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Micale ao L!: ‘Não tenho segurança. Tenho que ganhar para permanecer’

Técnico campeão olímpico diz que projeto da CBF é que ele fique pelo menos até 2020, mas tem ciência de que resultado é que segura emprego

Rogerio Micale - Coletiva Seleção Brasileira (Foto: Lucas Figueiredo/Mowa Press)
imagem camera (Foto: Lucas Figueiredo/Mowa Press)
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Lance!
Rio de Janeiro (RJ)
Dia 14/10/2016
17:44
Atualizado em 15/10/2016
07:40

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- Não tenho segurança na CBF. Eu tenho que ganhar para permanecer.

Nem parece a frase de um técnico que há cerca de dois meses conduziu o Brasil à conquista da inédita medalha de ouro. Mas Rogério Micale, que se sente mais valorizado, ao mesmo tempo sabe que a vida de treinador de futebol é dinâmica. Mesmo subindo de patamar e de salário dentro da CBF, ele tem uma cobrança própria e a leitura do mercado: a continuidade está atrelada aos bons resultados. Isso mesmo ouvindo de Marco Polo Del Nero que a ideia é ter, pelo menos, mais um ciclo olímpico para trabalhar.

Micale, que concedeu entrevista exclusiva ao LANCE!, já está em busca de mais sucesso. Atualmente no Chile com a Seleção sub-20, ele prepara o time para a disputa do Sul-Americano da categoria, no Equador, em janeiro, que é classificatório para o Mundial, na Coreia do Sul.

O que mudou do Rogério Micale depois da Rio-2016?
É um marco na minha história, porque saio de uma situação de treinador de base, com uma situação confortável de trabalho, poucas cobranças - existe a cobrança, mas nada comparado ao que aconteceu. Viver tudo aquilo, da forma que foi, com um início de treinos bacana, onde as pessoas compraram a ideia, depois os resultados não vieram, e aí as criticas foram pesadas. Com a conquista, veio o reconhecimento do trabalho, principalmente pelas pessoas na rua. Isso nos dá a segurança que fizemos algo de bom. Foi um divisor de águas na minha vida.

Você se sente mais valorizado?
Muito mais valorizado. Até porque é inevitável. É um título que o Brasil não tinha. No aspecto pessoal, foi algo que eu nem imaginava que poderia disputar. Depois de conquistar isso, sendo que tantos técnicos importantes do futebol não conseguiram. É realmente muito importante.

O que Marco Polo Del Nero te falou depois da conquista?
O presidente agradeceu. Eu agradeci pela oportunidade. Ele falou que gostaria que eu permanecesse na casa. Ele fez de tudo para que o projeto se mantivesse. Me sinto valorizado por isso.

Ganhou aumento?
É inevitável, né? (risos)

Em algum momento chegou a pensar que não ganharia o ouro?
Eu era muito confiante com o grupo. Os dois resultados que aconteceram nos deixaram decepcionados, mas em nenhum momento me tiraram o que eu sentia em relação a eles. Eles assimilaram bem as ideias, estavam se dedicando. Os números dos dois jogos nos mostraram que fizemos boas partidas. Infelizmente a bola acabou não entrando, o que gerou toda a situação em termos de cobranças. Trazíamos um peso de outros fatores, além dos dois empates. Isso gerava uma decepção pelo resultado, mas a confiança existiu a todo momento.

Mas e se não desse...
Existe o preparo da pessoa para se as coisas não derem certo. Eu sei como as coisas funcionam no Brasil. Sei que, se não ganhar, simplesmente é execrado. O Felipão foi campeão do mundo, mas perdeu da forma que perdeu... Está na China. Se voltar para o Brasil, a impressão é que o título que ele ganhou não vale nada. Nós somos assim, né. Muito cruéis com o nosso meio futebolístico. Somos muito radicais em emitir opinião. Ela fica fundamentada só em cima do resultado. Não se olha o contexto do resultado.

Acha que pesou a seu favor o fato de tentar não só vencer, mas também jogar bem?
Nossa proposta era ganhar a medalha, mas não de qualquer jeito. Queríamos praticar um futebol com a nossa cara, com as nossas origens. Um futebol bem jogado, dominante. Tivemos dificuldades, mas executamos esse trabalho. Era uma proposta clara desde o início da preparação. Trabalhamos insistentemente na Granja. Executamos isso. Não deu certo em algum momento. E aí mudamos para os quatro atacantes. Aconteceu. Espero que isso seja um legado maior que a medalha em si. Olhar para as origens, para a identidade do futebol brasileiro. .

Chegou a ler/ver o que escreviam ou falavam sobre você durante os Jogos? Teve uma da Veja: "Micale: ótimo em entrevistas, cambaleante no banco"...
Eu sei agora... Eu tento entender os fenômenos que envolvem o futebol. No momento, não podemos ir atrás das notícias. Tínhamos muita coisa que envolvia o jogo em si. Colher informações do adversário, ver os erros, conversar individualmente com os atletas, avaliar o jogo seguinte... Não tínhamos tempo. Agora eu tenho. Eu pesquisei. E vi. A gente ri, não guardo mágoa. Mas vemos muita bobagem. Isso me preocupa. Algumas coisas são totalmente infundadas. Plantam coisas que não existiram. E vira uma verdade absoluta.

Por exemplo?
Eu vi coisas... Dizendo que os jogadores se reuniram, porque as coisas não estava funcionando... De onde ele tirou isso? A maioria é muito séria. Mas o engraçado da imprensa é o seguinte: É como você vai no alto da montanha, pega um travesseiro da pena de ganso e rasga. Aí as penas voam. De repente, fala que se arrependeu. Mas você nunca vai recolher todas as penas. A notícia irresponsável é dessa forma. Vai fazer uma correção? Mas quem leu a primeira não volta pra ler de novo. Tenho que me preparar pessoalmente porque foi a primeira experiência em grande evento. Você se depara com situações que não está acostumado.

