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Especial Dia da Mulher: elas explicam por que criaram coletivos femininos só para irem aos estádios

Contra assédio e pelo amor ao futebol, torcedoras se juntavam para acompanharem jogos no Rio antes da pandemia

Torcedoras Dias da Mulher
imagem cameraTorcedores de diversos clubes têm algo em comum: amor por futebol e luta contra preconceito (Divulgação)
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Lance!
Rio de Janeiro (RJ)
Dia 08/03/2021
14:27
Atualizado em 09/03/2021
14:05

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A paixão pelo futebol já faz parte da natureza dos brasileiros. Embora seja também das brasileiras, muitas mulheres ainda têm seus direitos violados dentro dos estádios pelo país. Elas denunciam o desrespeito que é ouvir piadas de cunho sexista no universo do futebol e reclamam de lidarem com casos de assédio nas arquibancadas. Cansadas, algumas torcedoras cariocas decidiram se unir.

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Em entrevista realizada em 2020, em um mundo ainda sem riscos de contaminação do coronavírus, quatro grupos de mulheres que se juntaram por amor ao futebol conversaram com o LANCE! Contra o assédio vivido nos estádios e por amor ao esporte, elas revelaram o motivo de terem que irem juntas aos jogos e contaram o que sofrem em um ambiente pouco aberto para elas.

BOTAFOGO: POR ISSO É QUE TU ÉS RESPEITO

Após uma torcedora passar por um assédio dentro e fora do estádio, algumas botafoguenses criaram um movimento, conhecido como "Empodera BFR", que pudesse apoiar a presença das mulheres e combater a falta de respeito não apenas no Estádio Nilton Santos.

- A sociedade hoje está sendo forçada a ressignificar a presença da mulher em diversas situações e o meio esportivo é uma delas. É muito comum que nossa opinião sobre este assunto seja completamente ignorada. Como se não tivesse credibilidade - comentou Samanta Lima, de 27 anos, membro do grupo feminino.

Entre torcedoras de 18 e 28 anos, o coletivo se junta nas partidas e busca evitar os assédios. Ao LANCE!, elas contaram da alegria ao acompanhar as partidas do Botafogo com outras mulheres e disseram receber o apoio dos familiares para estarem nas arquibancadas, algo inimaginável há 30 anos.

Embora elas sintam-se mais "seguras", puxões pelo cabelo, olhares "diferentes" e abusos ainda são frequentes. Samanta Alves, membro do grupo e ex-apresentadora da "Botafogo TV", revelou ter sofrido por apenas seguir o Glorioso.

- Na jogo contra o Bahia, em 2018, pela Sul-Americana, um cara mais velho que eu ficou passando a mão na minha perna. Percebi que ele tinha aliança no dedo e, mesmo eu balançando a perna e mostrando insatisfação, continuou. Eu gelei! Só pedi pra trocar de lugar com meu amigo. Ele ainda teve a coragem de vir e me falar: “Tá fugindo de mim?” - relatou a jovem, que na época tinha 17 anos e ele cerca de 28.

Torcida Feminina - Flamengo
"Nação Empoderada" presente no Maracanã (Foto: Arquivo pessoal/ "Nação empoderada")

FLAMENGO: O MEU MAIOR PRAZER É RESPEITAR
Criado em maio de 2018, Monalisa Oliveira Matos se viu sozinha e sem companhia para ir aos jogos do Flamengo. Depois de conhecer duas torcedores na mesma situação, elas criaram um grupo e foram adicionando algumas amigas. A "Nação Empoderada" é um movimento feminista composto por mais de 124 torcedoras.

Juntas, elas buscam igualdade na arquibancada e apoio aos times dos esportes femininos do clube. Dentro de divisões regionais pela cidade do Rio, elas sempre se encontram para irem juntas aos jogos.

- Muitas de nós antes de criamos o grupo, nunca tinha ido a um jogo no Maracanã ou em qualquer outro lugar. Iniciamos levando algumas na Gávea para jogos do futebol feminino e assim foram se sentindo abraçadas e unidas - disse ela, que é uma das fundadoras do movimento.

