Neste ano, o troféu COI (Comitê Olímpico Internacional) tem o "Olimpismo em ação" como tema, voltado a indivíduos que tenham promovido os valores dos Jogos - a atividade física, a educação e o desenvolvimento por meio do esporte, a igualdade de gênero, o esporte a serviço da humanidade e a ajuda aos refugiados por meio do esporte.
A indicação do Comitê Olímpico do Brasil para receber essa honra em 2018 atende fielmente a todos esses requisitos: o homenageado será Geraldo Bernardes, treinador de judô. O troféu será entregue na próxima terça-feira, durante a cerimônia do Prêmio Brasil Olímpico, no Rio de Janeiro.
O recifense Bernardes tem 76 anos e foi mentor da campeã olímpica Rafaela Silva (Rio-2016) e do medalhista Flávio Canto (bronze em Atenas-2004). Foi ele o criador da ONG Instituto Reação, que já atendeu a mais de quatro mil crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social - incluindo os refugiados Yolande Bukasa e Popole Misenga, treinados por ele no time de Refugiados do COI, que disputou os Jogos Olímpicos Rio 2016.
- É uma alegria muito grande receber essa homenagem. Muito mais do que as conquistas esportivas, nosso objetivo é formar cidadãos, verdadeiros campeões da vida. E, por isso, focamos sempre no binômio esporte e educação. Os Jogos Rio-2016 foram a maior emoção da minha vida porque, além de ter sido escolhido pelo COI, ter a indicação corroborada pelo COB para orientar Popole e Yolande, pude ver de perto a Rafaela Silva, a quem ensinei os primeiros movimentos no esporte, conquistar o ouro olímpico - disse Geraldo.
O atual treinador começou sua vida nos tatames aos 15 anos e escondido dos pais, em um tempo que esportes de combate eram considerados algo violento no Brasil. Geraldo avançou e evoluiu até chegar à faixa preta, tanto no judô quanto no jiu-jitsu. Foi professor da equipe de judô da Universidade Gama Filho - uma das mais premiadas do país -, e foi convidado em 1979 para treinar a Seleção Brasileira pela primeira vez. No primeiro Mundial em que comandou a seleção, levou a equipe à primeira medalha de um não-descendente de japoneses, o bronze de Walter Carmona. Em Olimpíadas, sua primeira atuação ao lado dos tatames foi em Seul-1988, torneio em que Aurélio Miguel se consagrou como o primeiro medalhista de ouro do judô brasileiro.
Além disso, Bernardes orientou Rogério Sampaio (ouro em Barcelona-1992), Henrique Guimarães (bronze em Atlanta-1996), Carlos Honorato (prata em Sydney-2000) e Tiago Camilo (prata em Sydney-2000), ajudando o judô na conquista de seis medalhas olímpicas, ao todo. Após um problema cardíaco em 2000, com quatro pontes de safena e duas de mamária, ele fundou o Judô Comunitário Geraldo Bernardes Body Planet em uma academia próxima à comunidade da Cidade de Deus, no Rio de Janeiro. Três anos depois de sua fundação, o projeto já era bicampeão carioca nas categorias de base.
- Ouvi pessoas dizendo que eu estava por baixo, com os “pobrinhos”. Mas sempre acreditei nos atletas que vêm de comunidades. Esporte de alto rendimento é sacrifício. E eles estão acostumados a dar tudo de si - completou Bernardes. O Judô Comunitário Instituto Reação surgiu quando Flávio Canto, bronze em Atenas-2004, convidou seu mestre para que o projeto de Geraldo se unisse ao Instituto Reação. Hoje, a organização tem cinco polos e atende a cerca de 1.250 alunos.
- Entre colocar o pijama ou ajeitar o quimono e recomeçar, escolhi a segunda opção. Conquistas esportivas são como páginas viradas, glórias passageiras. Fiz uma boa carreira como atleta e, como técnico, ajudei na conquista de seis medalhas olímpicas, mas tudo ficou pequeno diante do que faço hoje, que é transformar pessoas como Rafaela, que tinha poucas perspectivas, em campeãs no esporte e na vida - disse Geraldo Bernardes.
Geraldo retornou à beira dos tatames olímpicos nos Jogos Rio-2016, quando orientou os congoleses Popole Misenga e Yolande Bukasa, que disputaram a competição pelo time de refugiados do COI. Ambos treinam com o brasileiro no Instituto Reação. Mas sua maior conquista foi mesmo Rafaela Silva, arredia da Cidade de Deus, que trabalha com Geraldo desde os nove anos de idade e foi campeã olímpica em casa.