada voltando para a capital. Um cachorro da Polícia Militar chegou a ser morto a dentadas por um palmeirense e teve o cadáver exposto e jogado aos altos pelos fãs por todo o segundo tempo da partida. Uma cena mórbida relembrada pelo próprio Luxemburgo anos depois, em 2009, quando já treinava o Alviverde pela quarta vez na carreira.
- Essa Mancha Verde vem há anos fazendo isso (violência contra atletas). Essa é a característica desta torcida. A torcida mais violenta que tem é a torcida do Palmeiras, que sempre pegou jogador. Quando eu estava no Bragantino, eu vi um cara morder um cachorro e quebrá-lo no meio. Também pegaram a bicicleta de um torcedor e levaram dentro de um ônibus e jogaram uma moto dentro de um lago - disse Luxa.
Os relatos dos jornais na ocasião reiteram o que foi dito pelo treinador, hoje desempregado desde que saiu do Cruzeiro no início do ano. 'Foi uma partida nervosa, muito disputada, mas sem violência entre os jogadores. A vergonha ficou fora do campo e, mais uma vez, foi provocada pela torcida 'Mancha Verde', do Palmeiras, que no intervalo agrediu torcedores do Bragantino e enfrentou a polícia com pedras e porretes. [...] A confusão continuou pelas ruas da cidade, com torcedores quebrando vidros de carros e estragando pneus e latarias', escreveu o jornal O Estado de S. Paulo em sua edição do dia seguinte.
O dia em que o palmeirense chorou
A tarefa do Palmeiras na reta final do Paulistão de 1989 parecia fácil: empatar com o Bragantino fora de casa para manter a liderança do triangular do Grupo D das quartas de final. Com isso, o time alimentava o sonho de colocar ponto final ao jejum que chegaria a 13 anos sem títulos.
A equipe iniciou até que bem a trajetória naquele triangular. Empatou em 0 a 0 com o Novorizontino, fora de casa. Na segunda rodada, bateu o Massa Bruta por 2 a 0, gols de Mauricinho e Júnior. Mas o jogo registrou o primeiro sinal de alerta. Dorival brigou com companheiros de time em campo que passaram a zombar dos jogadores rivais, falando de seus salários maiores e da estrutura que tinham à disposição. Luxemburgo percebeu a situação e tirou proveito.
- Durante toda a semana eu usei aquilo para incentivar minha equipe. Falava para eles, 'viram como vocês foram humilhados, viram o que eles pensam de vocês', chamei a atenção para o que a torcida deles seria capaz em caso de tropeço e deixei claro que a pressão era do Palmeiras, não nossa - disse o treinador, em entrevista dada em 1996 à TV Cultura.
O caldo palmeirense começou a entornar na quarta-feira antes do duelo, quando recebeu o Novorizontino no Pacaembu e de novo não saiu de um empate sem gols. Mesmo assim, bastava vencer o Bragantino no sábado, dia 10 de junho, o que não parecia uma tarefa tão difícil para quem acumulava 14 vitórias e nove empates até ali.
Mas a coisa não aconteceu. Leão sacou Gaúcho e Careca dos titulares, apostou em Marcus Vinícius, uma promessa contratada junto ao Grêmio, o que levantou suspeitas sobre quem de fato estava ofendendo os jogadores do Braga no Pacamebu. Nabi Abi Chedid, histórico presidente do time interiorano e que hoje dá nome ao estádio, tratou de cortar o número de ingressos dos palmeirenses. Apenas 700 bilhetes foram enviados ao antigo Parque Antártica para venda. Fora isso, prometia premiação gigantesca em dinheiro.
Deu certo. Irreconhecível em campo, o Verdão foi presa fácil e perdia ali seu primeiro e único jogo naquela edição do Paulistão, tendo que esperar mais alguns anos até sair de fato da fila. A eliminação, contudo, veio com requintes de crueldade, só na quarta-feira seguinte, com a vitória do Bragantino sobre o Novorizontino.
Como consequência, nomes como Neto e Gaúcho deixaram o Palmeiras. O meia, inclusive, se tornaria um dos maiores ídolos do rival Corinthians, envolvido em uma polêmica troca junto com o lateral-esquerdo Denys pelo também lateral Dida e o volante Ribamar.
Pelo lado do Bragantino, a equipe acabou eliminada na semifinal para o São Paulo, campeão daquele ano em cima do São José, a outra zebra da edição. Entretanto, a espinha dorsal da equipe que faturaria o Estadual de 1990 estava montada, elevando o nome de Luxemburgo a um dos maiores do país.
FICHA TÉCNICA
BRAGANTINO 3 x 0 PALMEIRAS
BRAGANTINO
Paulo César; Gil Baiano, Júnior, Nei e Biro-Biro; Souza, Valmir e Zé Rubens; Ivair, Gallo (Gatãozinho) e Luís Müller (João Batista)
Técnico: Vanderlei Luxemburgo
PALMEIRAS
Velloso; Édson Boaro, Toninho, Dario Pereyra e Abelardo (Gaúcho); Júnior, Gérson Caçapa (Eraldo) e Edu; Mauricinho, Marcus Vinicius e Neto
Técnico: Émerson Leão
GOLS: Gil Baiano, aos 29, e Zé Rubens, aos 33 minutos do primeiro tempo. Gallo aos 15 minutos do segundo tempo.
Árbitro: Luís Carlos Antunes (SP)
Cartões amarelos: Gatãozinho (Bragantino), Edu (Palmeiras)
Renda: NCz$ 54.674,00
Público: 9.778 pagantes
Local: Estádio Marcelo Stéfani, em Bragança Paulista (SP).
TABELA
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