Entre 16 e 26 anos, as torcedoras do movimento cantam, pulam e vibram no mesmo tom e alegria dos torcedores: algo tão simples e que muitas vezes é retirado delas. O derrubar o machismo, que é principal fator por afastar elas dos estádios, também junta estas torcedoras no Maracanã.

- Para a sociedade é algo normal e aceitável homens estarem sem camisa em qualquer lugar. Nós em dias de jogos calorosos, muitas das vezes tiramos nossos mantos e ficamos apenas de top. Os olhares dizem tudo o que eles gostariam de falar da boca pra fora, mas as vezes escutamos coisas bem machistas por conta desse ato! - contou Monalisa, de 21 anos.

Torcedoras do Botafogo
Torcedoras do Botafogo fizeram campanha contra feminício em 2020 (Reprodução Twitter)

FLUMINENSE: AS TRÊS CORES QUE TRADUZEM RESPEITO
A torcida organizada "Fiel Tricolor", do Fluminense, foi criada em 1975 por uma mulher. Nas arquibancadas, segundo Patrícia dos Santos Silva Braz, que é professora, aos 46 anos, com um grande número de torcedoras, elas decidiram criam um grupo de mulheres com o objetivo acompanhar o clube. Dentro da torcida, um movimento feminino, chamado "Pavilhão Feminino da Fiel Tricolor", junta tricolores de diferentes idades para buscarem mais respeito nas cadeiras do Maracanã.

- Apesar do machismo que infelizmente ainda existe nos estádios, procuramos manter nossa postura de torcedoras e representamos com muito amor onde quer que esteja. Só quem já assistiu de pertinho a uma partida do time do coração sabe a importância que isso - disse ele, e reforçou:

- Estar com outras mulheres na arquibancada é um incentivo, dá a sensação de que não estamos sozinhas e que lugar de mulher é ali e onde ela quiser! - afirmou a torcedora, que ainda contou ter companheiras de todas as idades: das mais novas até uma tricolor de 92 anos.

Torcedoras vascaínas contra o assédio
Grupo feminino reunidas para assistir ao Vasco (Foto: Arquivo Pessoal)

VASCO: NO FUTEBOL ÉS UM TRAÇO DE UNIÃO ESPORTE-RESPEITO
O Vascaínas Contra o Assédio é um movimento independente do clube e tem todo tipo de torcedora: membros organizadas ou não. O grupo faz reuniões mensais e confraternizações e vê crescimento na frequência feminina nos jogos do Vasco. Mas não a ponto de mudar a cultura machista da arquibancada.

- Éramos um grupo de amigas e a ideia surgiu em conversa informal, quando estávamos indignadas com casos de assédios nas arquibancadas. Junto das meninas, é uma sensação de segurança maior. É bom saber que não estamos sozinhas - disse Alana Oliveira, estudante de ciências de sociais e membro do grupo.

O coletivo, composto por 148 mulheres, com média etária de 20 e 30 anos, começou em julho de 2018. É um movimento feminista que se junta para chamar a atenção para situações que acontecem não só na arquibancada, mas também com profissionais do meio do futebol (jornalistas, jogadoras, etc). E todas as ações são pagas com vendas de camisas ou vaquinhas.

FUTEBOL E AS MULHERES
​Para a historiadora Leda Costa, professora da UERJ e pesquisadora do futebol, não existem dados concretos que verifiquem o crescimento no número de mulheres nos estádios. Contudo, o surgimento do futebol está ligado diretamente com o envolvimento da mulher.

- Até o anos de 1920, a presença de mulheres era grande, se tomarmos pelo número de vezes em que apareciam nas reportagens da época sobre algumas partidas de futebol. Com a popularização do futebol e a modificação do perfil de público, os estádios foram considerados por muitas pessoas como locais incompatíveis às mulheres - explicou ela, que ainda lembrou:

​- O surgimento de grupamentos de torcedoras com intenção de reforçar a representatividade das mulheres assim como a reivindicação pelo direito de torcer sem ser assediada ou reivindicar a legitimidade de torcer e não ser alvo de questionamentos do tipo "mulher não entende de futebol" enfim, são temas importantes que movem alguns movimentos recentes de torcedoras que podem ser encontrados em diversos cantos do país.

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