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Especialistas veem decisão do TAS em tirar pena do City como risco ao fair-play financeiro

Mistério em torno da reversão da suspensão dos Citizens por irregularidades, dúvidas sobre investigação da Uefa e dos modelos de gestão e alerta são postos em pauta

Manchester City x Liverpool - Comemoração
Fair-play financeiro foi posto em xeque com a mudança do Tribunal (Foto: LAURENCE GRIFFITHS / POOL / AFP)

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A decisão do Tribunal Arbitral do Esporte (TAS) de reverter a punição imposta ao Manchester City colocou sob desconfiança a credibilidade a maneira como é avaliado o fair-play financeiro. Especialistas em finanças apontam que há muitas coisas a serem desvendadas em torno da atitude da instância máxima de justiça esportiva, que se opôs à medida da Uefa de banir o clube inglês por duas edições da Liga dos Campeões, além de impor uma multa de 30 milhões de euros (por volta de R$ 180 milhões).

Ao LANCE!, o consultor de gestão de finanças do esporte Cesar Grafietti apontou que ainda há muito a ser esclarecido em torno do que levou o TAS a bater o martelo. A instância máxima de justiça do esporte deu aval para os Citizens não só disputarem competições continentais, como também reduziu a multa para 10 milhões de euros (por volta R$ 60 milhões).  

- Este é um tema ainda a ser desvendado. Acho prematuro analisar apenas a partir do press release que o TAS divulgou. Será preciso ver a decisão completa, pois no press release há mais interrogações que respostas. Por exemplo, falam em "prescrição" e "falta de provas", ao mesmo tempo em que confirmam que o clube não colaborou - e em seguida detalhou: 

- A Uefa só reabriu o caso a partir das denúncias do "Football Leaks" (revelação de transações financeiras obscuras). Mas a documentação que ela tinha em mãos era apenas o que foi vazado pela imprensa. Como tentou obter mais dados junto ao clube e não obteve sucesso, o prazo expirou. Logo, aqui temos dois aspectos importantes: falta de documentação comprobatória e prazo expirado, por conta da má vontade do clube, que foi punido pela falta de colaboração - complementou.

Grafietti acredita que o caso do City pode ser um divisor de águas para a Uefa mudar sua maneira de avaliar o fair-play financeiro.

- O que me parece depois de ler e acompanhar várias fontes, é que a Uefa fez o que precisava ser feito, mas de forma menos eficiente do que deveria. No final, minha sensação é de que a entidade aproveitará o caso para apertar mais os controles e mudar os procedimentos - declarou.

Em seguida, o economista avaliou que a decisão pode trazer consequências negativas para a equipe inglesa.

- Se o Tribunal confirmar em sua decisão que a absolvição veio por questões técnicas (prescrição e documentos obtidos por vazamento) e que não pode analisar mais porque o clube não colaborou, então é possível que esta sensação de que a Uefa "perdeu" possa se virar contra o City, que passaria a ser tratado como um clube que não respeita as regras - disse.

Cesar Grafietti apontou que a íntegra do documento tende a esclarecer a decisão do Tribunal Arbitral do Esporte. 

- Por isso é importante esperarmos a documentação completa. Por ora, todos saem perdendo: Uefa, porque precisa reformular o processo e tornar as regras mais ágeis e o City, porque foi absolvido por tecnicalidades - frisou.

O economista apontou os desafios que o fair-play financeiro tende a ter a partir desta decisão.

- O fair-play financeiro nasceu como forma de levar os clubes ao equilíbrio, mas com o tempo adicionou a ideia de evitar investimentos sem lastro. Precisa formalizar esta ideia e tornar as regras mais claras e rígidas, e os procedimentos mais ágeis - e, em seguida, afirmou:

- A situação vai indicar que havia um problema e que não foi analisado porque o clube não se prontificou a colaborar. Então jogará luz ao processo e às regras de divulgação de informações. Com isso a Uefa pode mudar o modelo e reforçar o regulamento, além de dar mais independência ao órgão de análise - completou.

Consultor de marketing e gestão financeira, Amir Somoggi faz severas críticas á decisão do Tribunal Arbitral do Esporte (TAS). Ele é categórico sobre a reversão da pena.

- O fair-play financeiro morreu com a não punição. O caminho era partir também para o PSG, que faz algo mais grave, pois manipula ainda mais as contas, com números mais inflados. O fair-play financeiro teve uma grande derrota. É muito fácil punir um time de menor expressão internacional, mas ir para cima de um clube que injetou 1,5 bilhão de euros (por volta R$ 9 bilhões) só em contratações e equilibra as contas com patrocínio? Todos sabem que são pessoas próximas a sheiks árabes. Na verdade, este fair-play não está punindo pessoas que burlam de tal forma as contas dos clubes - declarou. 

Os documentos vazados mostravam que o proprietário do City, Sheik Mansour bin Zayed Al Nahyan, estava financiando o patrocínio de 67,5 milhões de libras (cerca de R$ 380 milhões) da camisa, estádio e as divisões de base por meio da companhia aérea de seu país, Etihad.

O proprietário da empresa Sports Value também alerta para imagem deixada no City.

- Estes grandes proprietários estão livres, vão comprar mais um clube. A integridade passa ao largo destes magnatas que compram tudo, menos a dignidade. Todo mundo vai se lembrar do modelo de gestão na qual donos injetaram do bolso para não "quebrarem" - afirmou.

Somoggi não vê um caminho para que haja correção no fair-play financeiro.

- Quando o Milan foi punido, até pensei nisso. Mas analisei a fundo e o clube italiano perdeu força no futebol europeu, tem a vigésima folha salarial da Europa, vai ter de se reconstruir completamente. Os magnatas, por sua vez, mandam e se desmandam. O dono do PSG se impõe no Campeonato Francês. O Qatar é dono da próxima Copa. Os ditadores por trás destes negócios estão investindo para serem donos do futebol - disse.

O especialista apontou como o fair-play financeiro poderia evitar dribles na gestão financeira.

- Seria um golpe nesta conduta do futebol. O City iria se adequar a uma nova realidade de patrocínios, mas agora está livre para inflar os valores de suas contas com empresas que claramente não têm o rendimento divulgado ou os seus donos injetam nos clubes. Perde-se um trabalho maravilhoso de fair-play financeiro. A Juventus faz patrocínios inflados para que a gestão da família aja como o dono quer. Acaba que os clubes com poder político, casos de PSG e City ganhem tanta força nos bastidores, a ponto de superarem um Bayern de Munique, um Real Madrid, por exemplo... - constatou.

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