Da briga jurídica ao título, Scarpa vê 2018 como um ‘divisor de águas’

Meia perdeu parte da temporada pela batalha nos tribunais com o Fluminense, sofreu uma lesão complicada no pé, mas voltou a tempo de fazer gols importantes no fim do ano

imagem cameraGustavo Scarpa levanta a taça do título brasileiro, o primeiro de sua carreira (Foto: Cesar Greco)
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Lance!
São Paulo (SP)
Dia 09/12/2018
20:11
Atualizado em 10/12/2018
08:00
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Gustavo Scarpa percorreu um trajeto tortuoso na temporada de 2018. Depois da chegada com badalação ao Palmeiras, perdeu tempo primeiro por conta da batalha jurídica com o Fluminense, depois por uma lesão no pé direito, mas voltou a tempo para ter sua importância na conquista do título brasileiro.

Dos 24 jogos que fez no ano, 12 foram durante a campanha campeã, com dois gols marcados. O primeiro contra o Paraná, que serviu para manter a sequência invicta do Verdão no campeonato, e depois contra o Vitória, no jogo da taça. Nesta duzia de partidas, conseguiu se manter como o segundo jogador com mais assistências para gol nos últimos quatro Brasileiros (25, só atrás de Dudu, com 35), e o terceiro com mais assistências para finalização no mesmo período (225, atrás de Dudu, com 244, e Lucas Lima, com 259).

O fim, portanto, acabou sendo muito mais feliz para o camisa 14, que ficou seis semanas no departamento médico graças a um problema no calcanhar direito, logo no início do trabalho de Felipão, e antes havia parado por três meses (entre março e junho) pela briga com o Fluminense na Justiça.

Graças a um acordo feito em outubro, a batalha com o clube das Laranjeiras está encerrada, e Scarpa terminou 2018 bem fisicamente. Sem nada para lhe atrapalhar e integrado ao elenco desde o início para a próxima pré-temporada, ele conta ao LANCE! que espera uma nova fase no Verdão a partir de 2019.

- Teve de tudo. É um ano para não ser esquecido. Pelo contrário, é para ser lembrado e contado. Fico feliz porque as coisas terminaram muito bem, apesar dos problemas extracampo, questão judicial com o Fluminense, a lesão que tive. Vejo o ano como muito positivo. Depois de ter passado por tudo que passei, terminar o ano jogando, fazendo até gol na reta final, estando em campo no jogo do título (contra o Vasco). Para mim, foi extremamente gratificante - falou.

Confira a entrevista exclusiva com Gustavo Scarpa

LANCE!: Você ganhou o maior título da carreira em um ano no qual ficou fora por problemas jurídicos e lesão. Como este Brasileiro fica marcado para você?
Gustavo Scarpa: Espero que seja um divisor de águas na minha vida, que seja o começo de grandes conquistas. Fico muito feliz com a conquista do Brasileiro, porque sei quanto é difícil ganhar. Que seja um divisor de águas.

Terminar o ano sabendo que já foi encerrado um imbróglio jurídico que poderia se alongar tira um peso?
Isso me deixa mais tranquilo para começar 2019 bem, leve, pensando apenas em ajudar a equipe, em melhorar tecnicamente, e não ficar pensando em problemas judiciais que, realmente, são coisas que mexem com o psicológico. Fico feliz porque vou começar 2019 campeão brasileiro e buscando mais títulos sem problema judicial rolando.

Como foi sua rotina no Palmeiras sem poder jogar, tanto pelo problema jurídico quanto pela lesão?
Quando fiquei longe, alguns jogadores me mandaram mensagem. Mas eu mesmo dei uma afastada. Não só do Whatsapp, mas das redes sociais, Facebook, Instagram, para aproveitar o tempo que eu ia ficar com a família e os amigos. Até porque, todo lugar que eu abria, saía notícia sobre aquilo, e muitas mentirosas. Isso acaba mexendo um pouco. Então, procurei ficar perto das pessoas que me conhecem e me ajudam verdadeiramente. Foi muito bom. Fiquei em paz. E pude voltar muito bem ao Palmeiras e ajudar o time.

Mas você via os jogos do Palmeiras?
Via. Saí nas quartas de final do Paulista (quando o Fluminense derrubou sua liminar) e perdi quase um turno inteiro do Brasileiro. Eu acompanhava, torcia, às vezes mandava mensagem para o pessoal. Mas não via a hora de voltar. Ainda bem que deu certo.

