Árbitro de vídeo engatinha na Europa com um misto de esperança e preocupação
Itália, Alemanha e Portugal começaram a adotar o uso da tecnologia nesta temporada, mas não existe ainda consenso em relação às chances de sucesso
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A decisão da CBF de adotar o árbitro de vídeo a partir da próxima rodada do Campeonato Brasileiro, motivada pelo gol de mão de Jô que deu a vitória ao Corinthians sobre o Vasco no domingo passado, dividiu opiniões. É quase que consenso que a tecnologia pode sim ser muito útil ao futebol, porém, as críticas, na maior parte, se prendem ao fato de a entidade adotar a nova regra com a competição, que vai para a sua 25ª rodada, em andamento.
O uso do VAR (Vídeo Assistant Referee) ou AV, como vem sendo chamado internacionalmente o árbitro de vídeo, deve respeitar um protocolo da Fifa. Há quatro tipos de lances em que ele pode ser usado: pênaltis, gols, cartões vermelhos e erros de identificação. Também é necessário seguir três passos: após ocorrer o lance polêmico, ele é revisado pelos árbitros que têm acesso aos replays. A informação, em seguida, é passada ao árbitro principal, que, então, toma a decisão definitiva.
- É um avanço para o futebol que o árbitro tenha mais tranquilidade e condições de tomar suas decisões de maneira mais sóbria. É responsabilidade de todos nós dirigentes trabalharmos neste sentido. É um avanço termos isso em países com ligas importantes como Portugal, Itália e Alemanha, por exemplo. Temos desafios, como reduzir o tempo de análise, mas acredito que os progressos não vão parar. Trata-se de valorizar o espetáculo - analisou o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes, entusiasta do AV, que começou a ser utilizado nesta temporada no Campeonato Português.
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Antes testado em eventos como o Mundial de Clubes da Fifa e a própria Copa das Confederações, e garantido na Copa do Mundo da Rússia, no próximo ano, o árbitro de vídeo já está em vigor em alguns países, como Estados Unidos e Austrália. Grandes ligas européias iniciaram nesta temporada sua utilização. Casos de Portugal, Alemanha e Itália. Já Inglaterra e Espanha planejam iniciar o processo a partir da temporada 2018/2019.
PORTUGAL VÊ OPINIÕES DIVIDIDAS
A utilização do árbitro de vídeo em Portugal divide a opinião de jornalistas locais. Bruno Prata, colunista do jornal "Record", entende a necessidade de evolução nesta tecnologia, mas vê o caminho como sem volta.
- O VAR (Vídeo Assistant Referee) está em fase de testes em Portugal e em vários outros países e tenho a ideia de que é na liga portuguesa que a experiência até está a correr melhor (ainda este fim de semana, um penálti sobre João Mário demorou cinco minutos a ser decidido na Itália). Claro que há ainda um longo caminho pela frente e muitos ajustes serão necessários, até no protocolo imposto pela FIFA. Mas é uma ferramenta importante e acabará por se impor definitivamente. Não o fazer seria um absurdo até do ponto de vista comercial. Os árbitros chegaram ao teto das suas possibilidades e o futebol tem de dar resposta a um mundo moderno em que as novas tecnologias salientam os erros, o que fez aumentar os níveis de intolerância. Por isso, não só defendo o VAR como entendo que o protocolo devia estabelecer que ele é uma entidade superior ao árbitro que está no relvado do estádio. Não faz sentido que um juiz nervoso e cansado, como aconteceu ao iraniano na Taça das Confederações, imponha a sua vontade (e o erro) a quem está tranquilo e com mais informação na sala climatizada - disse Prata, se referindo ao árbitro Alireza Faghani que se negou a rever um lance no duelo entre Chile e Portugal pelas semifinais. Ele ignorou um pênalti que existiu e beneficiaria os chilenos, que avançaram nas cobranças de penalidades.
Luís Mateus, colunista do site português "Mais Futebol", por sua vez, acredita que a tecnologia não vai resolver os problemas e considera o futebol diferente de outros esportes que trabalham melhor com a interrupção.
- Se nós normalmente precisamos de ver três quatro repetições, às vezes mais, para chegarmos à certeza e termos ainda atenção não só o que está à volta da bola, mas tudo o que compõe a jogada - e mesmo admitindo que os árbitros tenham olhos mais bem treinados - a decisão demorará sempre bem mais do que 11 segundos (tempo ideal considerado pela Fifa). Juntemos a isso câmera lenta, o puxar da imagem para trás, e temos um problema. Não admito, se me permitem, decisões que tenham menos do que essas três, quatro repetições, a partir de vários ângulos. Os que relativizam o tempo perdido apontam exemplos dos esportes norte-americanos como termo de comparação. Discordo profundamente. O basquete (NBA), o futebol americano (NFL) e o beisebol (MLB) vivem de paralisações na sua essência. Na NBA pedem-se descontos de tempo para parar o ritmo de jogo do adversário, planejar jogadas ofensivas, os últimos segundos demoram minutos se o jogo estiver equilibrado, há quatro períodos, logo três intervalos. Chegou a existir no passado recente uma estratégia de falta contra falta, sobre piores atiradores, para controlar ainda mais os últimos ataques. Na NFL, tudo é extremamente pausado, mesmo entre cada down. Ainda mais antes do primeiro. A própria MLB não se joga a um ritmo vertiginoso. As paradas fazem parte do espectáculo, e são também um espetáculo à parte. O futebol não é assim - analisou Mateus.
