Tua fama assim se fez! Há 45 anos, Vasco vencia seu primeiro Brasileiro

Artilheiro do Brasileiro de 1974, Roberto Dinamite detalha ao LANCE! a trajetória até a conquista nacional e é taxativo: 'Um time determinado, que soube se fortalecer na decisão'

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A imensa torcida vascaína teve um motivo a mais para ficar feliz no dia 1º de agosto de 1974. Os gols de Ademir e Jorginho Carvoeiro selavam a vitória por 2 a 1 do Cruz-Maltino sobre o Cruzeiro (que marcou em belo gol de Nelinho) e conduziam a caravela ao título brasileiro, em acirrado jogo extra no Maracanã. Um dos heróis da saga da equipe comandada por Mário Travaglini, Roberto Dinamite aponta, depois de 45 anos, o que simbolizou aquela conquista:

- Era um time formado basicamente por jogadores bastante experientes, determinados. Nós entendíamos que o Cruzeiro era superior tecnicamente, que tinha condições de nos vencer. Só que, quando fomos para a decisão, o Vasco cresceu, soube ter garra - disse, ao LANCE!.

'Um time formado basicamente por jogadores determinados, experientes', lembra Roberto Dinamite


O atacante, aos poucos, foi mostrando seu poderio ofensivo, abrindo caminho para a vitória por 2 a 0 sobre o Coritiba (Luís Carlos "Tatu" marcou o segundo gol). Em seguida, marcou no empate em 1 a 1 com o Flamengo e na vitória por 2 a 1 sobre o Remo, no início da primeira fase.

Contudo, a seca de vitórias quase deu dores de cabeça ao Cruz-Maltino: vieram quatro empates consecutivos em 0 a 0 (diante de Paysandu, Botafogo, Bahia e Vitória) e uma derrota por 2 a 1 para o  Fluminense. Mas, entre altos e baixos, os comandados de Mário Travaglini se classificaram na sétima colocação:

- Acho que a crescente veio no momento certo. Mário era quase um psicólogo, sabia o que tirar de cada jogador e aceitava opiniões dos outros. Isto foi fundamental para a gente melhorar em campo.

Roberto Dinamite vê um mérito na postura da equipe:

- Vou ser sincero, a gente não teve nunca aquele momento no qual pode dizer que foi fundamental. Nunca nos colocamos favoritos. Fizemos com que o time chegasse, aos poucos, até a fase final.   

DA 'PROTEÇÃO' AOS CONSELHOS: A ROTINA DO ARTILHEIRO DINAMITE

'Eu era muito marcado de perto', diz Dinamite (Reprodução)

Três anos após ter recebido o apelido de "Dinamite", Roberto viu, aos poucos, sua consolidação como goleador saltar aos olhos de um país. À época com 20 anos, o atacante disse que a experiência dos colegas contribuiu para tirá-lo de situações polêmicas:

- Quando comecei a fazer gols, fiquei mais visado pelos adversários. Era muito marcado de perto. Lembro que, em um jogo no Nordeste, um zagueiro me deu uma pancada, eu me protegi, mas bateu no peito do cara e ele caiu. Quando vi, foram cercar o árbitro para pedir minha expulsão. E foi legal porque o time do Vasco fez uma roda e me protegeu - e completou:

- Carrego comigo esta gratidão, da convivência com caras como Fidélis, Moisés, Alcir, Jorginho Carvoeiro, Luís Carlos... 

Andrada deu 'conselho' a artilheiro sobre cobranças de falta


Dinamite também recorda-se de alguns conselhos que recebeu de Andrada. O goleiro (que também ficou marcado por sofrer o milésimo gol de Pelé) foi decisivo para ajudar seu jovem colega a estender seu repertório em cobranças de falta:

- Andrada era um baita goleiro, né? Durante um treino, ele me chamou e disse: "o cobrador sempre tenta chutar a bola por cima da barreira. Faz o contrário! Pega no contrapé". Comecei a bater falta no canto do goleiro, e ele estava certo. Na hora em que eles faziam o movimento e iam para o outro lado, eu atrapalhava eles.

A rotina de treinos contava com a presença de um defensor que, em sua rotina como técnico, passou a ser valorizado pelos quatro grandes do Brasil:

- O Joel (Santana) me ajudou neste início. Ele estava entre os reservas, tentava me parar nos treinos. E, aos poucos, fui me firmando na jogada de sair da esquerda para a direita.

A FASE FINAL DESAFIADORA E AS GRANDES LEMBRANÇAS

'Artilharia foi acontecendo naturalmente' (Reprodução)

Não faltam lembranças a Roberto Dinamite ao falar sobre seus antigos companheiros do Cruz-Maltino. O ex-jogador acredita que a equipe soube encontrar seu rumo com o decorrer do Brasileirão:

- Tinha o Ademir, um jogador tecnicamente refinado, o Luís Carlos, um jogador de luta, o Alcir, excelente na antecipação... Além disto, o Zanata era uma cabeça pensante, e o Jorginho (Carvoeiro) que era muito veloz. Este time foi se "encaixando".  

