Cronologia de uma relação conturbada: os altos e baixos de Fred no futebol mineiro
De início meteórico a saídas polêmicas, atacante defendeu as cores de América-MG, Cruzeiro e Atlético-MG e construiu forte relação com o estado em que nasceu
- Matéria
- Mais Notícias
Mineiro de Teófilo Otoni, Fred virou ídolo no Rio de Janeiro, mas também desenvolveu uma forte relação com o futebol de Minas Gerais ao longo dos quase 20 anos de carreira. Uma história que começou com um sucesso meteórico, mas terminou com saídas polêmicas e batalhas judiciais que se arrastam até hoje.
Relacionadas
+ Despedida de Fred: relembre momentos marcantes da carreira do camisa 9
O camisa 9, que se despede do futebol neste sábado no Fluminense x Ceará, faz parte de um seleto grupo de jogadores que defenderam as cores dos três grandes de Belo Horizonte: América-MG, Cruzeiro e Atlético-MG. Em cada clube, Fred mostrou o lado artilheiro e conquistou uma legião de fãs. A impressão final, no entanto, gerou uma grande decepção nas duas maiores torcidas da cidade.
GOL HISTÓRICO E VISIBILIDADE NACIONAL
Muito antes de chegar ao Rio e se tornar um dos maiores ídolos da história do Fluminense, Fred deu os primeiros passos no América-MG. Ainda nas categorias de base, o atacante deu mostras do craque que viria a se tornar anos mais tarde. Na Copa São Paulo de 2003, um gol do meio de campo, com incríveis 3,17 segundos de jogo, correu o mundo e se tornou o gol mais rápido da história do futebol até 2009.
O golaço em 12 de janeiro de 2003 praticamente salvou a carreira do atacante. Fred havia sido expulso na primeira rodada e tinha uma última chance de se destacar. Por conta do comportamento, o jogador precisou da ajuda do pai para entrar em campo e ter a chance naquela competição.
Depois, Fred foi promovido ao time profissional do América-MG e logo se tornou destaque da equipe. Com apenas 19 anos, estreou com gol e terminou o Campeonato Mineiro como vice-artilheiro, com 10 dos 23 gols do Coelho. No estadual do ano seguinte, outra vice-artilharia - dessa vez, com nove gols. Assim, Fred logo despertou o interesse do Cruzeiro, rival do América-MG e que havia conquistado a Tríplice Coroa no ano anterior.
INÍCIO METEÓRICO E SAÍDA COMO ÍDOLO
A transferência para o Cruzeiro foi a primeira de uma série de movimentações polêmicas na carreira de Fred. Mas, sem dúvidas, se mostrou uma decisão acertada. No novo clube, o atacante também marcou na estreia e se tornou o principal referência no ataque. Em entrevista ao LANCE!, Samuel Venâncio, jornalista mineiro e setorista do Cruzeiro, relembrou o início meteórico de Fred e destacou a forma como ele rapidamente ganhou o carinho da torcida celeste.
- Quando o Fred vem do América-MG, ele começa a fazer gol de tudo que é jeito. Foi uma passagem curta, entre 2004 e 2005, até ser negociado por um valor histórico naquela época. Aquele encaixe dele no time foi muito impressionante. Já caiu nas graças do torcedor imediatamente. Foi um ano de muitos gols. Em 2005, acho que ele fez 40 gols na temporada e saiu sem terminar o ano. Então, foi uma passagem histórica por ser muito novo, ter vindo do América-MG e ter encaixado muito bem naquele time do Cruzeiro. O torcedor guardou um carinho gigante por tudo que ele fazia - disse Venâncio.
+ Confira a tabela do Brasileirão e simule os resultados
A primeira passagem de Fred no Cruzeiro terminou em agosto de 2005. Com uma proposta de 15 milhões de euros do Lyon, o clube aceitou vender o jovem atacante, que embarcou para a França para sua primeira - e única - experiência no exterior. A torcida cruzeirense passou a acompanhar o ídolo de longe, enquanto vivia a expectativa pela volta dele no futuro.
