O interesse do torcedor pela Seleção Brasileira continua a desabar. Um levantamento realizado em maio pelo instituto paulista PróPesquisa revelou que, mesmo às vésperas da participação na Copa América Centenário e a menos de três meses da disputa da medalha de ouro na Olimpíada do Rio, 91% dos entrevistados afirmavam estar “pouco interessado ou nada interessado” em acompanhar o time de Dunga. E pode-se incluir aí a convocação, a preparação ou mesmo a atuação em campo. Apenas 8% disseram estar interessados ou muito interessados no assunto e 1% não opinaram.
É o terceiro levantamento sobre o tema realizado pelo instituto. Nas duas rodadas iniciais da pesquisa, realizadas no ano passado com a mesma metodologia e uma amostragem semelhante, o grau de interesse despertado pela Seleção chegou a 12% em agosto - pouco mais de um ano após o desastre dos 7 a 1 para a Alemanha na Copa -, e 14% em novembro, quando começaram as Eliminatórias.
De acordo com Rodrigo de Souza Queiroz, diretor do PróPesquisa, esses números ruins refletem um cenário negativo que passa pela desilusão com a má gestão e os escândalos da CBF e pela falta de mudanças efetivas no nosso futebol.
- É um conjunto da fatores. Em primeiro lugar, não houve a reforma que todo mundo esperava, que a mídia cobrava a partir do fiasco na Copa do Mundo. Um ex-dirigente (José Maria Marin) está preso nos Estados Unidos e o atual (Marco Polo Del Nero) não pode sair do país, é o único dos envolvidos no escândalos que ainda continua presidindo uma federação. Não houve renovação alguma, nem fora nem dentro do campo. Dunga não empolga, nunca foi o preferido, como pesquisas anteriores demostraram – afirma Rodrigo.
O levantamento do PróPesquisa ouviu, durante o mês de maio, mil entrevistados no estado de São Paulo. A margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos e o intervalo de confiança é de 95%. O instituto tem 26 anos de atuação e, desde 2008 realiza levantamentos sobre temas do cotidiano, hábitos, costumes e opiniões da população.
"Não houve renovação alguma, nem fora nem dentro do campo. Dunga não empolga, nunca foi o preferido, como pesquisas anteriores demostraram"
O desinteresse do brasileiro pela seleção é geral, atinge indiscriminadamente a todas as camadas sociais, as faixas etárias e os níveis de escolaridade da população. No entanto, a pesquisa revelou que é exatamente entre os mais jovens (93% de rejeição entre 16 e 24 anos) e os de maior escolaridade (95% de rejeição entre os de nível superior) que o sentimento de desprezo chega ao
ponto mais extremo. De acordo com Rodrigo Queiroz, a explicação para esse comportamento das novas gerações vem duas razões principais: os resultados magros em campo e o ambiente do futebol brasileiro comparado com o resto do mundo.
Entre os mais velhos, ainda sobrevive a aura da camisa amarela. Dos tempos que o Brasil jogava e o país parava. Do futebol arte de 82, por exemplo.
- Um ponto que acho interessante, em relação aos mais novos, é que não é apenas a ausência de um título. Eu nasci em 1970. Só fui ver a Seleção campeã com 24 anos de idade. Mas antes disso, a Seleção, ganhando ou não, era algo que impunha respeito. Sabíamos o que poderíamos esperar dela. Agora, o que vejo, é que não podemos esperar muito dela. Especular se teremos ou não bons resultados nas eliminatórias era algo impensável antes. Agora questionamos tudo – explica ele.
Por outro lado, a globalização do futebol, as transmissões de TV das principais competições europeias e o interesse cada vez maior pelo futebol internacional, fez crescer o grau de exigência do público, especialmente os mais jovens.
- Hoje nós vemos o quanto a Europa evoluiu, seja no jogo, nos estádios, na organização dos campeonatos. Basta comparar a Eurocopa que vai se iniciar e essa Copa América que inventaram aí A atratividade é completamente distinta. Não há como negar que o campeonato das seleções europeias vai despertar um interesse maior – acrescenta Queiroz.
Quanto à escolaridade, o diretor do PréPesquisa explica que, quanto mais acesso à informação, maior é a capacidade de entender os desvios da gestão da CBF e os escândalos que se abatem sobre o futebol brasileiro, o que acaba refletindo no aumento do grau de desinteresse pelas coisas da entidade, impactando assim também a seleção.
REJEIÇÃO DO PÚBLICO X PERDA DE RECEITAS
O divórcio entre o torcedor e a Seleção Brasileira não é novo. Mas, quanto mais persiste e mais se agrava, traz consequências que podem impactar a médio prazo na própria estrutura financeira da CBF. Somente no ano passado, a entidade comandada por Marco Polo Del Nero perdeu cerca de R$ 20 milhões em contratos publicitários com as saídas de empresas como Unimed, P & G, Sadia, Michelin e Gillete. Embora executivos não admitam às claras, certamente a rejeição do público é um dos pontos a influenciar essa tomada de decisão.
A saída desses patrocinadores, na prática, ainda não impactou negativamente o balanço da entidade. Os números de 2015 revelaram um superavit de R$ 72,081 milhões, cerca de R$ 20 milhões a mais que no ano anterior, quando ficou em R$ 51,010 milhões. Mas não foi a boa gestão, e sim a disparada do dólar que garantiu o resultado positivo, já que os contratos de patrocínio são feitos principalmente com base na moeda americana. Além disso, vários dos contratos foram rompidos ao longo do ano, ainda gerando receitas no exercício de 2015.
Para o colunista do LANCE! Amir Sommogi, especialista em gestão e marketing, o notório distanciamento da Seleção Brasileira com a população é reflexo do descaso e de decisões equivocadas da CBF. A realização de partidas no exterior, a ausência de ídolos dos times brasileiros e os maus resultados são alguns dos muitos fatores que acarretaram em um desprezo por parte dos brasileiros.
- Embora a CBF fature alto com seus patrocinadores, bem mais que os grandes clubes, o consumidor final dessas marcas não dá a menor importância para a Seleção. As audiências, embora um pouco maiores que as partidas dos clubes, não justificam tamanho investimento. Se os patrocinadores da CBF fizerem as contas perceberão que estão pagando muito, com baixo apelo e baixo retorno - afirma Amir.
Para o colunista. essa distância gera também impacto nas vendas de produtos da própria CBF o que é sentido pelo seu parceiro de material esportivo.
- Alguém tem dúvida de que se o brasileiro amasse de verdade sua Seleção as vendas não seriam anda maiores? - questiona.
Ele afirma que a saída para essa situação é uma mudança no trabalho de marketing focada numa aproximação do público com a seleção, o que já foi natural no passado.