Ao recordar sobre os 16 gols que o conduziram ao posto de artilheiro daquela edição, Roberto Dinamite mostra-se humilde:

- Acho que foi acontecendo naturalmente, dentro da regularidade que o Vasco mostrou. E contribuiu para que eu me tornasse o maior artilheiro do Brasileiro por tanto tempo da competição (Roberto tem, no total, 190 gols em edições na competição nacional).

'Sabíamos que pegaríamos times superiores ao Vasco tecnicamente. Mas nos restava ir para cima'


Após ter passado pela segunda fase na liderança do Grupo 2, o Vasco encarou uma fase final bastante acirrada. A equipe faria um quadrangular com Santos, Internacional e Cruzeiro.

- A gente sabia que estes times eram superiores ao Vasco. Mas só nos restava ir para cima e não podíamos , em momento algum, deixar de fugir da raia. E fomos assim, na base da raça. Além disto, dificilmente tínhamos problemas de contusão.

O primeiro duelo já enervou os ânimos dos vascaínos, pois do outro lado estava o Santos de Pelé. Luís Carlos abriu o placar para o Cruz-Maltino e, depois, o "Rei" empatou ao cobrar falta. Porém, coube a Roberto Dinamite decretar o 2 a 1 e a alegria da torcida no Maracanã:

- É bem diferente você jogar no mesmo gramado que o Pelé. Uma coisa que não tem preço. Além deste jogo, no qual a gente ganhou e foi importantíssimo, tenho uma passagem anterior, na qual marquei contra o Santos e eu, ao passar por ele depois do gol, ouvi do Pelé um "parabéns, garoto, que você tenha muita sorte!".

Na rodada seguinte, no Mineirão, o Vasco arrancaria o empate em 1 a 1 com o Cruzeiro (com Zé Carlos marcando para os cruzeirenses e Alfinete anotando o gol vascaíno). O duelo seria marcado por um incidente: queixando-se da não marcação de um pênalti, o dirigente Carmine Furletti invadiu o gramado e tentou agredir o árbitro Sebastião Rufino.

A volta cruz-maltina ao Maracanã foi repleta de otimismo no duelo com o Internacional. Logo aos quatro minutos, Roberto Dinamite abriu o placar, aproveitando falha de Manga. Zanata ampliou a vantagem, que deixaria o Vasco na liderança e com o título. No entanto, o Colorado, que ainda tinha nomes como Falcão, Carpegiani e Valdomiro, empatou em 2 a 2, com gols de Lula e Escurinho.

- Não dá para dizer que foi relaxamento nosso. O Inter tinha uma grande equipe, com jogadores de qualidade. Nós batalhamos ao máximo.

UM JOGO EXTRA E FORTES EMOÇÕES

'Foi um jogo muito acirrado' (Divulgação)

Empatados em números de pontos, Cruzeiro e Vasco inicialmente decidiriam a final no Mineirão. No entanto, amparando-se no Artigo 59 do regulamento (que previa a inversão de três mandos de campo para equipes que cometessem incidentes como em seus domínios, como a invasão de Carmino Furletti), o então presidente Agathyrno da Silva Gomes conseguiu que a partida fosse realizada em solo carioca, o que não tirou a tensão da partida.

- Foi um jogo muito acirrado. No qual a gente teve de se doar muito. A gente sabia da equipe que teria de encarar. O Cruzeiro tinha o Palhinha, o Nelinho, o Perfumo, jogadores muito fortes, muito talentosos. Foram 90 minutos de muita intensidade. 

Aos 14 minutos, Fidélis arriscou após falta cobrada por Zanata. Após desvio em Darci, Ademir abriu o placar para o Vasco.

- A visão de jogo que o Ademir teve foi importantíssima neste gol. Soube se antecipar muito bem.

'O Alcir nunca tinha dado um lançamento e achou com precisão o Jorginho', lembra Dinamite, sobre gol do título

Ainda na etapa inicial, Jorginho Carvoeiro estufou a rede mais uma vez, mas o gol foi anulado por impedimento. Na volta do intervalo, Nelinho encheu o pé e empatou para a equipe celeste.


Porém, aos 36, Carvoeiro recebeu lançamento e, após dividida com Vitor, finalizou para o gol vazio:

- Foi um gol da maneira que a gente não esperava. O Alcir nunca tinha lançado uma bola. Ele encontrou com precisão o Jorginho, que aproveitou a velocidade dele para ganhar a dividida com o Vitor e fazer o gol da vitória - diz Roberto Dinamite. 

O jogo ainda rendeu outra dose de polêmica: um gol de Zé Carlos anulado por falta de Nelinho.

Passados 45 anos da conquista, o artilheiro do Brasileirão de 1974 aponta a lição que fica da equipe que levou o Vasco a seu primeiro feito nacional:

- De que a vontade de superação, o trabalho têm de prevalecer. A equipe, por mais que não seja cotada como favorita, quando se encaixa, pode se firmar e atingir seus objetivos. É um grande exemplo para o atual Vasco, inclusive.

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