Canindé 50 anos: festa da casa mais portuguesa com certeza de São Paulo
Lusa festeja aniversário de seu estádio visando o futuro; LANCE! relembra grandes momentos do tradicional palco
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Alguns chamam de casa. Outros de um bom lugar apenas. Sede da Portuguesa, atualmente sem divisão nacional e na Série A-2 do Paulistão, o Estádio do Canindé completa neste domingo (9) 50 anos de idade. E aquele pedaço encrustado no bairro da região central de São Paulo está na memória tanto dos paulistano, seja pelo futebol ou pela tradicional festa junina que arrasta multidões às suas dependências, ou para qualquer visitante da cidade, por conta da sua localização privilegiada, às margens da Marginal Tietê, no caminho para dois pontos fundamentais, o Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos (SP), e a Rodovia Presidente Dutra.
Importante reforçar que a história do Canindé vem bem antes daquela derrota da Lusa para o Benfica por 3 a 1. Apesar do clube 'zerar' a contagem, o local, chamado de Ilha da Madeira por uma condição surreal de alagamento das várzeas do Tietê em épocas de cheias, o que permitia o acesso apenas de barco, vem desde os anos 1930 como instalação esportiva.
Na época, a Associação Alemã de Esportes (Deutscher SC), uma pequena agremiação de imigrantes do país europeu, alugava o terreno, ainda uma chácara, de um casal italiano, a família Vannucci, para principalmente praticar o remo.
Assim ficou até a década seguinte, quando explodiu a Segunda Guerra Mundial. Com o Brasil se alinhando aos aliados e rompendo suas relações diplomáticas com a Alemanha nazista, o Deutscher SC procurou uma maneira de evitar a sua extinção. E encontrou um aliado de primeira hora que havia acabado de ser fundado e não tinha sequer local para seus jogadores treinarem: o São Paulo Futebol Clube.
Em 13 de março de 1942, os alemães aprovaram por unanimidade a sua incorporação ao Tricolor. E, em 29 de janeiro de 1944, o São Paulo comprou o terreno de 44.400m² da família italiana.
O Tricolor nunca jogou partidas oficiais em sua trajetória no Canindé. O local era usado apenas como sede administrativa e para treinamentos, do time de futebol e de outros esportes. Foi na Ilha da Madeira que Adhemar Ferreira da Silva, responsável por duas estrelas no distintivo do São Paulo, se preparou para ser o recordista mundial (1952 e 1955) e olímpico
(1952) no salto triplo.
O Canindé virou, de fato, uma casa portuguesa em 1956. O principal dirigente tricolor à época, Laudo Natel, tinha o sonho do clube ter o seu estádio próprio e temia a perda de parte considerável da propriedade por conta da construção da Marginal. Após muita procura (chegou-se a sondar a aquisição do local onde hoje está instalado o Parque do Ibirapuera), o São Paulo acabaria escolhendo o Morumbi, onde iniciou a construção do estádio dois anos depois.
Pago pela Lusa com um cheque de Cr$ 35.000.000,00 de um dono de fábrica de biscoitos, o Canindé foi aos poucos ganhando os ares rubro-verdes. Por dez anos, o clube honrou o apelido e fez um campo com arquibancadas de madeiras onde mandava suas partidas contra clubes menores. Isso até 1967, quando Oswaldo Teixeira Duarte, que hoje batiza o estádio, iniciou os planos de reforma geral das dependências.
O Canindé foi inaugurado com uma série de três jogos amistosos que contou com a cessão de jogadores dos outros times paulistas. Isso possibilitou que Rivellino, astro corintiano, vestisse a camisa lusa e até marcasse um gol pelo clube (leia mais abaixo). Apesar da festa, as obras estavam incompletas, mas mesmo assim a Portuguesa 'zerou' a história do espaço e considera o batismo como estádio Independência, como foi nomeado à época, o ponto inicial de sua casa. A configuração atual do estádio só se formou inteira em 1981, quando a Portuguesa enfim gritou é campeã.
