A adoção do regime de torcida única nos clássicos paulistas é mais uma demonstração da falência das políticas de segurança pública voltadas para o esporte no Brasil. Não é apenas uma derrota do estado ou do futebol. É uma agressão à cidadania.
A gestão Alckmin, incapaz de resolver o problema dos confrontos das facções rivais agiu como o pai que não tem forças para proibir o namoro da filha: tirou o sofá da sala para impedir que eles se encontrem ali.
Trata-se de medida antiesportiva e, o que é mais grave, absolutamente inócua.
Antiesportiva por ferir a essência do futebol, espetáculo de cores e sons, manifestação popular única no mundo, em que a rivalidade e os duelos das arquibancadas se confundem com o próprio jogo. E exatamente o torcedor comum é a maior vítima da proibição.
Inócua pelo que revelam os próprios números: de acordo com o levantamento realizado pelo editor Rodrigo Vessoni, desse LANCE!, apenas 9 das 296 mortes registradas em torno do futebol, desde 1988, ocorreram nas arenas, assim mesmo, nenhum nos últimos 15 anos. Todo o resto foi nas imediações ou, em maior parte, em locais distantes, algumas sequer em dias de jogos.
Mas o pior disso tudo - e o que mais escancara a incompetência do poder público - é que boa parte desses confrontos são convocados na internet. As áreas em que ocorrem, em São Paulo ou em outros centros pelo país, são sabidas por qualquer leigo que olhe com pouco mais de atenção o mapa da violência na cidade. Assim como a identidade dos vândalos - até pela reincidência - é pública e notória. O que falta, portanto, para reprimi-los é inteligência, investigação e, principalmente atitude.
O enfrentamento da violência das facções nunca foi, de fato, levado à serio pelos governos, seja os estaduais, seja o federal. Estudos e propostas sempre surgiram. Mas, do Cadastro Nacional de Torcedores às delegacias especializadas nesse crime, pouca coisa saiu do papel.
Burocracia e falta de vontade política resultaram, ao contrário, em leis demagógicas e paliativas como a que proíbe bandeiras nos estádios paulistas; ou a que veta uniformes e adereços das organizadas mas não tira os baderneiros da arquibancada. Piadas de mal gosto.
A criação do Gepe, um grupamento da Polícia Militar especializado na segurança dos estádios, e do juizado especial do torcedor, ambas no Rio de Janeiro, são ações pioneiras e efetivas, exceções à regra da ineficácia das políticas em todo o Brasil.
Essas poucas experiências bem sucedidas e o histórico de fracassos demonstram que não há mais espaço para ações pontuais e por vezes oportunistas. Garantir a segurança nos estádios depende de uma ação verdadeiramente nacional, ampla e estruturada. Deve ser política de estado, instituida pela União, protegida dos rompantes e do descaso das autoridades de ocasião.