E também sobre a atuação do Tite no time?
Não só sobre o Tite. Ele é um caso à parte. Ele realmente contribuiu com o meu trabalho. Só a presença dele no local, dias de jogos, almoçando... Mas ele nunca deu uma palavra para o jogador, nunca se expressou, interferiu em palestra. Não é da índole dele. Ele é extremamente ético, sabe se posicionar, entende o que é ser treinador e não interfere em nada, porque não gostaria que acontecesse da mesma forma com ele. Nosso trabalho junto foi um fortalecer o outro, falar os nossos medos.

"Meu intuito é sair para ser treinador. Aproveitando, vou estudar. Existem sondagens, situações da China, da Arábia Saudita, Qatar, Japão. Não posso ser hipócrita. Eu ainda não sou um cara realizado financeiramente".

Teve proposta de outros clubes?
Sim. Não seria ético da minha parte falar, porque já há profissionais trabalhando.

Por que não aceitou?
Tenho um sonho pessoal que é trabalhar fora do país. Vou realizar, se Deus permitir. Até como melhoria pessoal. Tenho esse projeto. E também dentro da CBF, excepcional, excelente. O presidente deu totais condições para executá-lo. Estou com um grupo de trabalho que é o melhor do Brasil. Ficando na CBF, estou respaldado. Tenho um projeto de no mínimo quatro anos. Se não for para fazer isso, seria fora do país.

Você tem a garantia de que estará em Tóquio-2020?
Tenho essa conversa de ir até Tóquio. Não tenho contrato aqui, porque é carteira assinada. Eles podem me mandar embora a qualquer momento. De repente, amanhã muda de ideia. É muito difícil. Vemos no Brasil que há uma segurança. Não tenho segurança na CBF. Eu tenho que ganhar para permanecer. Se você tem como escolher a melhor forma de fazer um trabalho, por que não? Hoje, a CBF fornece a melhor condição para fazer o trabalho.

Acha que a medalha vai te ajudar a sair do Brasil?
A medalha deu uma projeção. Ela veio confirmar algo que internacionalmente existe. Fui vice-campeão mundial, medalhista no Pan, fiquei entre os 25 melhores treinadores da Fifa. Internacionalmente, o nome acaba sendo mais forte do que dentro do país. Meu intuito é sair para ser treinador. Aproveitando, vou estudar. Existem sondagens, situações da China, da Arábia Saudita, Qatar, Japão. Se vier uma coisa que me possibilite avanço pessoal em estudo, financeiro... Não posso ser hipócrita. Eu ainda não sou um cara realizado financeiramente. Eu vim da base. Não tenho vergonha de falar isso, porque venho galgando degraus. Ganhava um salário mínimo no início. Estou atingindo o nível maduro com trabalho. Não passei por cima de ninguém.

Mas você sairia antes de Tóquio?
Depende. Tudo depende. Existe uma situação muito importante na casa. Teria que ser algo "avassalador".

O que projeta para o Sul-Americano e, classificando, o Mundial?
Sul-Americano é sempre muito difícil. Nossas eliminatórias estão aí. Na base, é mais complexo ainda. É um período difícil. .Estou fazendo visita aos clubes, conversando com treinadores. É quando acaba o campeonato nacional, jogadores que forem convocados não vão ter férias... Vamos fazer de uma forma para irmos bem, buscarmos a classificação e o título mundial, que nos escapou dois anos atrás.

A integração com a Seleção principal aumentou de um técnico para outro?
Tínhamos uma integração antes, por mais que não fosse divulgada. Eu fazia a olímpica junto com o Dunga. Tudo era conversado. Era integração tão boa quanto é hoje. São pessoas diferentes, mas a integração tinha. Seria injusto da minha parte dizer que não.

Qual a diferença de Dunga para Tite?
São duas pessoas que contribuem demais para o futebol. Cada um com sua forma de ver futebol, com sua característica. Dunga é um cara honesto, leal com os que estão com ele. É batalhador, passou e passa por muitas coisas. Ele tentou fazer o melhor. Já o Tite, estou convivendo há poucos dias com ele ainda. Mas é um cara do bem, extremamente profissional. Nos encontramos no corredor e já surge um assinto, um time que jogou de determinada forma, um jogador... Vivemos futebol.

"Às vezes nos deixamos levar por notícias. E aí você vai armado. Mas o Neymar é muito gentil, um cara do bem".

Lidar com o Neymar foi mais fácil do que você esperava?
Foi muito mais fácil. Porque às vezes nos deixamos levar por notícias. E aí você vai armado. Mas o Neymar é muito gentil, um cara do bem. Não estou falando porque é o Neymar. É Rodrigo Caio, Marquinhos, Renato Augusto... o grupo todo. É um cara que é astro, te abraça, sorri, é gentil. Ele me presenteou com a chuteira da final. Conversamos de vez em quando. Foi muito melhor do que eu imaginava.

Você já chegou a defender a criação de torneios sub-19 na Conmebol... Como está essa conversa?
Estamos tentando, porque é uma mudança. O presidente está atento. Assim como estamos vendo uma lacuna no futebol brasileiro, que é o sub-23. É para que não interrompa o processo formativo no sub-20. Fica um vazio no processo final formativo, Com 20 anos, não tem a formação final do atleta. Gabriel Jesus é exceção. Olha o Kaká. Todo mundo conhece a história. Era reserva. Quantos Kakás nós não perdemos no futebol brasileiro?

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