‘Temos um jogador do Flamengo’, afirma apostador durante conversa com atleta que confessou ter participado de manipulação
Membro da máfia de apostas diz 'contar' com um jogador do Rubro-Negro para fraude em partida do Estadual. Clube não tem nenhum denunciado ou citado na investigação
As investigações da Operação Penalidade Máxima encontraram uma conversa entre Luís Felipe de Castro, um dos apostadores sob suspeita, e Kevin Lomónaco, jogador que confessou sua participação no esquema de manipulação de resultados. Durante a combinação feita por troca de mensagens, Castro tenta convencer o lateral (que "vendera" um cartão amarelo em jogo do Brasileirão de 2022) a cometer um pênalti em partida no Campeonato Paulista. E, além de oferecer R$ 200 mil pelo acordo, menciona ter um acordo com um jogador do Flamengo para a partida válida pelo Carioca no fim de semana. A informação é do jornal "O Globo".
- Amanhã temos um jogador do Flamengo. Então você deve fazer também para que todos ganhem - e continuou ao falar com o argentino:
- Se fecha, hermano, te pagamos com certeza o valor da operação e também o que te devo - completou.
Até o momento, o Rubro-Negro não tem jogadores indiciados ou citados na investigação feita pelo MP-GO. No entanto, o nome do clube aparece neste trecho das conversas na investigação.
O diálogo aconteceu no início da manhã de 24 de janeiro. Às 18h30, os flamenguistas enfrentaram o Bangu, em Volta Redonda. A equipe reserva estava em campo, pois o grupo principal se preparava para o Mundial de Clubes, a ser realizado em fevereiro.
O confronto terminou empatado em 1 a 1. Luís Felipe não especificou com qual jogador havia acordo nem a combinação: se foi por cartão amarelo, pênalti, escanteio ou finalizações. Também não aparecem nas conversas às quais o Ministério Público teve acesso nenhuma aposta feita pela quadrilha com o nome de algum jogador do Flamengo, nesta ou em outras partidas.
No dia seguinte o Bragantino, de Lomónaco, enfrentou a Ferroviária pela terceira rodada do Paulistão. A ideia do apostador era aliciar o zagueiro do Massa Bruta e fazer uma aposta múltipla, "casando" com suposto jogador do Flamengo com o qual afirmava ter acertado. O grupo costumava fazer apostas em vários jogos ao longo do fim de semana em apostas casadas para multiplicar seus lucros.
+ Saiba quais jogadores foram denunciados, indiciados e citados na Operação “Penalidade Máxima”
Kevin Lomónaco é um dos jogadores que confessaram participaram no esquema, fez acordo com o MP e não foi denunciado. As investigações apontam que ele recebeu R$ 30 mil para receber um cartão amarelo no confronto entre RB Bragantino e América-MG, pelo Brasileirão de 2022, no dia 5 de novembro. O atleta, no entanto, cobrava da quadrilha o pagamento de uma segunda parcela, de R$ 40 mil, que foi prometida e não paga.
Em meio a este contexto, ele voltou a ser procurado por Luís Felipe, que pediu para que ele fizesse um pênalti em troca do pagamento da dívida e de novos valores. Além disso, afirmou ter um jogador do Rubro-Negro comprometido com o esquema. Lomónaco, no entanto, frustrou os planos do apostador.
Os demais trechos de conversas indicam que os Estaduais são uma fonte de manipulação de jogos para a quadrilha. Há um particular interesse rodadas iniciais do Estadual, especulando os tipos de mercado que os sites de aposta iriam abrir para cada campeonato.
Apontado pelas investigações como o líder do grupo, Bruno López mencionou em 14 de janeiro que teria jogadores acertados para o Campeonato Carioca:
- Carioca já tenho 4 atleta (sic) - disse.
