América-MG adere à Inteligência Artificial para melhorar estrutura dentro e fora de campo
O Coelho é parceiro da Tero, uma plataforma que ajuda a selecionar profissionais de campo usando recrutamento virtual
O futebol tem evoluído em alguns aspectos no mundo quando o assunto é recrutar e selecionar profissionais para integrar quadros técnicos como atletas e treinadores. O América-MG aderiu a ideia de usar inteligência artificial para profissionalizar e incrementar seu departamento de futebol.
O Coelho tem como parceiroda Tero, uma plataforma digital que conecta jovens atletas a oportunidades de carreira que já conta com mais de 60 mil atletas e 1.500 treinadores inscritos.
Segundo relatório de 2020 divulgado pela FIFA, o número de transferências de jogadores (incluindo homens e mulheres) vinha crescendo desde 2016, mas devido a pandemia tivemos uma queda de 5,4% em 2020 em relação ao ano anterior. E, consequentemente, os valores transacionados também caíram, passando de US$7.35 bilhões em 2019 para US$5.63 bilhões no ano passado.
E, em tempos de pandemia, ter alternativas como a inteligência artificial pode ser uma forma de driblar dificuldades financeiras e ainda conseguir resultados na hora de selecionar profissionais com potencial alto de desempenho dentro e fora de campo.
Bruno Pessoa, CEO da Tero, conversou com a reportagem sobre esse novo nicho e como o futebol poderá se aproveitar da IA como ferramenta para novas possibilidades esportivas e de negócios.
1- Como funciona a ferramenta para fazer a "filtragem" de atletas e como são direcionados aos clubes? Cite o caso do América-MG.
Contextualizando um pouco sobre a ferramenta, primeiro o atleta cria seu perfil de forma gratuita e adiciona todas as informações para esse cadastro inicial, incluindo dados como altura, peso e experiências prévias em outros clubes. Após isso, esse perfil será avaliado por protocolos digitais e pelos treinadores inscritos, também gratuitamente, na plataforma.
O objetivo é que um atleta seja avaliado por diferentes treinadores para que seja possível comparar e complementar cada análise com dados tanto subjetivos quanto objetivos em relação à performance do atleta.. Para esses procedimentos iniciais, basta ter acesso a celular e/ou computador com internet e pronto, já é possível avaliar ou ser avaliado de qualquer lugar do mundo.
Para os jovens talentos, a ferramenta é uma oportunidade de conseguir alcançar o sonho de ser jogador de futebol. Já para os treinadores, é uma possibilidade de geração de renda por meio das avaliações e treinamentos. Enquanto os clubes parceiros, como o América-MG, terão acesso a uma base de dados com várias informações sobre os jogadores inscritos e avaliados para que possam escolher e validar os que mais combinam com a sua necessidade. A ideia é conseguir proporcionar os melhores ‘matches’ entre os clubes e os mais de 60 mil atletas que temos atualmente inscritos na Tero.
Acho importante ressaltar que nosso processo não pretende eliminar a avaliação presencial do clube. O grande problema é que o processo atual de avaliação de atletas é atualmente uma operação custosa e pouco escalável. Para realizar essa avaliação, os clubes recebem presencialmente milhares de atletas mensalmente que geralmente chegam através de indicações ou inscrições abertas, nos eventos conhecidos como peneiras.
E diferentemente do mercado corporativo, onde existem processos claros e descrição exata para cada vaga aberta, os clubes normalmente realizam suas avaliações de forma 100% subjetiva. Jamais veremos uma empresa avaliando aleatoriamente 3.000 candidatos para vagas, muito menos de forma presencial e sem a existência de indicadores para avaliar cada candidato. Isso acontece no futebol, o que nos faz crer que o processo de captação pode se tornar muito mais eficiente.
Exatamente por isso queremos oferecer um filtro inicial para que os clubes deixem de avaliar aleatoriamente milhares para recrutar um e que, através da avaliação digital de milhões, seja possível avaliar presencialmente apenas atletas já filtrados, reduzindo custos de avaliações presenciais, aumentando a abrangência geográfica da avaliação e o mais importante, aumentando o número de atletas de qualidade recrutados.
2- Mecanismos como a IA no esporte são uma tendência ou algo que veio para ficar de vez?
Não tenho dúvidas de que a tecnologia veio para ficar no mundo do futebol, assim como vem ganhando cada vez mais força em outros mercados. Mesmo com algumas controvérsias por parte dos torcedores e imprensa, o VAR, por exemplo, já é uma tecnologia que vem se tornando mais ‘natural’ com o passar dos jogos mundo afora e que apresenta dados que comprovam sua eficácia.
