Assaf, sobre Mário Sérgio: ‘Craque de bola, que por circunstâncias distintas, esteve pouco na Seleção’
Jornalista traça um perfil do ex-jogador, que morreu no voo do time da Chapecoense
Mário Sérgio Pontes de Paiva foi um craque de bola, que por circunstâncias distintas, notadamente o forte temperamento, não teve muita chance na Seleção. Carioca de 7 de setembro de 1950, viveu as primeiras experiências no futebol de salão e nas divisões de base do Fluminense, mas logo trocou as Laranjeiras pelo Flamengo. Na Gávea, mal chegou aos profissionais, em 1970, e já teve problemas com o treinador Dorival Knippel, homem durão, que não costumava tolerar o imponderável do futebol, daí ter jogado apenas cinco vezes no time profissional.
Assim, acabou encontrando a felicidade na Bahia, vestindo a camisa de outro rubro-negro, o Vitória, pelo qual foi campeão estadual em 1972, permanecendo na Boa Terra até 1975, quando voltou ao Fluminense para defender a fabulosa Máquina, que contava, entre outros, com Félix, Toninho, Edinho, Marco Antônio, Rivelino, Pintinho, Gil e Paulo César Caju. Mário entrava e saía do time. Não havia espaço para todos. Mas conquistou a Taça Guanabara e o Carioca, títulos de grande relevância, naquela época.
No início de 1976, deixou o Tricolor e ingressou no Botafogo, envolvido no troca-troca promovido pelo eterno presidente Francisco Horta, que cedeu Mário, Miranda e Manfrini, recebendo o ponta-esquerda Dirceu. O Alvinegro também reunia ótimos jogadores, como Wendell, Osmar, Mendonça, Rogério e Nílson Dias. Mário teve boa passagem por General Severiano, embora não tenha sido campeão.
Em 1978, permaneceu longo tempo parado, por conta de uma contusão. Em 1979, foi tentar a sorte no Rosário Central, da Argentina. Entretanto, logo regressou, seduzido pela possibilidade de jogar ao lado de Paulo Roberto Falcão, no Internacional. Em Porto Alegre, ganhou duas vezes o Gauchão e o tri brasileiro, esse invicto.
Sempre inquieto, foi para o São Paulo, e chegou enfim à Seleção, convocado por Telê Santana. Canhoto de rara habilidade, drible curto, típico do futsal, ganhou o curioso apelido de “Vesgo”, porque olhava para um lado e tocava a bola para o outro, confundindo os adversários.
O problema é que a essa altura já acumulava um punhado de histórias folclóricas, que garantiu, em entrevistas, eram quase todas mentirosas. É fato que após a partida contra o São José, que deu ao clube do Morumbi o Paulista de 1981, e incomodado com a pressão dos torcedores de São José dos Campos, na saída do estádio, sacou seu revólver calibre 38 e atirou para cima, levando o povo a correr assustado. Depois disso, passaram a chamá-lo de “Rei do Gatilho” e “Cisco Kid”.
É verdade também que não gostava de ser substituído, tendo reagido várias vezes em tais situações, alegando que os treinadores “não sabiam nada de futebol”. Certa vez, ao ser entrevistado pelo repórter Divino Fonseca, fez uma analogia dele, como jogador, e o turfe, esporte pelo qual era fanático. “A diferença é que o cavalo aceita o freio. E eu não”. Ainda por conta disso, garantiu em outra ocasião, que seu livro de cabeceira era a “Revista de Turfe do Jockey Club”.
Na Seleção, cumpriu apenas oito atuações, a primeira em amistoso contra um combinado da Irlanda, em Maceió. O Brasil venceu por 6 a 0. Na sua primeira passagem, fez a última partida em 21 de março de 1982, no Maracanã, diante de 150 mil pessoas. O time ganhou por 1 a 0, mas Mário foi substituído por Éder, e acabou ficando de fora da relação de 22 jogadores que disputou o Mundial da Espanha. “Um amigo disse que o então presidente da CBF, Giulite Coutinho, articulava a convocação de Dirceu. No fim, foram ele e o Éder. Eu sobrei. Mas não acredito que o Telê tenha participado. De qualquer forma, essa ausência é a minha maior mágoa”, garantiu.
Em 1982 e 1983, o craque defendeu a Ponte Preta. Ainda em 1983, recebeu do técnico Valdir Espinosa o convite irrecusável para integrar a equipe do Grêmio que conquistou o título mundial em Tóquio, abatendo o Hamburgo, da Alemanha, por 2 a 1. Em 1984, voltou ao Inter. No mesmo ano, e no seguinte, vestiu a camisa do Palmeiras, sem muito sucesso. No Parque Antártica, sofreu a acusação de jogar dopado, e acabou suspenso por 90 dias. Negou tudo. “Um dia conto essa história direitinho”. Não teve tempo para tal.
Curiosamente, ganhou nova chance na Seleção, chamado por Evaristo de Macedo. Mas a derrota de 1 a 0 para a Colômbia, amistoso em Bogotá, na tarde de 15 de maio de 1985, provocou a saída do treinador, e encerrou a carreira de Mário na equipe verde e amarela. Daí em diante, o craque, começou a descer a ladeira, em rápidas passagens pelo Botafogo de Ribeirão Preto / SP, Bellinzona, da Suíça, e Bahia. No dia 4 de outubro de 1987, o Bahia enfrentou e venceu o Goiás por 1 a 0, na Fonte Nova, pelo Brasileiro. No intervalo, Mário procurou o veterano treinador Orlando Fantoni e entregou-lhe a camisa, pendurando, como se dizia, as chuteiras. Desde então, abraçou a carreira de técnico.
Como “professor”, tornou-se exigente e disciplinador. Trabalhou em clubes de sete estados – Bahia, Ceará, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo – e como comentarista de TV na Bandeirantes e na Fox Sports, na qual estava atualmente. A exemplo do que ocorreu nos tempos de jogador, não teve papas na língua em nenhuma das duas atividades, criticando de forma objetiva atletas, treinadores, incluindo o próprio Telê, e principalmente os cartolas. “Mau dirigente não deve ter seu nome citado”, ressaltava.
Confessou também que gostava efetivamente de andar armado, mas explicou que o Taurus 380 não ficava na cintura, mas no porta-luvas do carro. Curiosamente, a maioria esmagadora dos que conviveram com Mário, dentro e fora do campo, preferia elogiá-lo, destacando a sua sinceridade e a visão geral que tinha do futebol. Sua história agora está fechada. É mais um reforço para o time lá de cima.