O futuro e os planos de modernização que nunca chegam
Ao longo do tempo, junto com a decadência da Portuguesa nos campeonatos, veio a deterioração do Canindé. Desde a virada dos anos 2000, se tornou recorrente a Portuguesa ter dificuldades de conseguir laudos técnico para a liberação do estádio para os jogos. Reformas pontuais forma feitas, mas aprincipal, fonte de renda do clube passou a ser o aluguel do clube.
Desde a queda para ficar sem divisão, o clube apostou até em bailes funk para angariar dinheiro. O ginásio, por exemplo, é arrendado para uma igreja evangélica. Tornou-se recorrente os torcedores lusitanos acompanharem sites de leilões judiciais já que o Canindé constantemente foi alvo de penhoras por dívidas com ex-jogadores. Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, atualmente são 47 dessas ações envolvendo a penhora do estádio como garantia de pagamento pedido pelos advogados.
O atual presidente da Portuguesa, Antonio Castanheira, que destaca a ajuda do pai na construção da casa rubro-verde, assumiu o clube em 2020 com a bandeira de reformular o complexo do Canindé. A parceria com uma construtora, nos moldes do que o Palmeiras fez com o Allianz Parque, estão nos planos.
- O desafio é fazer do Canindé uma arena rentável, uma fonte de receitas para o clube e que ele seja a ponta de lança para o século XXI.
Para que esse projeto se torne realidade, a gestão atual detalhou um projeto para o estádio que envolvem três tópicos considerados prioritários: separação do futebol do clube social, modernização patrimonial do clube, com o projeto arena e investimento em futebol de base, para gerar novos talentos. Transformar a Lusa em SAF, por exemplo, é visto como uma solução para avançar na modernização do Canindé.
- Claro que para você avançar esses tópicos relacionados ao futebol empresa você tem que pavimentar o caminho para concretizar essas ações e para isso estamos trabalhando em quatro fases. Regras de governança, segurança jurídica, com acordos trabalhistas e cíveis para eliminarmos os leilões no patrimônio do clube e também os bloqueios nas receitas financeira. O terceiro passo é atuar na aprovação junto aos poderes do clube do modelo jurídico que queremos para a nova Portuguesa e de negócio da implantação da SAF da Lusa. Por último, a captação de investidores dentro do modelo de negócio da SAF para a Portuguesa.
L! RELEMBRA OS DEZ MAIORES JOGOS DO CANINDÉ
1 - Portuguesa 1 x 3 Benfica - 9/1/1972
A inauguração. O português Vitor Batista marcou o primeiro gol do Canindé na partida que ficou para a história do futebol paulista.
2 - Portuguesa 2 x 0 Zeljznicar - 16/1/1972
O time da extinta Iugoslávia veio a São Paulo participar das festas de inauguração do Canindé. E teve como convidado de honra o tricampeão mundial Rivellino. Na época a torcida corintiana recebeu como uma bomba a notícia de ver seu maior ídolo com outra camisa e cobrou explicações do histórico presidente alvinegro Vicente Matheus. O dono da patada atômica jogou com o número 8, o mesmo usado na Copa do México dois anos antes, e marcou um raro gol com o pé direito.
3 - Portuguesa 2 x 0 Sporting - 15/1/1981
Mais uma festa. Desta vez para marcar a inauguração da iluminação para jogos noturnos no Canindé e a conclusão total das obras. A vitória sobre o time português marcou a conquista da Taça dos Refletores, primeiro título da Lusa em seu estádio, em uma ação de marketing pioneira, com a ajuda do banco que financiou e emprestou a grana para o clube.
4 - Corinthians 10 x 1 Tiradentes-PI - 9/2/1983
O torcedor lusitano pode ficar bravo, mas com o Canindé sempre abrigando partidas dos seus rivais paulistas, seria inevitável que alguns deles marcasse a história do estádio. Coube ao Timão a façanha. Com quatro gols de Sócrates, o Corinthians impôs a maior goleada da história do Campeonato Brasileiro até hoje.
