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Companheiro de quarto de Pelé por mais tempo, Lima relembra convivência: ‘Significa tudo para mim’

Coringa da Vila recebeu LANCE! em sua residência, em Santos, e lembrou histórias com o Rei do Futebol. Pelé completa 81 anos neste sábado e recebeu os parabéns do amigo

Lima, ex-jogador do Santos
imagem cameraOrgulhoso, Lima aponta para foto com Pelé nos tempos de atleta (Foto: Guilherme Dionizio / LancePress!)
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Lance!
Santos (SP)
Dia 22/10/2021
18:19
Atualizado em 23/10/2021
08:00

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Os olhos de Lima brilhavam quando o assunto da conversa era Pelé. Durante 11 anos ininterruptos, a dupla conviveu diariamente em viagens, concentrações e na pensão da Dona Giorgina, em Santos. O Coringa da Vila faz parte do seleto grupo de pessoas que tiveram o privilégio de desfrutar do lado humano do jogador consagrado como Rei do Futebol, que completa 81 anos neste sábado (23). 

E a bola os uniu para a vida. Além de amigos, os dois possuem um elo familiar: são concunhados. E para o Coringa, Pelé dá o significado completo para a sua vida.

- Ele (Pelé) significa tudo para mim. Ele foi amigo, foi irmão, foi não, é. É aquele que, mesmo estando longe, você sabe que sempre dedica cinco, 10, 15, meia hora para você. E não precisa falar que tá lembrando do meu irmão, meu amigo Lima, nós somos concunhados, não precisa falar. Eu tenho certeza, absoluta, que isso acontece - disse o ex-jogador do Peixe, que abriu a sua residência, no bairro do Embaré, em Santos, e falou com exclusividade ao

Lima, ex-jogador do Santos
Lima foi bicampeão mundial com o Santos (Foto: Guilherme Dionizio / LancePress!)

Primeiro contato

A trajetória do meia, que também foi zagueiro e lateral, com o Rei não começou com a camisa santista. Lima chegou à Vila Belmiro em 1961 vindo do Juventus da Mooca e antes, em 1959, já havia sido convocado para a Seleção Paulista na disputa do Campeonato Brasileiro. E graças a uma obra do acaso, o então presidente da Federação Paulista de Futebol, Moreira Falcão, colocou o jovem de 18 anos no quarto de Pelé, que, ainda novo, já era campeão mundial de futebol com a Seleção Brasileira e uma referência. Foi um presságio de uma vida de convivência iniciada com o espírito leve do Atleta do Século, brincalhão, para com o que viria a ser o seu eterno companheiro de residência.

- Quando eu vi (que dividiria o quarto com o Pelé), passou pela minha cabeça: Nossa! Não falei pra ninguém, ficou pra mim. Pensei: meu Deus do céu, vou ficar junto com o negrão no quarto. Aí, quando cheguei, ele brincou: Mais um negrão?! E eu respondi, tá bom, você é loiro. Ele me deu as boas vindas, omos para o quarto e conversamos muito. Até porque a trajetória dele foi quase igual a minha. Ele se tornou profissional muito cedo, eu fiquei profissional com 17 para 18 anos, no Juventus, com 18 para 19 era convocado pela Seleção Paulista para disputar um Brasileiro onde só tinha fera. Para você ter uma ideia, o Santos mandou sete jogadores. Então, eu tinha mais que me preparar para, se tivesse uma oportunidade, aproveitar - contou Lima. 

Dois anos depois, em abril de 1961, a cena do primeiro contato se repetiu, mas desta vez nos arredores do estádio Urbano Caldeira. Contratado pelo Peixe, Lima chegou em um dia de treino do Santos e Pelé não sabia da presença do seu companheiro de Seleção Paulista, mas quando descobriu foi como se tivesse revivendo o primeiro “olá”.

- Ele (Pelé) não sabia que eu iria lá. Eu fui contratado, aí a imprensa de São Paulo se colocou na Vila Belmiro e estavam esperando para registrar a famosa fotografia assinando o contrato, aqueles negócios todos. E, para a minha surpresa, o Santos iria treinar e ele (Pelé) esteva lá. Eu nunca me esqueço quando desci na Vila Belmiro, no portão 16, e ele pegou e falou: ‘Não acredito, mais um negrão’. Ele falou igualzinho tinha falado para mim na Seleção Paulista. Aí eu perguntei se ele tinha algum problema. Aí ele respondeu que de vez em quando eles poderiam mandar um loiro - relembra o Coringa.

Lima, ex-jogador do Santos
Lima em seu 'pequeno museu' particular (Foto: Guilherme Dionizio / LancePress!)

