O Pan-Americano de Lima será um divisor de águas na história do vôlei feminino colombiano, após eliminar o Brasil na semifinal e ficar com uma inédita medalha de prata. E muito da evolução se deve ao trabalho do brasileiro Antonio Rizola.
Com pouco mais de dois anos e meio à frente da Colômbia, Rizola começa a colher os frutos do investimento e também o “garimpo” nas categorias de base. Algo que ele faz por décadas no Brasil.
Nesta entrevista, Rizola fala sobre a campanha colombiana no Pan, das dificuldades e da expectativa de conquistar uma vaga história nos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020.
Como foi o convite para treinar a seleção colombiana?
Imediatamente após minha dispensa da CBV (em 2016), o saudoso presidente Carlos Grisales me fez um convite oficial para assumir a seleção adulta da Colômbia (NOTA DA REDAÇÃO: Grisales morreu em julho do ano passado).
Como foi a conversa?
Durou mais ou menos três meses. Eu estava meio abalado com minha saída da CBV e precisava pensar. Quando falei pela última vez com ele, disse que conhecia muito bem as equipes colombianas pois por muitos anos joguei contra. Propus uma revolução e queria começar formando um grupo de base e seguir com ele. Eu faria um contrato após os Jogos Olímpicos de 2020. O objetivo maior seria classificar para a Olimpíada de 2024. Iniciei com um grupo com média de idade de 17 anos, em janeiro de 2017.
Faça uma análise de como era o vôlei colombiano quando você assumiu a seleção em termos de organização, profissionalização e talentos.
Estava sem uma seleção de base. A sub-18 não iria disputar nada no ano de 2017, e a sub-20 não tinha atletas com nível. Propus formar um grupo e tentar uma vaga para o Mundial via Copa Pan-Americana sub-18, em Cuba. Os dirigentes pensavam que seria loucura e eu disse que queria ver o grupo. Resumo: treinei 18 dias em janeiro, 15 dias em fevereiro, 15 dias em março e fomos. Além de conseguir a vaga, eliminamos a República Dominicana na semifinal por 3 a 2 e ganhamos de Cuba na final por 3 a 0. Foi a primeira medalha de ouro da Colômbia em voleibol feminino. Do atual grupo, a levantadora, as duas centrais e um ponta foram vice-campeãs nos Jogos Pan-Americanos agora. As grandes mudança foram um maior tempo de concentração para as seleções e a minha independência total para definir as atletas convocadas. Existia muita interferência regionalista nas convocações.
Como foi o início do trabalho? Houve resistência?
Houve muita resistência da parte dos que queriam manter os regionalismos, mas o presidente me deu carta branca e pouco a pouco as pessoas entenderam a importância de o país estar à frente das regiões.
Qual você acha que foi a sua maior contribuição para o vôlei colombiano nestes dois anos?
Estamos atuando com o entendimento do jogo, velocidade e com ótima relação saque, bloqueio e defesa. E o fato de hoje as atletas acreditarem que podem fazer. Mas o trabalho vem antes de tudo.
Em quais aspectos você acha que o esporte cresceu mais nesse período?
Tecnicamente as atletas melhoraram muito. Hoje entendem e trabalham a técnica sabendo que ela será útil nos jogos.
Como tem sido o trabalho na base?
Este ano tivemos dificuldades. O esporte aqui funciona com apoio dos órgãos estatais e houve um corte considerável nas verbas. Desta forna priorizamos a equipe adulta. Na base reduzimos as concentrações. Claro que não é bom, mas tem que se trabalhar com os recursos existentes e buscar investidores. O esporte olímpico na Colômbia não tem tradição de investimentos empresariais. Estamos buscando demonstrar a importância deste investimento.
Como você analisa a repescagem olímpica em janeiro? Quais as maiores adversárias?
Nossa briga será direta com Argentina, Peru e Venezuela. Creio que serão essas as equipes participantes. A Argentina, pela sua tradição, na minha opinião é a favorita. Mas hoje estamos mais próximos. Acho que o período do torneio não é apropriado, pois a grande maioria das atletas estará em seus clubes e a preparação será de 15 dias, no máximo, com Natal e Réveillon no meio.
Faça uma análise da atual seleção colombiana.
É um grupo que é limitado, mas está aprendendo a reconhecer seus limites e trabalhando para melhorar. Estamos jogando com velocidade, como exige o voleibol moderno, e com qualidade de defesa e bloqueio.
Como é a estrutura da confederação colombiana? E o vôlei masculino?
É uma estrutura pequena para o que queremos, mas todos trabalham com muito amor e dedicação. Quanto ao masculino só acompanho de fora.
Você está morando na Colômbia? Em que cidade? Como é sua rotina?
Optei não ter residência fixa. Quero rodar o país com as concentrações para que a seleção esteja mais próxima do seus técnicos e torcedores. Vamos até as regiões para promover e motivar técnicos e atletas. Giro por todas as regiões onde mais se faz voleibol. E estamos trabalhando para abrir novas frentes.
Como foi vencer o Brasil na semifinal? Mesmo contra um time B, qual foi a sensação?
Nós não vencemos o Brasil. Fizemos o nosso trabalho bem feito e o resultado foi a vitória. Para a realidade da Colômbia no voleibol, uma equipe do Brasil é sempre uma equipe do Brasil. Todas ali têm muito mais experiência do que nossas atletas. Tínhamos que ser mais “equipe”. Minha sensação foi de muita felicidade porque consegui demonstrar a elas que são capazes e são fortes. Se você tem uma oportunidade, faça uso dela naquele momento. Dever cumprido para este momento. A partir de agora a Colômbia será mais considerada por todos. Isto obriga você a trabalhar mais. Nos dois anos que estou aqui luto muito pela união dos técnicos. Todos os meus cursos e palestras são neste sentido. Os professores e técnicos formadores têm que ser valorizados e reconhecidos. Tudo isto é um processo que não começou comigo. Eu estou buscando fazer evoluir em todos os setores o voleibol da Colômbia. Disputamos campeonatos e ganhamos as duas primeiras medalhas de ouro para Colômbia: uma na categoria sub-18 na Copa Pan-Americana, com a primeira participação do país no Mundial sub-18, e o ouro nos Jogos Sul-Americanos. Fomos vice-campeões sul-americanos no adulto em 2017, ficamos em terceiro lugar nos Jogos Bolivarianos, temos um vice-campeonato nos Jogos Centro-Americanos em 2018 e agora o vice nos Jogos Pan-Americanos. Acredito que estamos no caminho para conseguir um ou vários patrocinadores para termos condições de maior intercâmbio internacional e fortalecer o voleibol interno.