Contra Argentina, Gabriel Jesus joga no palco em que virou ‘gente grande’
Há quatro anos, atacante virou titular do Palmeiras e deu show no palco do Superclássico contra a Argentina. 'Ali ele se apresentou para o Brasil', relembra seu ex-técnico
Cinco anos depois da maior derrota de sua história, a Seleção Brasileira voltará a disputar uma semifinal no Mineirão: às 21h30 desta terça, contra a Argentina, pela Copa América. O cenário obviamente remete aos 7 a 1 aplicados pela Alemanha na Copa do Mundo de 2014, mas há quem tenha ótimas lembranças dali, caso de Gabriel Jesus.
Foi neste estádio que o atacante virou "gente grande" no futebol, em 26 de agosto de 2015. Aos 18 anos, tomou o lugar de Rafael Marques e foi a surpresa do time titular do Palmeiras no jogo de volta contra o Cruzeiro, pelas oitavas de final da Copa do Brasil. Em meia hora, marcou dois gols, um deles deixando o experiente goleiro Fábio estirado no gramado, e deu uma assistência para Dudu. O Verdão, que terminaria como campeão, venceu por 3 a 2.
- Naquela semana do Cruzeiro ele treinou muito bem, cara. Estava com muito apetite nos treinos. Muitas vezes as pessoas não lembram que tem o trabalho da semana, é muito importante você perceber o que acontece nos treinos para montar o time. Eu entendia que o Cruzeiro tinha uma zaga um pouco mais lenta e que o Gabriel poderia ser útil. E ele fez uma partida extraordinária. Já vi grandes partidas dele, mas naquela ele desequilibrou demais, com jogadas individuais, parte tática muito boa, recomposição... Ali ele se apresentou definitivamente para o Brasil - lembra Marcelo Oliveira, técnico do Palmeiras naquela ocasião e à espera de convites desde que deixou o Fluminense em novembro de 2018.
Até ali, o menino somava 15 partidas como profissional - só duas como titular - e um gol, marcado contra o ASA-AL na mesma Copa do Brasil. No jogo seguinte ao show no Mineirão, marcou mais dois na vitória por 3 a 2 sobre o Joinville, no jogo em que a torcida palmeirense cantou pela primeira vez o hit "glória, glória, aleluia" para homenageá-lo no Allianz Parque. A partir daí, raras foram as vezes em que não esteve entre os 11 do clube paulista, de onde saiu no fim de 2016 rumo ao Manchester City, já campeão brasileiro e frequentemente convocado por Tite para a Seleção Brasileira.
Mas Gabriel também alguns fantasmas para espantar nesta noite. Embora seja o artilheiro do Brasil na era Tite, com 16 gols marcados, ele passou em branco nos cinco jogos da Copa de 2018 e ainda não balançou as redes em quatro jogos nesta Copa América. Na goleada por 5 a 0 sobre o Peru, duelo em que virou titular no lugar de Richarlison, ficou abatido ao perder um pênalti e motivou Thiago Silva a chamá-lo para uma conversa.
- Contra o Peru ele fez uma partida extraordinária, só faltou o gol. Após a perda do pênalti, ele ficou muito abalado, queria muito marcar. Ele sabia que tinha feito um grande jogo, mas o fato de ter perdido o pênalti o deixou um pouco para baixo. No vestiário, sentei do lado dele e falei que o futuro a Deus pertence, que de repente ele poderia resolver o jogo seguinte. Contra o Paraguai, no pênaltis, a última cobrança caiu nos pés dele. Antes de a gente fazer aquela corrente ali no meio de campo, falei para ele que ele iria decidir. Vou ser bem sincero: eu não tinha certeza, mas a fé fez com que eu desse esse recado para ele. Quando ele fez o gol, na minha cabeça era só ajoelhar e agradecer a Deus por ter honrado a ele pelo trabalho que fez e à equipe pelo que fez nesse confronto - disse o zagueiro.
Outra marca negativa que o garoto tentará espantar é a de não fazer gols em clássicos. Ele saiu do Palmeiras sem marcar contra Corinthians, Santos ou São Paulo, ainda não conseguiu vazar o Manchester United atuando pelo City e, em três jogos contra a Argentina pela Seleção, também não marcou. Não significa, porém, que não tenha jogado bem. Em novembro de 2016, também no Mineirão e contra a Argentina, pelas Eliminatórias, teve ótimo desempenho na vitória por 3 a 0 da Seleção Brasileira. Marcelo Oliveira acredita que o histórico no estádio pode fazê-lo jogar mais à vontade.
- Esse lado emocional pode ser uma força a mais. Voltar para o estádio em que virou titular, fez dois gols e jogadas maravilhosas... Ele tem a cabeça excelente, é um menino de família simples, tem perseverança, a gente olha para ele e nunca o vê triste, abatido, sempre o vê para cima, tentando treinar mais. Eu conversava muito com ele sobre o pé esquerdo, que ele usava pouco, às vezes puxava para o meio para chutar quando podia definir mais rápido. E ele entendia, pedia para trabalhar mais depois do treino. Vou torcer muito para dê certo, pois tenho amizade com o Tite, e que o Jesus se dê muito bem - conta Marcelo, que perdeu o contato com o jovem, mas lembra com carinho do que viveu ao lado dele.
- Eu tenho um cunhado que é médico no Sírio e trata crianças com câncer. Quando eu estava no Palmeiras, ele estava cuidando de um menino palmeirense que gostava muito do Gabriel. O Gabriel se dispôs a ir lá visitar o menino, que ficou super feliz e até melhorou. Isso marcou a gente, meu cunhado sempre fala disso. Quando o Manchester City estava querendo contratar o Gabriel, o Ziza, que jogou comigo e tem relação com o Guardiola, me ligou perguntando do Gabriel porque queria passar mais informações. O Tite também me ligou, perguntou muito sobre ele antes de chamá-lo para a Seleção, sobre características, aspectos pessoais... O Gabriel tem uma coisa especial, que é a coragem. Ele vem do futebol de várzea, desde pequeno está acostumado a levar pancada, cair e levantar. Ele não tem medo de disputar bola no alto. Tenho uma expectativa grande, acho que ele pode ser decisivo nesse jogo.