Vítima de injúria racial, Miranda exalta manifestações: ‘Estamos num caminho de lutar pelos direitos’
No final do ano passado, zagueiro do Vasco sofreu e denunciou, ainda em campo, injúria racial. Para o defensor de 20 anos, o mundo está mudando, mas ainda longe do ideal
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As manifestações por democracia plena e contra racismo, vistas nos últimos dias em grande escala no Brasil, nos Estados Unidos e em outros países, são ecos de assassinatos. Nos EUA, George Floyd. Em São Gonçalo (RJ), João Pedro. Os homicídios destes e de muitos outros negros são, diferentes vezes, reflexo do que pensam e fazem as sociedades em que o racismo se faz em mil escalas. Numa dessas escalas, Miranda, zagueiro do Vasco, foi vítima de injúria em dezembro do ano passado. Em campo, virou símbolo da luta. Ao LANCE!, ele lembra aquela situação e exalta as multidões que, hoje, estão nas ruas.
- Acho que as coisas tem muito a melhorar. Estamos num caminho de lutar pelos direitos. Não é só pelo George Floyd, teve o João Pedro também. A população está nas redes sociais, mas está na rua também, lutando para ter direitos - ressaltou.
Como você tem visto esse momento de protestos aqui no Brasil e nos EUA?
É um momento muito bom. Está fazendo as pessoas repensarem atos de injúria racial, as vidas inocentes mortas. As pessoas estão indo para a rua lutar. estou gostando bastante. Estou lendo bastante, acompanhando.
Você chegou a ir em algum protesto? Pretende?
Não, não. Tive amigos chamando, mas, pelo coronavírus, não foi. Mas entendo quem está indo e apoio.
O caso que você sofreu no Rio Grande do Sul teve desdobramento?
Acabou que, no dia seguinte, eles (delegação do Independiente-ARG) foram embora muito rápido. Como a delegacia estava fechada depois do jogo, eu falei com o Brazil (Carlos Brazil, gerente de futebol da base do Vasco) e fui bem cedo. Chegando lá, dei meu depoimento, o delegado disse que iam prosseguir, mas, quando foram procurar já tinham ido. Seria um processo longo. Relatei a injuria, mas o delegado me explicou: "Entendo, vou prosseguir, mas você sabe que tem que mandar para a Argentina, mandar para o clube, depois tomar as devidas atitudes para, depois, voltar para o Brasil." Aí eu disse que tudo bem. Fiz a minha parte.
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Você acha que será a última vez que sofre um caso desses?
Creio eu que não. Não foi a primeira vez que um argentino faz isso. Creio que, para frente, tenho que ter cabeça no lugar. Tenho que saber meu lugar, meus direitos.
Foi a primeira vez que você sofreu um caso do tipo em campo?
No futebol, creio que sim. Fora do futebol, não.
Como foi essa fora do campo?
Fora várias vezes... fui seguido no shopping, minha namorada até se assustou. Numa livraria também, um segurança veio atrás de mim, ela me falou e eu disse: "Não é a primeira vez". Em outras lojas, atendem mal ou não fazem questão de atender achando que não vai ter dinheiro para comprar. Ainda estamos muito longe, falta muito ainda para que tudo fique certo e todos sermos iguais de verdade.
Tem gente que utiliza desse racismo em campo como forma de tentar desestabilizar emocionalmente o adversário. Vale tudo em campo?
Não, lógico que não. Isso vai muito além da rivalidade no campo. Vai do ser humano, da atitude. Desestabilizar é uma coisa, pode ser de várias formas, mas preconceito é fora da realidade.
Você não é o único jogador do Vasco, principalmente da base, que demonstra consciência social, até na internet. Vocês costumam conversar sobre?
A gente conversa, sim. A categoria 1999/2000 conversa mais. Na base, num ano longo, juntos, conversamos muito sobre essas questões. Temos um grupo no Whatsapp em que, às vezes, o assunto é esse. Não estudei só no Colégio do Vasco, mas lá também falávamos muito. Aprendemos que não é por ser jogador que vai ser diferente sempre. Aprendemos, no colégio, como as coisas são na realidade.
Qual o seu sentimento sobre os casos de racismo no futebol: as coisas, no campo, estão mudando?
Algumas coisas, sim. Vai bastante da criação de país, de onde veio. Mas para desestabilizar um jogador não precisa chegar a esse ponto. Há outras formas. Mas preconceito, cometer um ato que não é legal foge totalmente da realidade. Passa do limite. Não precisa falar coisas que afetam cor da pele, gênero... vai muito além.
O que é preciso para o mundo melhorar?
O que está rolando hoje em dia, ir para a rua, lutar por direitos. Depois de muito tempo estão falando, filmando. Estão reunidos, mesmo na crise (sanitária), indo para a luta porque é correto fazer isso: lutar pelos seus direitos. É o caminho correto.
'As pessoas têm que entender o que significa o que elas estão lutando'
Muita gente vem se dizendo antifascista e antirrascista nos últimos dias. O que você espera dessas pessoas: o que é ser antirrascista e antifascista?
As pessoas têm que entender o que significa o que elas estão lutando. Estudar, ler, dialogar. Violência também não é a maneira correta, senão daqui a pouco vira uma ditadura. Pessoas de esquerda eram agressivas, pessoas de direita eram agressivas. Tem que aprender o que é o antifascimo e o antirrascismo. Tem que entender, ler sobre o assunto.
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