5 - Portuguesa 2 x 1 Ponte Preta - 18/8/1985
Um dia de festa para o lusitano. No ano em que chegou à final do Campeonato Paulista (perderia o título para o São Paulo dos Menudos do Morumbi), a semifinal contra a Ferroviária poderia estar nesta lista. Mas a escolha daquele ano vai para a partida em que o clube ratificou o título do primeiro turno, garantindo a ida às finais. A Lusa entrou em campo já campeã. O Tricolor perdeu um dia antes para o Guarani, em Campinas. E restando só a comemoração, Oswaldo Teixeira Duarte tornou o duelo para cumprir tabela na maior comemoração já vista no estádio, com show de música, sorteio de eletrodomésticos e um carro e até a presença de um circo, com direito a um elefante desfilando pelo gramado antes do jogo.
6 - Portuguesa 0 x 1 XV de Piracicaba - 18/5/1988
O jogo que não acabou. Marcando o maior folclore (comprovado) da história do estádio. A Lusa tomou o gol logo no primeiro minuto de partida. E 23 minutos depois ela foi suspensa. O motivo: um gato entrou (ou foi jogado) na caixa de energia elétrica, causando um curto-circuito que tornou impossível o reinício do jogo. A morte do gato fez com que as equipes voltassem a campo no dia 2 de junho. E aí a Lusa venceu por 2 a 1.
7 - Portuguesa 1 x 0 Inter de Limeira - 13/11/1991
O maior gol da história do estádio. Dener recebeu a bola pouco depois da linha de meio-campo. Passou por oito marcadores e só não entrou com bola e tudo porque teve humildade, como diz uma famosa música. O lance, eternizado nos cinemas como parte do filme "Boleiros - Era Uma Vez o Futebol", alçou o eterno camisa 10 lusitano ao estrelado (já havia conduzido o clube ao título da Copa São Paulo de juniores naquele mesmo ano, contra o Grêmio, no mesmo Canindé).
8 - Portuguesa 0 x 1 Cruzeiro - 9/12/1998
Mais uma vez o lusitano vai ficar bravo. Mas não há como negar que 1998 foi um dos maiores anos da história do clube. E o dia mais triste da história do Canindé foi esse. Na semifinal do Campeonato Brasileiro, o clube perdeu o primeiro confronto para os mineiros fora de casa. A Lusa bateu o pé e conseguiu mandar os duelos restantes em sua casa (era ano do famoso playoff no mata-mata, ou seja, melhor de três jogos). Venceu o segundo po 2 a 1. E na decisão final, com o maior oúblico registrado na história do Canindé (mais de 27 mil pessoas espremidas), em um dia de muita chuva, Leandro Amaral - maior artilheiro da história da casa lusa, com 113 gols - perdeu pênalti e a Rubro-Verde foi eliminada.
9 - Portuguesa 4 x 0 Rio Preto - 6/5/2007
Com tanta história, uma partida da segunda divisão estadual ganha o seu destaque simplesmente por marcar a primeira conquista oficial da Lusa em sua casa. A goleada sobre o Rio Preto resgatou um pouco o orgulho do lusitano após o primeiro rebaixado no Campeonato Paulista. E o domingo de manhã foi de festa pelo título que demorou 31 anos a chegar.
10 - Portuguesa 2 x 2 Sport - 8/11/2011
Depois da glória estadual, a nacional. A Lusa volta a dar a volta olímpica em seu estádio com o título da Série B e a consolidação da Barcelusa, como aquele time ficou conhecido, como o último grande momento do clube em sua história.
LENDAS, CURIOSIDADES E FATOS
1 - Trator enterrado?
É talvez o maior folclore da história do Canindé. Dizem que após o fechamento do anel, um trator que auxiliou nas obras ficou preso do lado de dentro sem ter como ser retirado. E a solução teria sido enterrá-lo no gramado. Sem evidências alguma de ser verdadeira, a história é usada por torcedores para justificar os azares sofridos ao longo dos anos
2 - Demolir tudo
Ditador ou genial? Oswaldo Teixeira Duarte protagonizou inúmeras façanhas folclóricas dignas dos dirigentes brasileiros daqueles tempos. Mas a maior de todas foi em 1982. Irritado pelo fato da federação Paulista de Futebol não liberar o uso do Canindé para um clássico contra o Palmeiras pelo segundo turno do Paulistão, o cartola se vingou duas semanas depois gelando a alma lusitana. A FPF marcou um confronto do Corinthians no estádio ante o Taubaté e OTD foi pessoalmente à sede da entidade mostrar o motivo pelo qual o jogo não poderia ser realizado no estádio: pagou a demolição das estruturas, que começariam em 12 horas. A construtora chegou de fato a enviar caminhões e guindastes para o serviço, deixando chocados jornalistas e torcedores. À época, a imprensa apurou que realmente a demolição foi paga. E não há indícios de que o dinheiro fora devolvido.
