Luiz Gomes: ‘As lições que Jorge Jesus deixa dentro e fora do campo’
'Nos 13 meses em que comandou o Flamengo, Jorge Jesus trouxe de volta a alegria de quem gosta de ver um futebol bem jogado'
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A curta e vencedora era Jorge Jesus chegou ao fim. Para a torcida rubro-negra, o anúncio da saída do treinador de volta ao Benfica soou como a perda de um título. Mas, além dos números invejáveis, a passagem do técnico português pelo Flamengo deixa outras marcas que, se forem absorvidas por aqui, podem contribuir para melhorar significativamente o futebol brasileiro. Não apenas sob o ponto de vista técnico e tático, dos treinamentos, da bola rolando, mas também fora do campo.
Nos 13 meses em que comandou o Flamengo, Jesus trouxe de volta a alegria de quem gosta de ver um futebol bem jogado. Montou um time que atua 90 minutos focado em buscar o gol, marca sobre pressão sufocando o adversário, valoriza o toque de bola, a troca de passes, abomina a ligação direta e o chutão para frente. Conceitos simples, mas que andavam – e continuam – bastante raros por aqui. Podia-se contestar nele o que se quisesse, muitas vezes foi chamado de arrogante, mas sua competência é indiscutível.
Só para contextualizar, vale lembrar o resultado disso tudo: foram 43 vitórias, dez empates e apenas quatro derrotas. O Flamengo do Mister conquistou o Brasileirão, batendo recordes, e a Libertadores do ano passado; a Supercopa do Brasil, a Recopa Sul-Americana e a Taça Guanabara, já em 2020, antes da pandemia para o futebol, e o Campeonato Carioca, capítulo final da história, quarta-feira passada. No Catar, devolveu o equilíbrio a uma final de Mundial de Clubes da Fifa, enfrentando de igual para igual o poderoso Liverpool, um reconhecimento que nem a derrota apagou.
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Os críticos – poucos, é verdade – argumentam que com o material que tinha em mãos, um elenco diferenciado, recheado de craques com talento e experiência internacional, em times da Europa, qualquer um faria o que Jesus fez. Uma tremenda bobagem, comentário que apenas revela a fraqueza de quem foge da discussão verdadeira e construtiva para se apegar a argumentos simplistas na falta de outros.
Jesus não fez sucesso apenas pela qualidade do elenco. Fez por seus méritos, por estudar o futebol, manter-se atualizado e em evolução apenas de seus 65 anos de vida. Uma de suas virtudes, inclusive, foi saber administrar um grupo recheado de estrelas, aproveitando a qualidade de cada um, respeitando a individualidade e acomodando egos de quem estava na reserva, mantendo uma harmonia poucas vezes vista em situações como essa. E erra quem confundir isso com paternalismo e corporativismo. É, tão somente, competência profissional. E aqui, começam as marcas, pequenas lições da passagem de JJ fora de campo.
O estilo general-de-brigada, tão cultivado por boa parte dos técnicos brasileiros, definitivamente foi desmoralizado pela relação estabelecida pelo Mister no Flamengo. Seja com o time, com os funcionários, com o torcedor. E isso gerou incômodos, desde o começo. Foi, certamente, um dos elementos a alimentar o discurso, este sim, corporativista e nacionalista, que resistia em aceitar o sucesso de um treinador estrangeiro. A reação de Luxemburgo, comentando uma suposta tolerância da mídia com a saída de Jesus com o contrato em vigência, é reveladora da intolerância enfrentada pelo português.
O sucesso do Mister não significa contudo, muito longe disso, o fracasso dos treinadores brasileiros. Sempre haverá por aqui os bons e os ruins. Como em Portugal, na Inglaterra ou qualquer outro lugar do mundo. Essa é a lição número dois que fica: essa comparação é inútil. Não há espaço nem para uma reserva de mercado nem para a aceitação de um treinador apenas pela origem do seu passaporte. Muitos gringos já passaram por aqui e vários fracassaram, vale lembrar.
O que há, na verdade, como foi com Jorge Jesus, e como tem sido com Sampaoli, Jesualdo Ferreira e Eduardo Coudet, por exemplo, é a oportunidade de aprendizado, troca de ideias, compartilhamento de estilos e evolução mútua. O futebol brasileiro terá, sempre, a ganhar.
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