IDA AO FLUMINENSE NÃO ABALA O CARINHO
Os planos de Fred, no entanto, eram outros. Quando deixou o Lyon e decidiu retornar ao futebol brasileiro, em 2009, o atacante desembarcou no Rio de Janeiro - e não em Belo Horizonte. Ao invés da camisa celeste, como esperava a torcida do Cruzeiro, Fred passou a vestir as cores tricolores do Fluminense.
De acordo com Samuel Venâncio, essa decisão chateou um pouco o lado azul de Minas, mas não abalou totalmente o carinho dos cruzeirenses com o camisa 9, que seguiu declarando o carinho pelo ex-clube de forma regular.
- Durante esse tempo quando ele foi para a França, ele sempre falava e voltava em Minas. Teve uma época em que ele trouxe o Benzema para vir curtir férias aqui. Sempre quando o Fred voltava, tinha aquele carinho do torcedor: “Ah, o Fred tem que voltar um dia”. E quando ele volta para o Fluminense, meio que surge uma história do torcedor ficar chateado, mas ok. “Voltou para o Fluminense, está longe ainda”. E sempre que vinha jogar em BH, ele era homenageado pelo torcedor do Cruzeiro, que pedia para tirar foto e tudo.
VOLTA A BH, MAS PARA O ATLÉTICO-MG
Essa relação de carinho passou a mudar em 2016. Após sete anos no Fluminense, clube do qual se tornou ídolo, Fred resolveu deixar o Rio e voltar a Belo Horizonte. Mas, o destino não foi o Cruzeiro e sim o arquirrival Atlético-MG. Era mais uma transferência polêmica na carreira do jogador.
Em entrevista ao LANCE!, Bob Faria, também jornalista mineiro da Rádio FM 98, relembrou que Fred foi bem recebido pela torcida atleticana, que não se importou pelo passado celeste.
- Ele chega no Atlético cercado de uma expectativa muito grande e é muito bem recebido pelo torcedor. Como um artilheiro, como uma esperança de gols. Ele chega no Atlético com essa imagem. Até porque ele não é o tipo de jogador que ficava fazendo provocações com adversário. Ele sempre respeitou muito os adversários e isso faz muita diferença. Ele sempre se referiu ao Atlético de um jeito muito respeitoso, então acho que não teve muito problema com isso.
Quis o destino que a estreia de Fred com a camisa do Atlético-MG fosse justamente no clássico contra o Cruzeiro. Conhecido por balançar as redes em estreias, o atacante manteve a escrita e comemorou bastante o gol diante do ex-clube. A partir desse momento, a relação com a torcida cruzeirense sofreu um baque.
- Quando ele tem a oportunidade de sair do Fluminense e vem para o Atlético-MG, aí o torcedor do Cruzeiro já ficou meio na bronca, mas, mesmo assim, aceitando o Fred. Principalmente pela primeira passagem que foi de muito sucesso. Mas, quando ele começa a jogar, a história vai ficando diferente - relembrou Samuel Venâncio.
IDA AO CRUZEIRO CAUSA BATALHA JUDICIAL
A passagem de Fred pelo Atlético-MG durou até o fim de 2017. Após 42 gols em 83 partidas e um título estadual - como craque e artilheiro da competição - o atacante tinha tudo para se despedir do Galo de forma amigável, mas se envolveu em nova polêmica: trocou o alvinegro pelo lado celeste de Belo Horizonte.
O que piorou a situação foi uma cláusula no contrato com o Atlético que impedia o camisa 9 de se transferir para o arquirrival. Em um primeiro momento, o Cruzeiro confirmou a existência da cláusula e se dispôs a pagar a multa de R$ 10 milhões ao Galo. Mas, aos poucos, a diretoria celeste mudou o discurso e nunca cumpriu o acordo.