O jornalista Bruno Andrade, do jornal "O JOGO," declarou que falta maior preparação dos profissionais envolvidos para lidar com os novos recursos e afirmou que os árbitros de vídeos deveriam ser implantados no começo da temporada e não no meio do torneio.
- Em Portugal, coincidentemente, o árbitro de vídeo (vídeo-árbitro) foi implantado no decorrer de uma competição: justamente na final da Taça da Portugal, entre Benfica e Vitória de Guimarães, no último jogo da temporada passada. O novo recurso foi aceito e exaltado, mas ao mesmo tempo criticado por treinadores e dirigentes dos dois clubes, exatamente pelo fato de ter sido colocado em prática no meio de um torneio e sem testes prévios. No fim, correu tudo bem. O problema, na verdade, tem sido visto no início desta temporada. Diversos lances polêmicos "corrigidos" pelo árbitro de vídeo são contestados, até mesmo os mais óbvios, como, por exemplos, impedimentos. Ainda falta um melhor preparo dos profissionais escolhidos para lidar com o sistema e também leitura da novidade por parte dos envolvidos no jogo (jogadores, treinadores e, principalmente, dirigentes, que acham que até mesmo "faltas bobas" merecem uma análise minuciosa. Menos, por favor - completou Bruno.
ITÁLIA SOFRE COM O TEMPO
O Campeonato Italiano vê alguns problemas em relação ao tempo de tomada de decisões. Se no jogo entre Milan e Udinese, por exemplo, um gol dos milaneses foi anulado rapidamente mesmo com o recurso de vídeo, em alguns lances a demora irritou os torcedores. No choque entre Internazionale e Spal o trio de arbitragem demorou cinco minutos para confirmar a marcação de um pênalti a favor do time de Milão, que ganhou por 2 a 0.
Buscando o hepta, a Juventus viu um pênalti a favor do Cagliari, logo na primeira rodada, ser marcado com a ajuda do vídeo. A cobrança foi desperdiçada e a Velha Senhora ganhou por 3 a 0. Mesmo "vítima" da decisão do árbitro, o goleiro Buffon defendeu o uso da tecnologia.
- Há uma nova tecnologia, que temos que acolher sem medo. A introdução do assistente de vídeo ajudará muito para não exaltar os ânimos e garantir que qualquer tipo de decisão tomada pelo árbitro tenha uma reação pacífica de todos, até mesmo pelos torcedores - disse o goleiro da Juventus.
ALEMANHA TEM POLÊMICA, PROBLEMAS E AMEAÇA RECUAR
A Alemanha é o país que mais vem enfrentando dificuldades na utilização dos árbitros de vídeo. Problemas tecnológicos na transmissão dos lances estão levando os próprios árbitros a pedirem a retirada da tecnologia se nada for melhorado.
- Não podemos permitir que as coisas continuem dessa maneira. É inaceitável, sobretudo para os árbitros - reclamou Hellmut Krug, porta-voz dos árbitros da Federação Alemã de Futebol.
Se não bastasse isso, a revisão de um lance pelo VAR levou ao "Tapetão alemão" a decisão de um jogo. Na goleada de 5 a 0 do Borussia Dortmund sobre o Colonia o segundo gol do jogo valiado com ajuda da tecnologia. O árbitro anulou a jogada pois entendeu que Sokratis empurrou o goleiro do Colonia Timo Horn, que deixou a bola pelo alto escapar. Após a consulta, ficou evidente que não houve contato entre os jogadores.
O problema neste caso é que o vídeo mostra que o árbitro interrompeu o lance antes de a bola entrar, paralisando a jogada. Agora, o Colonia vai à Justiça pedir a anulação do jogo, uma vez que o gol não poderia ser validado com a jogada interrompida. Nada que abale Reinhard Grindel, presidente da Federação Alemã de Futebol.
- Tirando pequenos problemas, a tecnologia, quando bem utilizada, resolve os problemas do futebol - disse o dirigente.
ESTADOS UNIDOS TEM TV DO LADO DE FORA DO CAMPO
Nos Estados Unidos o modelo é um pouco diferente em termos de utilização de vídeo para validar lances. Isso porque o árbitro não fica esperando a decisão de uma mesa. Ele mesmo se dirige a uma televisão colocada do lado de fora do gramado, sem que nenhum jogador possa acompanhá-lo, e revê o lance.
Na Major League Soccer, recentemente, no duelo entre Portland e LA Galaxy, o árbitro recorreu à tecnologia para anular um gol marcado por Gyasi Zardes. O que chamou a atenção no lance foi o espírito esportivo dos atletas, que em nenhum momento pressionaram o árbitro. Sinal de que é possível evoluir.
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