A beleza e a orientação sexual não são assuntos prioritários para Elena Delle Donne. Neste sábado, às 15h30, a ala, estrela da seleção americana feminina de basquete, enfrenta a Espanha na Arena Carioca 1 para deixar para trás os rótulos de musa e gay e ser reconhecida apenas como a craque que é.
Delle Donne sempre adotou postura feminista quando perguntada sobre sua aparência. Em março, por exemplo, a ala discursou em evento da ESPNW americana e questionou quantas vezes Tom Brady foi perguntado sobre sua aparência. Disse ainda que espera pelo dia em que poderá falar apenas sobre sua habilidade na quadra em entrevistas sem ter que responder sobre seu vestido ou sobre seu cabelo, ou a cor dos seus olhos.
O interesse sobre a vida pessoal de Delle Donne aumentou no começo de agosto, quando, a poucos dias da Olimpíada, a revista a americana Vogue publicou um perfil da ala mostrando que ela tem uma noiva. A reportagem do periódico foi à casa do casal, e foi a primeira vez que a ala americana falou publicamente sobre sua sexualidade.
Sair do armário? Para Delle Donne, a matéria não foi bem isso. Segundo a ala, sua família e suas companheiras de time já sabiam do relacionamento, e o assunto não é tão grande quanto a imprensa americana quer que seja.
Grande, sim, é a carreira de Delle Done. Com médias de 8,3 pontos e 3,2 rebotes em 17 minutos por exibição no Rio de Janeiro, a ala busca sua primeira medalha olímpica para rechear sua galeria de conquistas, que já tem o ouro na Universíade de 2011 e o prêmio de MVP da WNBA no ano passado.
Neste sábado, se quiser surpreender as americanas, a Espanha terá de se preocupar com Delle Donne. Uma craque, e nada mais do que isso.
QUEM É ELA
Nome
Elena Delle Done
Nascimento
5/9/1989 - Wilmington (EUA)
Posição
Ala
Prodígio
A carreira de Delle Donne começou bem. Selecionada na segunda escolha do Draft de 2013 da WNBA pelo Chicago Sky, foi eleita a melhor novata da temporada.
Estrela
Desde então, Delle Donne foi três vezes All-Star da WNBA, além de ter sido escolhida a MVP da liga profissional americana em 2015.
BATE BOLA
Elena Delle Donne, ao LANCE!
Sua geração é muito ativa falando sobre problemas sociais, como feminismo, racismo e homofobia. Acha que esse pode ser o legado de vocês?
Sim. Acho que isso que é tão especial, sobre essa geração, se preocupar em falar sobre coisas difíceis. Espero que um dia esses problemas possam acabar para nós não precisarmos mais falar sobre isso. Mas se você deixar de falar sobre essas coisas e simplesmente empurrá-las para debaixo do tapete, elas vão continuar existindo. Espero que nossa geração seja capaz de mudar isso.
Você acha que isso é algo especificamente dessa geração de jogadoras? Ou acha que o mundo está mudando de maneria geral em direção a isso?
Acho que o mundo está mudando, com certeza. E acho que as redes sociais ajudam muito nisso. Muito mais gente é capaz de falar e ser ouvido.
COM A PALAVRA
Renata Mendonça, co-fundadora do dibradoras, projeto que busca dar visibilidade às mulheres no esporte
A Olimpíada do Rio já começou dando um recado para o machismo. Um total de 47% das 206 delegações que vieram ao Brasil eram mulheres. É a menor diferença de gênero já registrada na história dos Jogos. Comparando com 116 anos atrás, quando as mulheres puderam pela primeira vez disputar a Olimpíada, vejam o quanto evoluímos: em 1900, elas eram só 2,2%.
Elas que por tanto tempo foram impedidas de praticar qualquer esporte - o futebol, por exemplo, foi proibido por lei para mulheres por 40 anos, até a década de 1980. Quanta coisa já inventaram para tirá-las dali - as tarefas da casa, a obrigação de ser mãe... até a menstruação já foi "impeditivo" para eles dizerem que "esporte não era para elas".
Mas 2016 chegou, e elas ~dibraram todas essas adversidades para mostrar que essa só poderia ser a Olimpíada das mulheres. A primeira medalha desses Jogos foi para uma mulher - Virginia Thrasher, ouro no tiro esportivo. O primeiro ouro do Brasil foi para uma mulher, negra, da favela, lésbica. O futebol ganhou uma nova artilheira. Isso mesmo, artilheirA, Cristiane - ninguém marcou mais gols que ela na história das Olimpíadas, entre homens e mulheres. O mundo se encantou com a imbatível Simone Biles na ginástica. Viu a primeira mulher negra da história a ser campeã olímpica na natação. O Brasil viu a primeira mulher a subir num pódio olímpico nesse mesmo esporte, com Poliana Okimoto, na maratona aquática. O primeiro ouro feminino da vela, com Martine Grael e Kahena Kunze. Sem falar nos milhares que encheram os estádios por aqui para ver Marta, a melhor de todos os tempos, Formiga, a única atleta a disputar seis Olimpíadas seguidas… A lista só aumenta.
E mesmo com tudo isso, ainda existem sites, jornais, canais de TV que insistem em falar apenas da beleza delas - esquecendo que, antes de tudo, elas são atletas. Elas são muito #MaisQueMusas, como bem diz a campanha para valorizar os feitos delas nesses Jogos. Quem ainda insiste em ignorar isso, vai ficar para trás (já está ficando, aliás).
Mas nenhuma dessas conquistas veio de mão beijada. Foi preciso muito esforço, muita teimosia - foi preciso resistir. Mas o melhor de tudo isso é saber que o maior legado que essas mulheres vão deixar após os Jogos do Rio não serão as medalhas conquistadas, e sim a inspiração para tantas milhões de meninas no mundo inteiro - a mensagem de que elas podem chegar lá e que jogar, lutar ou competir como uma menina agora tem outro significado (e temos muito orgulho dele).
COM A PALAVRA
Michael, jogador do Vôlei Maringá
É muito importante as ligas esportivas apoiarem a causa LGBT. As ligas esportivas têm um espaço gigante na mídia junto a grandes atletas, que são formadores de opinião.
Quando ocorreu meu caso, em 2011, nunca imaginei que um patrocinador fosse abraçar a causa como o Vôlei Futuro abraçou. Não só pela solidariedade e carinho comigo, mas principalmente com toda comunidade LGBT. Abriu os olhos de muita gente em relação a homofobia e preconceito, que são reais em nossa sociedade.
Achei demais o que a NBA fez, de ter ido na Parada de Nova York. Somos formadores de opinião. Quando mais pudermos apoiar a causa, mostrar que somos seres humanos normais, mais seremos aceitos e estaremos a caminho de um mundo mais igual.
Estamos andando a passos de tartaruga em relação à NBA e a outras políticas LGBT. Mas estamos andando, graças a muita gente que não tem medo de se posicionar e lutar pela causa.