Opinião: Quem tem medo das mulheres no comando?
Demissões de Tatiele Silveira e Emily Lima são respaldadas em 'resultados', mas expõem a falta de paciência e até oportunidades dadas a técnicas no Brasil
Nesta segunda-feira, Tatiele Silveira recebeu a notícia de que não teria seu contrato renovado com o Internacional. A treinadora, que estava à frente da equipe feminina de futebol do Colorado, passou quase dois anos completos no clube. Ela chegou em março de 2017 e acumulou 34 vitórias, quatro empates... e duas derrotas. Com as Gurias, a treinadora foi vice do Gaúcho em 2018 e campeão em 2017. Neste ano, levou a equipe até a semifinal do Brasileiro A2.
Mas esses números não foram suficientes, ao menos não para a cúpula colorada. A diretoria quer dar "um novo rumo" no comando técnico para 2019. É mesmo necessário?
Aparentemente, também não tem peso o fato de Tatiele ser a única mulher no sul do país licenciada pelos cursos da CBF. Recentemente, ela concluiu o curso A da entidade, o único abaixo da licença PRO, a mais alta. Um novo nome para o futebol feminino do Internacional deve ser anunciado ainda nesta semana - o que dá indícios de que o martelo da demissão foi batido há tempos.
Dadas as circunstâncias, é impossível não lembrar da demissão de Emily Lima na Seleção Brasileira feminina. A treinadora foi a primeira mulher a ocupar o cargo na Canarinho, sendo demitida após dez meses de trabalho. Foram 13 jogos. Sete vitórias, um empate e cinco derrotas. Nenhum confronto oficial. Em seu lugar entrou Vadão, figura conhecida - e amplamente contestada - dentro do mundo do futebol feminino.
Todos os tropeços no caminho de Emily Lima foram para seleções acima da nossa no ranking da Fifa. Em muitos dos casos, o revés brasileiro se deu diante de países com maiores tradição e investimento em infraestrutura no futebol feminino - como a própria Alemanha, que venceu o Brasil por 3 a 1 em amistoso e deu fim à invencibilidade da comandante.
A demissão da treinadora gerou um desconforto tão grande que foi o estopim para a aposentadoria de jogadoras da Seleção Brasileira. Rosana, Maurine, Franciele e Andreia Rosa abandonaram o plantel de vez; Cristiane se aposentou, mas retornou à Canarinho posteriormente.
As justificativas dos clubes e entidades são sempre as mesmas: resultados. O debate sobre a cultura imediatista no futebol do Brasil é válido. Mas é preciso questionar essa resposta pronta quando ela se dá em casos como os de Tatiele Silveira ou de Emily Lima.
Ser desligada de um cargo em que você sofreu duas derrotas em 40 jogos, ou então em um em que você sequer pôde disputar uma partida oficial, deixa explícita a falta de paciência - e até oportunidades - dada a mulheres no futebol do Brasil. Quem tem medo das mulheres no comando?
*Sob supervisão de Aigor Ojêda