No que você se apegou no momento em que não pôde jogar?
Não é que me apeguei mais a isso, mas continuei com minha fé em Deus, em Cristo inabalável. O fato de estar perto da família e dos amigos foi muito importante, poder ficar na minha cidade no interior tranquilo, em um lugar onde todos me conhecem, onde tenho amizade com quase todos. Isso foi muito bom para mim, para que eu pudesse ficar em paz, dormir em paz, tranquilo. Até porque eu estava ciente do que estava fazendo, dos motivos, das razões. Isso me deixou em paz.

Quando você ficou livre de novo na Justiça, chegou a se falar que tinham times árabes interessados. Você foi procurado?
Tinha duas equipes da Arábia, uma até passou a tratar diretamente comigo, o presidente quis conversar, ligou para mim. Mas eu já tinha deixado a minha palavra com o Palmeiras, e isso vale mais do que qualquer contrato assinado. E o Palmeiras, neste tempo em que fiquei fora, me ajudou muito mais do que tinha no contrato. Até porque fiquei prejudicado quando estava prestes a ter um benefício financeiro. O contrato foi rescindido, mas o Palmeiras manteve a palavra dele e eu mantive a minha em voltar. Fiquei muito feliz. Não tinha como não voltar, o Palmeiras foi muito profissional comigo.

Esse benefício financeiro era por luvas e bonificações do contrato?
Exato. Tinha uma data para ser paga, a liminar caiu e tive de ficar sem contrato. Mas o Palmeiras manteve o pagamento. Fiquei muito feliz porque me ajudou. Fiquei três meses e meio sem receber salário, nem do Fluminense, que eu já não esperava mesmo, nem do Palmeiras (nota da redação: quando acertou com o Palmeiras, sem contrato do Fluminense, o meia receberia luvas de 6 milhões de euros, equivalente a R$ 24 milhões na época. Para ter o acordo na Justiça, Scarpa abriu mão de 1,5 milhão de euros destes 6, algo em torno de R$ 6,7 milhões, que acabou destinado ao Flu).

Como ficou sua relação com o elenco do Fluminense depois de ouvir jogadores de lá te criticando?
Com os jogadores que falaram, que eu achava que tinha como amigo, perdi o contato. E, também, não fazem falta nenhuma. Mas tem muitos amigos lá com quem converso sempre. Já saí para jantar com alguns, tem funcionários com quem converso direto... São amigos que fiz lá. Ficou uma relação tranquila. Só alguns, infelizmente, acabaram falando o que não deviam, mas nem entro em polêmica, nem esquento. Fui pego de surpresa, mas nem levo adiante porque não vai me acrescentar nada.

Mas você vê jogos do Fluminense?
Às vezes, quando tem algum amigo meu jogando: o Airton, o (Igor) Julião, o Júlio César, que são amigos que tenho lá, e outros. Espero que as coisas deem certo para eles, principalmente financeiramente, porque são pais de família, têm família para cuidar, e acabam sofrendo muito com questão de (salários) atrasados. Por serem meus amigos, torço muito por eles.

Falando do Palmeiras, o Felipão monta um time bem vertical. O que você precisa fazer para se adaptar?
Tenho de tentar me adaptar o mais rápido possível à questão tática, ao trabalho do treinador que chega. A essa questão de o jogo ficar mais rápido ou cadenciado, consigo me adaptar rapidamente. Não vejo nenhum problema com a troca de jogadores, de posição ou função tática dentro de campo. Vejo isso de uma forma natural. Não tenho problema quanto a isso.

Já te vimos jogar em várias funções, fala-se muito que você é mais ponta direita do que armador. Qual é a sua posição, de fato?
Na verdade, desde pequeno, sempre joguei em muitas posições: eu jogava na lateral esquerda, na lateral direita, de segundo volante, ponta esquerda, ponta direita, central... No Fluminense, na maioria dos meus anos na base, eu jogava centralizado. Subi para o profissional e acabei indo para o lado para poder ajudar na marcação, acompanhando lateral. Não tenho preferência. Independentemente da posição que tiver, se estiver sobrando uma vaga e quiser contar comigo, todos sabem que podem me colocar, porque não tenho preferência por posição.

