‘Em 50 anos, da dor à alegria’
LANCE! mostra como um legítimo português, que já viu sua seleção 'bater na trave' outras vezes, enxergou a conquista da Eurocopa da França
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"Em 1966, na Copa da Inglaterra, eu tinha 12 anos. Foi a primeira vez que chorei por causa de um jogo de futebol. Aquela derrota para a Inglaterra, na semifinal, moeu o coração daquele menino português. Eu me recordo da alegria com que meu pai e os amigos dele comemoravam cada vitória do time de Eusébio. Me lembro do desespero quando os norte-coreanos fizeram 3 a 0 nas quartas de final, lágrimas que de dor transformariam-se em alegria, quando o “pantera negra” marcou quatro gols e acabamos por vencer os asiáticos por cinco a três. Nada mais parecia impossível para nós. Até que um certo Charlton acabou com nossos sonhos.
Anos depois, já crescido, é que soube das agruras a que os ingleses – sempre eles – submeteram o nosso time. A longa viagem de trem antes do jogo com os donos da casa, que desgastou sobremaneira nossos jogadores, era apenas um capítulo das provações por que passamos. Ainda ficamos com o terceiro lugar na copa de nossa estreia. Vencemos os soviéticos, mas nada superou a frustração daquela derrota.
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Parecia que nunca mais teríamos outra chance. De lá para cá, me encantei foi com o futebol do Brasil. O tricampeonato de Pelé e Tostão em 70, a dolorosa perda do título em 82 e 86 com o futebol arte de Zico, Sócrates e Falcão. O Brasil, aliás, sempre foi o nosso segundo time. E nosso futebol sempre esteve intimamente ligado. Vale lembrar que era Otto Glória o técnico daquele esquadrão luso de 66. E que foi outro brasileiro, Luiz Felipe Scolari, há 12 anos, que nos devolveu a alegria de torcer pelos gajos de camisa vermelha.
Sim, depois daquele time de Figo e Deco, resgatamos a paixão pelo futebol. Voltamos a acreditar que poderíamos ser grandes, estar entre os melhores. E, apesar de nos ter feito chorar – o choro adulto muitas vezes não é feito de lágrimas, mas de uma dor intensa dentro da gente – ali vivemos um marco, e nunca mais nos contentaríamos com uma posição de simples coadjuvante. Com todos os defeitos que possa ter, foi um legado que Felipão nos deixou. Sabíamos que um dia estaríamos no topo.
Esse dia chegou. Sofrido, desacreditado, dentro da casa do adversário. Teve um sabor especial, confesso, impor aos franceses a mesma dor que sofremos quando a Grécia nos tirou o doce da boca na final daquela Euro em Lisboa. Estou convicto que não ganhamos, como os gregos, um título por acaso. Afinal, um país pequeno, com seus 11 milhões de habitantes – menos do que cidades brasileiras como São Paulo, tem demonstrado a capacidade de revelar craques fora de série, um Figo e um Cristiano Ronaldo, ambos melhores do mundo em sua época. É um trabalho sério, de base, que esperamos ver perdurado.
Me orgulho de ter vivido e assistido às três gerações maiores do futebol português. Do choro de 66 à explosão de alegria deste domingo, exatos 50 anos se passaram. Foi-se uma vida. Mas Deus há de me dar saúde para viver felicidades ainda maiores.
Queremos e podemos mais. Avante, Portugal!"
* Vasco Luiz Serra é português de Espinho, torcedor do Porto, apaixonado pelo futebol
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