E com isso, a tecnologia vem mudando a forma como o futebol é jogado e assistido. Pensando ainda no arbitro de vídeo, já pensou termos uma inteligência artificial que alerta a equipe de arbitragem em casos que podem haver erros humanos? Isso pode ser determinante em lances decisivos e diretamente ligados aos resultados das partidas.
Segundo a FIFA, mais de 28 milhões de pessoas praticam Futebol na América do Sul. Sendo seguro estimar que aproximadamente a metade está no Brasil, são quase 15 milhões de praticantes só aqui. Sem o uso da tecnologia é praticamente inviável conseguir dar vazão e analisar todos esses possíveis talentos.
Mais um motivo para o uso de inteligência artificial impulsionar ainda mais o cenário do futebol e profissionalizar as análises de dados e performances de atletas da base, como já acontece em alguns clubes com o elenco profissional.
Com a IA é possível ter dados mais relevantes sobre desempenho, treinos, habilidades, deficiências, histórico de lesões, evolução na carreira, valor de mercado e muito mais. Dessa forma, tem-se um perfil completo de cada atleta para conseguir gerar um match mais assertivo com cada clube, garantindo que a relação atleta-clube seja a mais benéfica possível para ambos os lados.
Imagine o seguinte cenário: realizamos uma avaliação simples por vídeo onde atletas possam driblar 10 cones, conduzindo a bola o mais rápido que conseguirem sem derrubar nenhum dos obstáculos. Com isso, centenas de milhares de atletas realizam o teste padronizado e conseguimos ver aqueles que realizam em menor tempo, dão menos toques na bola, entre outros indicadores.
Se o mesmo teste for realizado pelos maiores craques do futebol mundial, seremos capazes, através de um algoritmo de IA, de observar semelhanças entre os jovens aspirantes e os atletas do mais alto nível. O algoritmo conseguirá detectar padrões de movimentos imperceptíveis ao olho humano, o que será uma grande revolução na detecção de talentos.
3- Os atletas e treinadores conseguem acessar a plataforma da Tero de que forma?
Tanto atletas como treinadores podem fazer seu cadastro gratuitamente na nossa plataforma. Depois disso, o acesso pode ser feito pelo celular ou pelo computador, basta ter acesso a internet.
Os treinadores, ao avaliarem atletas, ganham pontos que podem ser trocados por cursos e/ou palestras, por exemplo. Pós-isolamento que vivemos, nosso objetivo é ajudar esse treinador a gerar renda extra realizando avaliações e treinamentos presenciais.
4- Como está sendo o processo dessa parceria com o América-MG e há um prazo determinado para averiguação de resultados de desempenho em campo?
O nosso processo de entrada foi extremamente profissional no clube. É um clube diferenciado em todos os quesitos. O excelente trabalho fora de campo acaba aparecendo dentro de campo com o clube agora na primeira divisão do campeonato brasileiro.
Nós recebemos feedbacks constantes e estamos construindo soluções para atender todo o departamento de base no quesito captação nas categorias de base.
Infelizmente por conta da pandemia ainda não conseguimos propor e realizar todas as ações que tínhamos planejado, mas em breve esperamos levar os atletas que mais se destacam (e que encaixam com o perfil do América) dentro da plataforma para realizarem avaliações presenciais dentro das instalações do clube.
5- Além de peneiras e pré-seleções, a plataforma monitora performance quando os atletas seguem para os clubes?
Nesse momento, o objetivo tem sido exclusivamente em detectar atletas com potencial para ingressar nas categorias de base, mas certamente está em nossos planos futuros realizar um acompanhamento longitudinal dos atletas que lograrem destaque em nossos processos avaliativos.
6- O futebol brasileiro tende a usar mais a IA em processos de captação de atletas ou terá mais resistência, principalmente nos clubes considerados gigantes?
Durante o período pandêmico que vivemos, todos nós fomos obrigados a nos "digitalizar". Pessoas que não realizavam reuniões via Zoom, Hangouts acabaram aderindo; pessoas, que não eram acostumadas a pedir comida via delivery também mudaram seus hábitos. Por uma questão de necessidade, o mesmo ocorreu dentro dos clubes, em especial falando do departamento de captação, que tradicionalmente dependia majoritariamente de observações in loco. Além disso, a necessidade de mudança foi ainda mais urgente nas categorias de base, uma vez que muitos clubes tiveram uma redução de pessoal significativa devido à baixa nas receitas.
Nos clubes grandes do futebol brasileiro o uso de scouts e análise de dados nos times profissionais e até mesmo das equipes de base já vem se tornando mais comum e se desenvolvendo com o passar dos anos e acredito que, conforme eles tenham a confirmação da eficiência, assertividade, ganho em desempenho e performance, isso naturalmente passe a ser usado também durante o processo de captação de atletas, que ainda é feito pela maioria dos clubes de maneira subjetiva através das tradicionais peneiras explicadas acima