O futebol brasileiro trouxe um momento emblemático após a sanção do Marco Legal do Clube-Empresa no país. No último sábado (18), o pentacampeão Ronaldo desembolsou R$ 400 milhões e se tornou acionista majoritário do Cruzeiro. A decisão do empresário de 45 anos é vista por especialistas como um rumo relevante para a modernização do futebol brasileiro.
- É muito significativo. Mostra que quem conhece futebol, investe em futebol. E muitos outros jogadores que têm o desejo de continuar trabalhando com o esporte podem seguir esse exemplo do Ronaldo e de outros como David Beckham, Demba Ba, Piqué e Ibrahimovic. Outro fato importante é o envolvimento de um gigante financeiro como a XP. Isso reforça o enorme potencial do futebol brasileiro com investimento empresarial - afirmou ao LANCE! o advogado Pedro Trengrouse, coordenador acadêmico do curso de Gestão do Esporte da FGV/Fifa/Cies.
Especialista em direito desportivo, Eduardo Carlezzo valoriza a negociação do ex-jogador para adquirir ações da Raposa.
- Esta operação terá um peso muito importante pois colocará os clubes brasileiros no radar internacional, coisa que até o ano passado simplesmente não existia. Agora, pelo nome que o Ronaldo possui internacionalmente, isso automaticamente atrairá a atenção do investidor para o futebol brasileiro - declarou.
A nova regulamentação na migração de clubes para empresas aconteceu por meio de uma lei formulada pelo senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). O intuito é de atrair mais mais investidores e aprimorar a transparência na gestão.
- Com dinheiro "novo", dívidas podem ser renegociadas com deságio. A Lei já enquadrou o passivo cível e trabalhist num parcelamento pago com 20% das receitas da SAF daqui pra frente - detalhou Trengrouse, acrescentando:
- As dívidas fiscais também podem ser equacionadas via transação tributária e até mesmo no novo Refis que deve ser aprovado em breve no Congresso. Inclusive pagando com títulos, o que pode representar economia de 90% sobre o valor original - finalizou.
Eduardo Carlezzo conta que, no caso da equipe mineira, o aporte de R$ 400 milhões tende a contribuir para os clubes que aderirem à Sociedade Anônima do Futebol (SAF).
- Considerando que a dívida do Cruzeiro é de quase R$ 900 milhões e o clube vive uma situação financeira catastrófica, R$ 400 milhões de investimento não é pouca coisa. O clube terá condições de sair do atoleiro e passa a figurar imediatamente como um dos favoritos a subir para série A no ano que vem - afirmou.
O clube tem a possibilidade de, neste processo, abrir capital e atrair investimentos com segurança jurídica, enquanto clubes associativos lidam com mais desafios em planejamentos de médio e longo prazo diante de instabilidades causadas por eleições periódicas. Além disto, compromissos da gestão anterior muitas vezes são descumpridos sem nenhuma grande consequência e a fila de credores corre o risco de aumentar.
Sobre a possibilidade de o formato de clube-empresa automaticamente tirar a identidade de um clube, Trengrouse é taxativo.
- PSG, Valladolid perderam suas respectivas identidades? A mudança não acontece desta forma? - destacou.
De acordo com um estudo elaborado pela consultoria Ernst & Young, 96% das 202 equipes da primeira e segunda divisões da Alemanha, Espanha, França, Inglaterra e Itália são entidades privadas.
BRASIL AINDA DÁ SEUS PRIMEIROS PASSOS NO CLUBE-EMPRESA
Enquanto as principais ligas europeias têm este modelo consolidado, o futebol nacional vê o modelo associativo se sobressair ao dos clubes-empresas. Entre os 40 clubes das duas primeiras divisões, apenas o Cuiabá e o RB Bragantino têm modelo empresarial.
Adquirido pela família Dresch em 2009, o clube mato-grossense recebe investimentos da Drebor, fabricante de material utilizado por recapeadores de pneus cerca de 30 anos. Cristiano e seu irmão, Alessandro Dresch, são os responsáveis pela gestão das áreas administrativas e de futebol do Cuiabá. O investimento tem rendido bons resultados em campo.
Já o Botafogo-SP, que está na Série C, tem 60% de suas ações administradas pelo próprio clube e 40% pela Trex Holding, empresa de investimentos comandada por Adalberto Baptista.
De acordo com o CEO do Banco XP, outro clube pode ter novidades: o Botafogo, campeão da Série B em 2021, deve ter novidades em relação ao assunto.
Conterrâneo do Cruzeiro, o América-MG também tem interesse em "migrar" para o formato de clube-empresa. O Coelho pretende manter a associação, mas deixa de ser responsável pela parte do futebol, com controle passando para as mãos de uma empresa.