Três dias depois, Bruno relatou para Thiago Chambó que tinha dois jogadores confirmados, sendo um do Bangu e outro do Volta Redonda. Chambó perguntou se eles eram titulares absolutos, e Lopez confirmou:
- Acho que vou desenrolar mais um. Do RJ. Esses caras são certos, né? - respondeu Thiago, e Bruno respondeu: "100%".
No fim do mês, depois do confronto entre Flamengo e Bangu, Bruno disse que pagou dois atletas de times de menor investimento do Estadual.
- Eu tenho dois pago (sic) já no Carioca, um Nova Iguaçu e um Boa Vista (sic)", explicou Bruno, que afirmou também ter enviado um adiantamento para os jogadores.
Em nota, o departamento jurídico do Flamengo afirmou que "o assunto está com o Ministério Público de Goiás. O Flamengo não teve conhecimento de qualquer citação, mas confia plenamente em seus atletas. O clube está acompanhando a questão e tem todo interesse em que haja uma rigorosa apuração pelos órgãos competentes. O clube recentemente promoveu uma palestra para os jogadores com o senador Carlos Portinho, que é uma autoridade no assunto. O Flamengo está sempre fazendo ações educativas e colaborando para que jamais ocorram no clube situações, como as noticiadas. Vale lembrar que é comum como instrumento de convencimento usar nome de terceiros."
Ainda no Brasileirão de 2022, o Botafogo também foi mencionado por um dos apostadores. Bruno Lopez afirmou ter um grupo com oito jogadores interessados em participar do esquema. Tanto o Alvinegro quanto o Flamengo não contam com denunciados ou citados na investigação. Do Fluminense, o meia Nathan foi citado nas conversas, como responsável por ter recebido em um valor para receber um cartão amarelo. Atual zagueiro tricolor, Vitor Mendes no ano passado estava no Juventude, e é citado com situação semelhante.
ENTENDA O CASO
A investigação sobre suspeita de manipulação de resultados teve início em novembro do ano passado. O mandatário do Vila Nova, Jorge Hugo Bravo, descobriu que jogadores do clube vinham sendo aliciados por um grupo de apostadores antes da partida contra o Sport pela Série B. O dirigente juntou provas da tentativa de manipulação e procurou os promotores que combatem o crime organizado no estado.
Oficial da Polícia Militar, Jorge Hugo Bravo descobriu que o atleta Marcos Vinícius Alves Barreira, apelidado de Romário, tinha sido aliciado. Como o jogador não foi escalado, tentou induzir algum companheiro de time a levar um cartão vermelho ou cometer um pênalti no seu lugar. O valor combinado, segundo depoimento de Romário, era de R$ 150 mil, com uma "entrada" de R$ 10 mil, conforme vídeo de seu depoimento divulgado no programa dominical "Fantástico", da Rede Globo. Entre os vídeos, há ameaças de um integrante do esquema ao zagueiro Eduardo Bauermann, do Santos.
A investigação apontou que houve manipulações em jogos das Séries A e B do Brasileirão de 2022 e em partidas de Estaduais. O grupo pagava para que jogadores fizessem determinadas ações, como receber cartões amarelo e vermelho ou cometer pênaltis. Em paralelo, os integrantes apostavam em sites do ramo que esses lances ocorreriam durante os jogos e conseguiam lucros.
Há estimativas de que o grupo “investiu” R$ 8430,00 e somou ganhos de R$ 730.616,00. O MP-GO continuará a apurar o caso e não descarta que ocorreram manipulações de resultados em outros jogos de futebol. A Operação Penalidade Máxima está em sua segunda fase.
Ao todo, o MP-GO denunciou 15 atletas de diversos clubes por participação no esquema. Quatro deles, incluindo Lomónaco, fizeram acordo. Outros 30 atletas foram citados na investigação, alguns foram afastados ou dispensados pelos seus clubes, mas não respondem juridicamente, nem no STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), que anunciou a suspensão preventivamente os atletas denunciados.