O que significou aquele gol contra o Paraná? Você se emocionou na comemoração...
Foi muito legal. Por mais que tenha sido um jogo contra um clube que já estava rebaixado, estávamos perdendo, faltavam três rodadas para acabar o campeonato e ter a responsabilidade de bater um pênalti em um jogo tão difícil, com vento, chuva... Foi gratificante. Fiquei muito feliz por ter sido um pouco importante nesta reta final depois de tudo que passei durante o ano.

Foi o seu melhor momento no ano?
Ah, acho que sim. Na verdade, quando fiz os dois gols contra o Ituano e achei que ia começar a despontar, na semana mesmo já caiu a liminar. Mas foi uma sequência legal (do gol contra o Paraná). Entrei contra o Fluminense dando assistência para o Luan, contra o Paraná eu fiz o gol... Talvez tenha sido o meu melhor momento. Apesar de que tive uma sequência de seis, sete jogos, caiu a liminar, voltei do problema judicial jogando seis, sete jogos, machuquei e, na reta final, joguei seis, sete jogos também. Acho que foi o meu melhor momento, sim.

Percebemos que os estrangeiros falam bastante com você aqui no Palmeiras. Você fala bem espanhol?
Não. Portunhol, na verdade. Português com sotaque de espanhol só (risos). Mas converso muito com o Borja, o Gustavo (Gómez), o Nicolas (Freire) e o Guerra, de quem, particularmente, sou muito fã do futebol desde a época que eu era do Fluminense. É legal, os gringos são divertidos. Eles chegam sempre quietinhos, tal, mas, depois que se soltam, tem de tomar muito cuidado. Mas são extremamente do bem, profissionais, e nos ajudaram muito na conquista do título.

Viralizou uma brincadeira que você e o Guerra ficaram fazendo no stories do Instagram, um replicando o outro com o vídeo do "hoje tem"...
Exatamente. Foi no jogo contra o Boca. Começamos a rir disso e combinamos de ficar repostando um do outro e, quando vimos, o vídeo estava pequenininho. Mas o Guerra é superdivertido. É um craque, para mim, e um cara muito divertido fora de campo.

Para você, que não conseguiu jogar tanto, como foi a sua relação com o Felipão?
Extremamente profissional. Desde quando chegou, conversou comigo, perguntava as questões táticas, as preferências, essas coisas... Aí, me machuquei. Mas ele sempre perguntou se estava tudo bem, previsão para retorno. É uma relação profissional. É um cara que respeito, um treinador com um histórico vencedor. Eu acompanhava os times dele quando eu era criança, do Mundial de 2002. É um prazer, uma honra poder trabalhar com ele e fazer parte do histórico de títulos dele com esse Brasileirão.

Passa pela sua cabeça estar na Copa América com a Seleção, no meio do ano que vem?
Na verdade, sempre passa pela cabeça ir para a Seleção em algum momento. É o objetivo de todos. É claro que esses objetivos individuais acabam sendo facilitados quando o objetivo do grupo é alcançado. É uma consequência. Não fico sem dormir pensando nisso. Pelo contrário: trabalho, faço o meu melhor e sei que as coisas tendem a fluir naturalmente. Mas é uma vontade que tenho. Não só a Copa América, mas poder, algum dia, ter sequência na Seleção.

Nesse sonho de Seleção, esse rodízio de times do Felipão não atrapalha?
Não sei se chega a atrapalhar, mas o nosso principal objetivo tem de ser ajudar o Palmeiras. Aí, depois que esse objetivo for alcançado, pensar em Seleção. se o que estamos fazendo está ajudando o Palmeiras a conquistar títulos, é o suficiente.

Vai jogar futsal nas férias de novo?
Se for, agora, será mais por diversão. Não será por campeonato, valendo. Mas acho que vou jogar de boa, em society ou até mesmo no campo, nesses jogos que aparecem no final do ano, mas sempre com bastante cuidado para não acontecer nada de ruim e me apresentar bem ao Palmeiras no ano que vem.

Como ficou o seu time de futsal no campeonato que você jogou?
Joguei até o primeiro jogo da final. Na semana do segundo jogo da final, consegui o habeas corpus para jogar no Palmeiras, e meu time acabou perdendo. Mas fui o artilheiro do campeonato.

Com quantos gols?

Uns 18, talvez. 19. Em dois jogos (risos). Brincadeira. Mas era o time do meu pai. Foi bem legal. Mas espero só voltar na brincadeira, que não aconteça nada que me faça voltar.

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