Longe do pódio e perto de adeus, Yane exalta ‘troféu’ no pentatlo moderno
Esperança de medalha, brasileira se recusa a lamentar 23ª posição no pentatlo moderno da Rio-2016, torce para popularização da modalidade no país e cogita aposentadoria em 2017
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"Ah, você é aquela menina que faz pentatlo, né? Corre, nada, monta e de vez em quando o povo bota uma bicicleta no meio?". Se você é um pentatleta provavelmente não vai ficar tão feliz com o comentário leviano. Yane Marques é o maior nome do Brasil na modalidade. Ela já ouviu muito disso na rua. Aos 32 anos, porém, lida com esperança e até comemora a atenção ainda tímida que o esporte recebe. Era esperança de medalha na Rio-2016, ficou longe de uma, mas sustenta um sorriso vitorioso, maior até do que um vencedor muitas vezes pode exibir. Pernambucana, resiliente e pioneira. A força que Yane teve para "colocar no mapa" o pentatlo moderno é sua medalha. E isso a 23ª colocação com 1.269 pontos na competição, que se encerrou nesta sexta-feira, em Deodoro, não muda.
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Yane Marques fez história logo que a Olimpíada começou. Via voto popular, ela foi escolhida para ser a porta-bandeira da delegação brasileira na cerimônia de abertura. A primeira atleta da história da modalidade a receber a honra. Medalha de bronze em Londres-2012, ela foi tratada como esperança, mas teve um desempenho ruim nas provas de esgrima e apesar da garra ficou apenas na 23ª colocação no pentatlo moderno da Rio-2016. A mesma força que a faz renunciar de tantas coisas pelo pentatlo, ainda inexpressivo em solo brasileiro, faz com que ela se negue a sair da competição com o rótulo de perdedora.
- Eu fiz o meu melhor. Infelizmente não saio com a medalha materializada no metal, mas tenho um troféu que levo para a vida inteira que é uma vida dedicada ao esporte. Uma vida de abnegação, de esforço, muita dedicação, comprometimento, responsabilidade... Abri mão da minha família para estar aqui hoje. Eu não tenho que ficar triste. Tudo valeu a pena. Já sou medalhista olímpica. Tudo que abri mão valeu a pena - comemorou.
No pentatlo conta a regularidade. Foram dois dias de prova que contaram com duelos na esgrima, apresentações no hipismo, natação e um combinado de 3.200 metros de corrida com quatro séries de tiro com pistola a laser. A pontuação em cada modalidade resulta numa pontuação final. Yane não foi bem nas provas de esgrima, não fez o suficiente no hipismo e chegou para a prova do combinado sem esperança de medalhas. Mas ela quis competir contra si mesma, mostrar diante do público que marcou boa presença no estádio de Deodoro que o pentatlo pode conquistar o coração daqueles que se permitirem conhecê-lo melhor.
- Eu curti, senti a energia, a torcida me impulsionou muito. Fiz um bom combinado. Eu fiz o melhor que podia. Sabia que eu podia passear, pois não tinha chance de medalha. Mas eu queria fazer minha melhor prova, queria salvar a minha honra. Foram muitos anos de treino, suor, dedicação, viagem, fora de casa para chegar e desacreditar? Não é do meu perfil. Se tivessem mais 500 voltas faria com a mesma força. Tudo na vida tem um propósito - apontou.
Forte como sempre, cansada como nunca. Com 20 anos de esporte, