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Paixão, presença brasileira e façanhas: conheça a história e o desenvolvimento do futebol de Marrocos

País que surpreende na Copa do Mundo já teve um brasileiro no comando da seleção e tem uma forte cultura nos gramados e nas arquibancadas

Torcida Marrocos
imagem cameraMarrocos é um país com forte cultura de futebol (NELSON ALMEIDA/AFP)
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Lance!
Doha (QAT)
Dia 11/12/2022
18:31
Atualizado em 12/12/2022
12:13

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A seleção marroquina é a grande surpresa deste Mundial. Uma nação independente de apenas 66 anos é a primeira do continente africano a chegar em uma semifinal de Copa do Mundo. Ainda que curta, a história do futebol marroquino é muito peculiar dentro e fora de campo, desde a construção do cenário local até a cena de arquibancada. Veja a seguir como o país do norte africano conseguiu se desenvolver dentro e fora dos gramados, contando, até mesmo, com participação brasileira. 


O FUTEBOL NA COLÔNIA

O Marrocos era um protetorado francês antes do ano de 1956, quando obteve a independência. Antes mesmo deste período, o país já tinha clubes, porém todos eles eram muito ligados à colonização europeia dentro do país. Em grande parte, os maiores e principais clubes do país começaram a se fundir nas décadas de 1920 e 1930. Porém, o primeiro clube surgiu em 1904: o extinto Olympique de Casablanca.

Aproximando-se da metade do século, começaram a surgir grandes agremiações, com influências europeias muito fortes, como é o caso do Athletic de Tétouan, clube do litoral norte marroquino, fundado por espanhóis e com inspiração no Atlético de Madrid.


OS MAIORES DO PAÍS E DA MAIOR CIDADE

A partir da década de 1930, começaram a se fundar, Wydad, em 1937 e o Raja Casablanca, em 1949. Aliás, o Raja seria um clube importante, pois seria um dos primeiros a ter uma forte ligação com o nacionalismo marroquino, a ponto de apenas aceitar jogadores nascidos no país, o que ajudou na popularização do time.

Além de serem clubes da mesma cidade, Raja e Wydad tiveram um aspecto que aumentou a rivalidade na metade dos anos 1950. Fundador, presidente e treinador do Wydad Casablanca, Pere Jego, deixou o clube após ter tido atritos nos bastidores e foi treinar o arquirrival, onde deixaria uma grande marca apesar de não ter conquistado títulos.

Antes mesmo de fundar o clube vermelho da cidade, ele tinha ido para a América do Sul, para adquirir conhecimentos sobre futebol e os levou para o Marrocos. Tanto que suas equipes ficaram marcadas por adotar um estilo de futebol voltado a dar espetáculo.

Raja e Wydad são ambos tricampeões da África e os maiores vencedores do campeonato local. Além disso, o clube verde de Casablanca já chegou a uma final de Mundial de Clubes em casa.

+ Marrocos na semi! Saiba as melhores campanhas de seleções africanas na história da Copa do Mundo

SURGEM OS LEÕES DO ATLAS

A seleção nacional de Marrocos foi fundada em 1928 e fez seu primeiro jogo contra a equipe B da França em um amistoso, ainda quando era protetorado do país europeu. O time era formado por jogadores que atuavam na Liga Marroquina de Futebol e era fortemente ativo para amistosos contra seleções do norte africano como Argélia e Tunísia. As federações dos países realizavam torneios entre si, inclusive.

A seleção marroquina se filiou à Fifa em 1960, dois anos depois da independência do país. A Real Federação Marroquina de Futebol já tinha sido estabelecida e fundada no ano de 1955. Em 1957, a equipe nacional disputou sua primeira competição, que foi nos jogos Pan-Árabes, no Líbano, e empatou na sua primeira partida oficial, contra o Iraque por 3 a 3. Naquele torneio, os marroquinos foram às semifinais e venceram pela primeira vez na história contra a Líbia, goleando por 5 a 1.

Em 1970, os Leões do Atlas conseguiram se classificar para a sua primeira Copa do Mundo e ficaram em um grupo com a Alemanha Ocidental, o Peru e a Bulgária. Na estreia, surpreenderam quando saíram na frente contra os alemães, mas depois sofreram a virada. Nas rodadas seguintes, perderam por 3 a 0 para o Peru e empataram com a Bulgária na despedida.

O primeiro título da história do país foi o mesmo torneio dos Jogos Pan Árabes, em casa, no qual também aplicou sua maior goleada: 13 a sobre a Arábia Saudita. Naquele mesmo ano, eles conseguiram vencer pela primeira vez uma seleção europeia: 2 a 1 sobre a Alemanha Oriental.

Em 1976, a seleção marroquina conseguiu seu mais importante título e seu único troféu de grande expressão: a Copa Africana de Nações. Os marroquinos empataram no jogo final contra Guiné, mas o resultado era o necessário para ganhar o quadrangular em pontos corridos.

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A PRIMEIRA GERAÇÃO DE OURO LIDERADA POR UM BRASILEIRO

José Faria - Marrocos
José Faria liderou a seleção marroquina em 1986 (Divulgação)

A primeira geração considerada ‘de ouro” pelos marroquinos começaria em 1986, na segunda participação do país em uma Copa do Mundo, os Leões de Atlas contavam com uma geração que tinha alguns dos melhores jogadores do futebol africano em atividade e era comandada por um brasileiro: José ‘Mehdi’ Faria.

Naquele Mundial no México, a seleção marroquina ficou num grupo com Portugal, Inglaterra e Polônia. Os Maghrebi começaram empatando contra Inglaterra e Polônia, mas conseguiram um feito histórico ao vencer por 3 a 1 e eliminar Portugal e se classificando para as oitavas de final pela primeira vez. Aquela foi a melhor campanha de Marrocos até 2022 em uma Copa do Mundo. A equipe liderada pelo treinador José Faria só parou contra a Alemanha Ocidental.

Faria jogou por toda sua carreira no futebol carioca, tendo defendido o Bonsucesso, Fluminense e Bangu. Sua carreira de técnico começou no fim da década de 1960, quando ele trabalhou na base do Tricolor das Laranjeiras, porém ele fez todo o resto de sua trajetória à beira dos gramados no mundo árabe: primeiro ele foi para o Qatar e treinou a seleção sub-20 do país e posteriormente, o Al Sadd.

Em 1983, ele começou sua aventura no Marrocos, quando passou a treinar o FAR Rabat e a seleção nacional ao mesmo tempo. Pelos Leões do Atlas, ele conseguiu levar a seleção ao mata-mata de uma Copa do Mundo. Ele ficou no cargo até 1988 e só voltou a treinar um clube em 1995, quando iniciou seu último ciclo no Olympique Khouribga. O brasileiro se naturalizou marroquino e se converteu ao islamismo. Faria faleceu em 2013 aos 80 anos e é tido como uma lenda no futebol do país.

Depois de 1986, a seleção marroquina se classificou apenas para as Copas de 1994 e 1998, porém depois da terceira participação, os marroquinos acabaram tendo que esperar duas décadas para voltar aos mundiais em 2018, ano desde o qual dura grande parte da segunda geração dourada que conseguiu se classificar para as semifinais neste ano.

A REVOLUÇÃO NAS ARQUIBANCADAS

Mohamed V (Raja Casablanca e Wydad Casablanca)
Mosaico 3D da torcida do Raja Casablanca (Foto: Divulgação)

Talvez a marca maior do cenário futebolístico marroquino, que o dá uma certa projeção dentro do mundo do futebol, seja a cena de arquibancada existente no país. Volta e meia aparecem vídeos na internet das festas e demonstrações de fervor que as torcidas marroquinas mostram nos estádios. 

A cena ultra começou a aparecer no Marrocos no meio dos anos 2000, quando começaram a ser fundadas as primeiras torcidas organizadas modernas no país, que teriam uma característica peculiar, juntando o estilo europeu, como o dos ultras italianos e do leste do velho continente, com o ritmo, a vibração e a loucura das barras bravas latino-americanas, desenvolvendo uma identidade única e incrível.

Além do mais, junto aos mosaicos criativos e espetáculos pirotécnicos, as torcidas marroquinas (de clubes como Raja, Wydad, Kenitra, Moghreb Tetouan, Ittihad Tanger etc.) são criativas nos cantos, incluindo frases em diversos idiomas diferentes além do árabe em suas músicas como italiano, espanhol e francês. Os cânticos em parte, também possuem um alto teor político, com letras que envolvem fortes críticas sociais e à má relação do governo com as organizadas, que dão muita voz aos mais pobres em suas demonstrações. Há até mesmo cantos em apoio à independência da Palestina. De certa forma, as arquibancadas são um grande meio de expressão por parte da juventude do país.

A cena ultra deu um salto internacional durante o Mundial de Clubes de 2013, quando a torcida do Raja Casablanca conseguiu demonstrar como eram as arquibancadas do país em um cenário maior. Com o apoio fervoroso dos torcedores em Agadir e Marrakech, o clube mais popular do país surpreendeu, ao eliminar o Monterrey e o Atlético-MG de Ronaldinho nas semifinais e passou para a final. Certamente, é possível dizer que o fator ambiente por parte dos ultras e demais torcedores foi determinante.

O que se pode concluir é que apesar de tarde, Marrocos ao longo de sua breve história desenvolveu histórias dentro e fora dos gramados, não só feitos, mas uma cultura com muita paixão presente e é isso que vemos nas arquibancadas do Qatar, tomadas por seus torcedores em cada jogo dos Leões de Atlas. A seleção pode ainda não ser uma potência, mas é impossível dizer que no país que espanta o mundo na Copa, não há vivência e obsessão pelo maior esporte do planeta.

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