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Luiz Gomes: ‘O jornalismo na corda bamba e a covardia vista na Itália’

'A liberdade de expressão e opinião é sagrada. Mas reconhecer um erro – ou, nem tanto, apenas a infelicidade de uma manchete - e pedir desculpas teria sido muito melhor'

Capa - Corriere dello Sport
Capa do jornal Corriere dello Sport da última quinta-feira (Imagem: Reprodução de internet)

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O jornalismo tem sido posto à prova não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. Impulsionados pela comunicação em tempo real e massificada das redes sociais, líderes políticos, presidentes do Sul e do Norte, agentes culturais ou do esporte, disparam suas baterias contra a mídia profissional a quem, incapazes que são de receber críticas, atribuem caráter de perseguição e sensacionalismo. Como se não fossem eles os maiores geradores de fake news.

Este cenário explosivo exige como nunca de jornalistas e veículos de comunicação cuidados redobrados, responsabilidade absoluta em tudo o que se publica e divulga, na apuração, na checagem dos fatos, no título de uma matéria. Deslizes, hoje, mais do que ameaçar a credibilidade, podem tornar-se munição pesada para alimentar o radicalismo e o ódio dos que, atacando a mídia, querem no fundo atingir a democracia.

O que aconteceu essa semana na Itália é um exemplo da corda bamba em que o jornalismo se equilibra. Ao apresentar o derby de sexta-feira entre Milan e Inter, estampando em sua manchete o duelo entre os negros Romelu Lukaku e Chris Smalling com o título "Black Friday", o Corriere dello Sport, um dos principais diários esportivos do país, recebeu uma saraivada de críticas, inclusive dos protagonistas da matéria e dos clubes. Milan e Inter, inclusive, reagiram duramente, suspendendo até janeiro a presença de repórteres do Corriere em suas dependências.

O tema do racismo no futebol - e a Itália é um dos países onde isso se manifesta de forma mais intensa - tem provocado reações fortes da sociedade europeia. Pelo menos da parcela da sociedade que ainda preza os princípios da civilização nestes tempos bicudos. Portanto, ainda que se possa dizer não ter havido qualquer tipo de insinuação de caráter racista e discriminatório na matéria do Corriere, brincar com temática tão sensível é no mínimo uma atitude sem noção, sem medir consequências.

A irreverência - assim como a paixão pela bola - é uma marca dos jornais e canais esportivos em qualquer lugar do planeta. E isso é saudável. As provocações entre este LANCE! e o diário Olé, em temas que envolvem a rivalidade Brasil x Argentina, gerou ao longo dos anos capas, ou portadas como se diz por lá, que entraram para história. Talvez tenham acontecido excessos de parte a parte, é possível. Mas sempre se buscou nas redações daqui e de Buenos Aires, não ultrapassar os limites da ética, o equilíbrio determinado pelo bom senso.

Os dez anos em que fui editor-chefe dos veículos do Grupo LANCE! foram de um aprendizado constante. Mas a maior das lições foi a de que, nessas páginas, assim como nos sites, nas mesas redondas da TV ou do rádio, o jornalista não fala com leitores ou espectadores, mas sim com torcedores acima de tudo. Uma gente apaixonada por seu clube, que cultua seus ídolos e demoniza os adversários. E é isso que torna mais tênue a linha de onde se pode chegar, por mais que o politicamente correto por vezes transforme em chato e pesado o que deveria ser divertido e leve.

Uma das virtudes do bom jornalismo é a capacidade de refletir e compreender os sentimentos do universo em que se insere. E de ter a humildade de saber reconhecer quando não consegue fazer isso. No caso da Itália, a falta dessa sensibilidade certamente foi o agravante da situação. Ao afirmar em uma nota da redação que sua manchete era inocente e que o veneno estava na cabeça de quem lê e não naquilo que foi escrito e publicado, o Corriere conseguiu expressar de uma só vez a covardia e a prepotência dos que se acham acima do bem e do mal, que se consideram a própria verdade.

A liberdade de expressão e opinião é sagrada. E isso nem precisa ser dito. Mas reconhecer um erro – ou, nem tanto, apenas a infelicidade de uma manchete - e pedir desculpas a Lukaku e Smalling, ao Milan e à Inter teria sido muito melhor. Um caminho mais digno e um serviço ao jornalismo.

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