Assistir ao vôlei de praia nos Jogos Rio-2016 significa presenciar um aparente processo de globalização do esporte. Mas o que soa bonito no discurso esconde grandes contradições na prática.
Enquanto é beneficiada pelo intercâmbio entre países devido à troca de experiência entre profissionais de diferentes regiões, a Federação Internacional de Vôlei (FIVB) está preocupada com eventuais abusos e já trabalha para dificultar ao máximo a naturalização de jogadores.
Nos últimos anos, aumentou o número de atletas que vestem a bandeira de uma nação apenas para realizar objetivos de curto prazo, como disputar uma Olimpíada.
Em um só dia em Copacabana, o público chega a se deparar com até quatro naturalizados, além de técnicos brasileiros que comandam duplas de fora, como o carioca Márcio Sicoli, com Walsh/Ross (EUA), o pernambucano Eduardo Garrido, com Marco Grimalt/Esteban Grimalt (CHI), e o baiano Paulão, com Ranghieri/Carambula (ITA).
Se o intercâmbio dos treinadores é bem visto, o de jogadores é alvo de críticas.
"Naturalizar não é algo ligado a desenvolver o esporte. O mais interessante é criar uma forma de fazer crescer o esporte em cada região" - Paulão
– O importante é o desenvolvimento do vôlei de praia nos países. Naturalizar não é algo ligado a este princípio. O mais interessante é criar uma forma de fazer crescer o esporte em cada região – disse Paulão, que mora há 11 anos na Itália e, apesar da opinião, treina o uruguaio naturalizado Carambula.
– É o mérito do vôlei brasileiro. Somos considerados uma grande nação do esporte. Muitos países começaram a querer levar nossa escola – completa.
Aos 27 anos, o carioca Jefferson Santos, que joga pelo Qatar, pensa diferente. Parceiro do senegalês Cherif Younousse, também naturalizado, ele lamenta que haja restrições.
– O Brasil está exportando profissionais, pois aqui há um mercado grande. Acho que é preciso abrir para que todos possam tentar realizar o sonho da Olimpíada – diz Jefferson, que admite as barreiras em Doha.
– Minha vida teve uma alavancada. Não tive como voltar. Mas sinto falta dos fins de semana e da praia. Lá, só tem cerveja em lugar fechado. Na rua, não pode – conta o jogador.
A discussão é polêmica. O espanhol Adrian Gavira, que joga com Pablo Herrera, acredita que há uma questão ética a ser considerada quando alguém aceita competir por outro país sem ter um vínculo.
– Se isto for porque ele não tem oportunidade em seu país, entram a ética e a moral de cada jogador. Eu não faria – afirmou o espanhol.
Em Pequim (CHN), os paraibanos Jorge e Renato disputaram a Olimpíada pela Geórgia, e terminaram em quarto lugar. No futuro, isto não será possível. A FIVB só permitirá um naturalizado por dupla.
No Rio, a peruana Mariafe del Solar, de 22 anos, é outra da lista. Ela defende a Austrália, ao lado de Nikki Laird.
Se um atleta decide defender outro país, a FIVB não permite que ele volte atrás.
Com a palavra:
O objetivo é evitar que haja abuso da regra
Angelo Squeo - Diretor de vôlei de praia da FIVB, ao Lance!
O mundo passa por mudanças, e nós acompanhamos o processo. Eu vim da Itália, mas há pessoas na federação de Brasil, Argentina, Japão e lugares da Europa. Há quem se mude e se case em outro país. E nós consideramos o fator residencial.
Mas temos tornado muito difícil a naturalização, pois não queremos que jogadores abusem do regulamento. Era o que estava acontecendo, na nossa avaliação.
Uma vez obtida a dupla-cidadania, é preciso cumprir um período de dois anos de residência. Depois, são necessários até dois anos para a solicitação ser aceita.
Nosso objetivo é evitar que pessoas se mudem para disputar um torneio importante por outro país sem que haja um trabalho de jogadores por lá. Formar atletas no alto nível leva oito anos, no mínimo. Cada nação deve buscar o seu crescimento no esporte.