Superação e talento: Ex-morador de rua, Fininho brilha no surfe: ‘Destino’

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Sobram histórias de superação no esporte. Algumas se destacam graças a trajetória de vida de quem já sofreu muito para vencer, em um primeiro momento, na vida. É o caso de José Francisco Filho, o Fininho, de 20 anos. Com apenas oito, o paraibano de João Pessoa decidiu fugir de casa por conta do sofrimento que enfrentava com o pai e a mãe, ambos alcoólatras. Fininho, então, foi morador de rua. Ele poderia virar estatística, como tantos. Mas quis o destino que Fininho ganhasse a condição de surfista profissional. Um dos 160 inscritos na terceira etapa do Oi SuperSurf, a principal competição do calendário nacional, cujo início ocorreu na última quarta nas ondas da Praia da Joaquina, em Santa Catarina.

Fininho levou um dos irmãos, Joanderson, de sete anos. Morar na rua foi a trágica, porém única decisão encontrada. Ele seria acolhido por Valdir, dono do "Bar do Surfista". Era coisa do destino. Já tendo um teto sob a cabeça após pedir comida e trocados na rua por quase dois anos, foi apresentado ao surfe, usou pranchas quebradas e emprestadas até ganhar uma apenas para si e ganhou gosto pelo esporte. O ano de 2015 é o seu primeiro como profissional, após já ter sido campeão paraibano, nordestino e participado de Mundial Júnior. Ele venceu as duas baterias que disputou até o momomento, fechando a quarta com duas das nove melhores ondas da "Velha Joaca".

– Quando meus irmãos e eu estávamos dormindo, meu pai chegava de madrugada, bêbado, e já batia na gente, quebrava tudo em casa. Batia na minha mãe também. Isso era diariamente. Eu estava triste já com essa violência toda, não aguentava mais morar com meus pais, então eu decidir sair fora, decidi morar na rua mesmo. Estava sem opção. A solução era sair de casa mesmo. A gente não queria sofrer, não queria apanhar – destacou Fininho, ao LANCE!.

O auxílio de Valdir, decisivo para que Fininho estudasse, seria seguido pelo do casal de biólogos Rita e Douglas Mascarenhas. Com 16 anos, ele ganhou nova casa e teve até a primeira festa de aniversário da vida.

– O destino me levou para o canto certo. Não esperava isso tudo, não imaginava. Durante o tempo que eu morei na rua, vários amigos meus me oferecer drogas, mas eu sempre deixava de lado. Nunca usei drogas, nunca tive vontade e curiosidade de usar também. Nunca usei e estou aqui – destacou o surfista, que espera sanar a saudade da família, ainda composta por outro irmão e uma irmã, e conseguir um patrocínio, o que não tem:

– Me tornei profissional em 2015. Aí o negócio já fica mais apertado. É muita despesa, muito campeonato que acontece, tem inscrição, hospedagem, transporte. Isso é muito caro mesmo. Para quem está sem patrocínio fica ainda mais difícil. Comecei esse ano sem patrocínio e continuo sem patrocínio. Tenho apoios que são muito importantes nesse momento. É uma carreira muito difícil. Mas gosto desse desafio, dessa vibe de competir, viajar. Nunca vou desistir, apesar de todas as dificuldades. Nunca vou desistir. Tenho a esperança de que vou chegar no lugar mais alto do pódio sempre vou e conseguir um patrocínio.

Esse é Fininho. Um exemplo de superação. Um vencedor na vida e no esporte.

BATE-BOLA
FININHO
Ex-morador de rua e, hoje, surfista profissional

1-Como que o Valdir surgiu na sua vida, quando você morava na rua e passava fome?

Fico um pouco emocionado de lembrar disso, de voltar um pouco no tempo. Estava na porta de uma padaria, pedindo dinheiro. Meu irmão e eu. Valdir chegou de carro, eu pedi um trocado e ele falou que iria comprar uma sacola de pão para mim. Eu fiquei muito feliz também, pois estava cheio de fome e ele disse que iria comprar esses pães. Ele comprou os pães e na mesma hora me convidou para conhecer o bar dele, o Bar do Surfista. No dia seguinte, cheguei bem cedo no bar e vi vários amigos que tentavam surfar e estavam frequentando o bar também. E, pô, acho que ali era o meu lugar. Valdir é o cara que sempre foi muito bom comigo, com as crianças. Ele sempre dava comida para as crianças que ficavam na rua. Sempre que chegava uma criança no bar dele, ele dava um prato de comida.

2-Depois do Valdir, você ainda seria agraciado com a Rita e o Douglas, responsáveis pela ONG Guajiru, que cuida da preservação de tartarugas marinhas na orla de João Pessoa. Como que você ganhou uma nova família?

Teve um momento da minha vida, quando estava com 16 anos, que o Valdir achou que eu deveria tomar um rumo na minha vida, devia procurar outro lugar para morar. Eu não tinha para onde ir e achei que voltaria para a rua novamente, não tinha nenhuma estrutura para ir. Tinha um casal de biólogos, Rita e Douglas, que frequentava o bar também. Eu tinha uma intimidade boa com eles. Eles tinham um filho também, o Caio, e um dia eu cheguei no filho deles e pedi para morar com eles. O Caio pensou e falou que iria conversar com os pais dele. Eles fizeram uma reunião em família e, no outro dia, tive a notícia que iria morar com eles. Eles têm uma boa condição também e sabia que, com eles, eu crescer muito mais ainda como cidadão e com 16 eu fui morar com eles. Foi assim que tive mais uma família na minha vida, que me ajudou, meu deu amor, que me deu carinho. Eles me deram uma casa, um quarto só para mim. Tive uma festa de aniversário também, coisa que nunca tive. Eles puderam me dar isso. Tudo que precisava eles me ajudavam, me dando apoio e conforto. Foi mais uma família que tive na minha vida.

3 - Depois do Valdir e do casal de biólogos, você, agora, tem o Benjamin Athayde como pessoa fundamental na sua vida. Como foi deixar a Paraíba e tentar a sorte no Rio de Janeiro?

Estava morando com a Rita e o Douglas. E eles acharam que eu deveria me mudar da Paraíba, que não têm muitas ondas boas, não têm muitas oportunidades de patrocínio. E eu estava sem competição na Paraíba também. Aí veio o Benjamin, que é técnico de surfe. E ele tem um projeto, o Viva Surfe. Já tem dois anos que estou morando lá. Graças a Deus está dando tudo certo.

4 - Fábio Gouveia, um dos personagens mais importantes do surfe brasileiro, é seu conterrâneo e inspiração. Já conseguiu contato com ele?

Não tive muito contato com ele, mas pela mídia eu sei que ele surfa muito, tem um estilo muito bonito. A gente não se conhece muito, mas pela mídia que ele tem, é um cara fácil de se inspirar, de ter ele como modelo. Eu me inspiro muito nele. É meu ídolo.

* O repórter viaja a convite da organização da terceira etapa do Oi SuperSurf.

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