3 - Sem TV
OTD voltou a aprontar das suas em 1985. Com a boa campanha da Lusa no Paulistão, exigiu que as TVs pagassem ao time o mesmo que Guarani e São Paulo receberiam pela outra semifinal. Na época as negociações para transmissão de jogos funcionavam dessa maneira. Sem acordo, não houve TV ao vivo para os duelos contra a Ferroviária. Mas no jogo de volta, no Canindé, a vingança contra a imprensa foi no mínimo cruel. Carros das emissoras foram impedidos de entrarem no clube. Jornalistas de rádio e jornal foram expostos a canos de água e esgoto arrebentados, trabalhando sob ambiente inundado e fétido. Duarte morreu negando que foi proposital.
4 - Violência
A maior briga de torcidas já vista no Canindé foi em uma partida de juniores, em 1978, entre Santos e Portuguesa. A briga começou nas arquibancadas e se espalhou para o interior do clube. A pancadaria foi potencializada pelo uso do material de construção que estava sendo utilizado para a ampliação do estádio. Paus e pedras foram usados pelos torcedores como armas. E a batalha durou cerca de três horas, segundo jornais da época.
5 - Roubaram o juiz
Em 1983, a Lusa recebeu o Corinthians da Democracia e já perdia por 2 a 0 no primeiro tempo, com dois gols de pênalti. Chegou a diminuir, mais o árbitro anulou o que seria o empate. Inconformados, os lusitanos invadiram o vestiário de Sílvio Acácio Silveira e quebraram tudo. Não só isso. Todos os pertences dele foram roubados, incluindo as chaves de seu carro, o que obrigou Silveira a ir de carona com jornalistas até a delegacia fazer o registro do boletim de ocorrência. A partida foi suspensa e a FPF ratificou o resultado.
6 - O show da vida
Em outubro de 1979 o cantor Jair Rodrigues gravou um clipe para o Fantástico, da Rede Globo, durante o empate de 1 a 1 entre Portuguesa e Guarani. Sentado atrás da linha de fundo de um dos gols, ele cantava "Manés e Pelés", sobre a vida dos jogadores. "Você, em meu ponto de vista, é um craque, um artista, e está com a bola. Tem hoje as melhores propostas e tapinha nas costas de todo cartola..."
7 - Na história palmeirense
Em 22 de janeiro de 1984 o Canindé foi palco da despedida de.... Ademir da Guia. Isso mesmo, o divino eterno camisa 10 do Palmeiras ganhou uma festa de despedida na casa lusitana pelo fato de Parque Antártica e Pacaembu estarem fechados para reformas e o Verdão se recusar a alugar o Morumbi por conta de mais uma das inúmeras brigas com o São Paulo. O time alviverde acabou perdendo o amistoso para uma seleção paulista por 2 a 1.
8 - A autoridade aqui sou eu
O técnico Antonio Lopes dirigiu a Portuguesa em 1989. Durante um jogo contra o Palmeiras, pelo Campeonato Brasileiro, no Canindé, a Lusa venceu por 1 a 0, com um gol de pênalti marcado por Roberto Dinamite. Lopes foi expulso no fim do primeiro tempo. Inconformado, o ex-delegado deu voz de prisão ao árbitro. Porém o juiz permaneceu em campo e ele teve de ver o segundo tempo das tribunas.
9 - Tem coisas que só acontecem com a Lusa
Em um episódio digno do folclore que ronda a Portuguesa, o clube vencia a Matonense por 1 a 0, no Campeonato Paulista de 2000, quando o atacante Bentinho recebeu um cruzamento da direita, matou a bola no peito, e marcou. O gol foi prontamente anulado pelo árbitro Vladimir Vassoler. A alegação foi a de que a bola estava furada quando Bentinho concluiu a jogada. A bola estourou quando Márcio Goiano fez o cruzamento. O jogo terminou 2 a 2.
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