- A saída dele para o Cruzeiro foi muito conturbada. O contrato dele estava terminando e veio essa diretoria que prometia fazer uma revolução no Cruzeiro. Eles fazem essa oferta para tirar o Fred do Atlético e tem a famosa carta, assinada e dizendo que o Atlético venderia o Fred para qualquer clube menos para o Cruzeiro. E se fosse para o Cruzeiro, tinha uma multa de R$ 10 milhões. E eles bancam isso, dizem que vão pagar. Até hoje não pagaram e agora essa dívida está na Justiça - disse Bob Faria, antes de completar:
- Foi muito mais um ato irresponsável e de provocação de um clube para o outro do que um ato estratégico de contratação técnica de jogador. Acho que o Fred se deixou levar por esse ato de provocação e foi uma péssima decisão que ele tomou dentro da carreira dele, porque aí ficou um ranço muito grande. Isso acabou marcando de uma forma negativa uma carreira brilhante como a do Fred.
O caso se transformou em uma grande batalha judicial que se estende até hoje entre Fred, Atlético-MG e Cruzeiro. O Galo acionou o atacante na Justiça e ganhou a disputa em primeira instância. Condenado a pagar R$ 23 milhões (valor com correção), o camisa 9 requer que a Raposa faça o pagamento, além de cobrar uma dívida de R$ 4 milhões do clube alvinegro.
REBAIXAMENTO E SAÍDA NA JUSTIÇA
Além da questão da multa contratual, a segunda passagem de Fred pelo Cruzeiro ficaria marcada por novas polêmicas. Dentro de campo, ele viveu bons momentos - inclusive, com gol de título mineiro -, mas também passou por problemas físicos e participou do rebaixamento celeste no Brasileirão 2019.
- Quando ele veio para o Cruzeiro foi um misto de desconfiança de uns e outros acreditando. Ele soube fazer um meio de campo também, se declarou e tudo. Então, ali o torcedor começou a aceitar. Ele começou 2019 fazendo muitos gols no Estadual e Libertadores, mas depois o Cruzeiro entrou no declínio que todo mundo acompanhou. Aí todo mundo começou a buscar “os responsáveis pela destruição do Cruzeiro”. Os dirigentes, claro, com o papel principal, mas quem estava no elenco acabou sendo atingido e o Fred não foi diferente nesse momento - analisou Samuel Venâncio.
Se não bastasse o rebaixamento, Fred viveu novos problemas extra-campo com o Cruzeiro. Com o clube em nova realidade esportiva e financeira, o atacante buscava uma saída amigável, mas não chegou a um acordo com a nova diretoria. O camisa 9, então, acionou a Raposa na Justiça para conseguir a liberação contratual e cobrar salários atrasados.
- O Cruzeiro vivia uma transição e foi quando eles tiveram que definir muita coisa. O Fred tinha um salário muito alto para aquele momento e os advogados dele não chegavam a um acordo com o Cruzeiro. O Fred precisava jogar também, mas não estava nos planos do Adilson Batista naquele momento. Foi quando ele acabou acionando a Justiça, pedindo a liberação para ficar livre do vínculo que tinha com o Cruzeiro e conseguiu. Só que aí acabou virando toda essa bola de neve, com várias ações na Justiça. Então, existe todo esse imbróglio que virou desde a saída do Fred em 2020 até hoje - disse Venâncio, antes de finalizar:
- Terminou da pior forma possível (relação entre Fred e Cruzeiro). Acho que hoje, se perguntar para o torcedor do Cruzeiro o que o Fred representa, o sentimento de todos vai ser de decepção e tristeza por tudo aquilo começou e tinha tudo para terminar tão bem, mas acabou terminando da forma como foi: com rebaixamento, saída na Justiça e dívidas milionárias que ficaram pelo caminho. Então, acho que não tem como, por parte do torcedor, tirar isso da memória. Foi a última impressão deixada pelo Fred em termos de Cruzeiro.
*Em colaboração para o LANCE!
Mais lidas
Newsletter do Lance!
O melhor do esporte na sua manhã!- Matéria
- Mais Notícias