11 anos e uma vida de convivência

Com a chegada de Lima ao Santos, a convivência de pouco tempo, em 1959, se tornou de uma vida. Recém-chegado, o meia não sabia onde ficaria hospedado, mas recebeu de Pelé a notícia que havia um quarto na pensão da Dona Giorgina, onde o Rei residia. O local, que ficava na Rua Euclydes da Cunha, no coração de Santos, já abrigava naquela época outros gênios da bola, como Coutinho e Dorval.

Para Lima, morar naquele lugar nunca foi problemas, mas solução.

- Ficou mais fácil em tudo, até em campo. Por incrível que possa parecer. Ficávamos em quatro quartos divididos: Dorval, Coutinho, eu, Sormani, Pelé, Zé Maria, Luis Cláudio e depois veio o Bé, menino de Belém do Pará, e o Silas, um goleiro, se dividiam nesses quartos. Era muito gostoso e muito bom que tudo o que a gente pensava fazer, ou de bom ou de ruim, não tinha como esconder de ninguém ali. A gente trocava muita ideia, até no sentido de como jogar, de jogos passados - destaca Lima, relembrando que a pensão da Dona Giorgina também era o local que os companheiros de Pelé as vezes também puxava a orelha do Rei.

- Quantas vezes a gente chegava para o Negrão (Pelé) e dizia que ele tinha sido fominha no jogo passado. Explicávamos o lance, ele lembrava e falávamos que ele tinha chutado para o gol, mas alguém entrava sozinho. E ele dizia que tinha pensado outra coisa. Não tinha problema nenhum, mas a gente discutia posicionamento, como fazer.

Lima, ex-jogador do Santos
Lima em sua residência (Foto: Guilherme Dionizio / LancePress!)

Como música

E se a sintonia daquele esquadrão em campo era como música, fora dele isso se explicava. Todos os tempos livres eram composto com os seus ritmos, desde o desafogo do Rei com o violão, até as festas organizadas nas excursões pelo mundo afora.

- Pelé gostava de tocar violão, só não aprendeu a tocar (se ele ver isso aqui ele vai ficar…). Cantava bem, só faltava aprender a tocar violão -  brinca Lima aos risos.

- A gente levava os LPs, não tinha CDs na época. O aparelho a gente tinha, era portátil, uma coisinha assim fazia um carnaval danado. A gente chegava depois dos jogos, torneios e tals, chegávamos e falávamos que cada um daria tanto, dois, três dólares, para comprar as coisas e convidar os amigos do lugar. E quantas vezes em hotéis, onde ficávamos hospedados, em vez de alugar para a gente eles cediam. Aí a gente falava para eles ficarem sossegados que não passaríamos da 1 hora da manhã. Mas era o nosso dia de folga - acrescenta o ex-jogador.

Santos campeão da Libertadores de 1963
Lima (em pé, o primeiro à esquerda) com o time do Santos campeão da Libertadores em 1963 (FOTO: Reprodução)

Viver com o Edson e conviver com o Pelé

Lima destaca que não havia distinção entre o ser humano Edson Arantes do Nascimento e o Atleta do Século Pelé, mas que as circunstâncias davam conta dessa “virada de chave”.

- Pelo assédio. O nosso quarto, todas as viagens que nós fizemos, eu ficava, desde o início. Colocavam eu e ele e nunca foi mudado. Na Seleção Brasileira também ficava eu e ele. Até colocavam uns dois ou três, mas ficava eu e ele - relembra Lima.

- Dar cobertura para o Pelé era dar cobertura e não cobrir nada. Colocar um negrão daquele tamanho, com aquele topetão, até que hoje tá mais contido”, acrescenta em tom de brincadeira.

Por outro lado, o Coringa diz que o cotidiano de Edson só fazia do Rei alguém especial. A "Vossa Majestade" vivia como um plebeu e tratava todos como semelhantes.

- Para mim, eu acho que o Pelé veio como aconteceu com várias pessoas que se tornaram famosas, divindades, veio para chegar, mostrar e aconteceu o que tá acontecendo agora, 40 anos depois, 50 anos depois, você tá sentado com um monte de companheiros, não dando uma entrevista, mas batendo um papo, e nesse papo 99% foi ele. Eu acho muito bacana, acho sensacional, porque você chega a desacreditar como uma pessoa são simples, tão igual a todo mundo, brincando, contando piadas, pode ter feito o que ele fez. Ninguém vai fazer o que ele fez. Ninguém. Eu sei que não vou estar vivo para ver isso, só uma nova geração que venha por aí vai ter a oportunidade de contar, mas eu duvido. Eu tive a felicidade de participar e me sinto muito envaidecido por isso”, conclui Lima.

O Coringa se sente envaidecido, e não é para menos. Se em campo, Pelé desfilava talento, fora dele tabelava. Os seus parceiros dentro das quatro linhas eram os seus companheiros fora delas. E ser amigo do Rei é um privilégio, este maior quando a Majestade é Pelé, que faz quem está ao seu lado também desfrutar do protagonismo da história. Lima teve esse benefício de vida e hoje conta com orgulho.

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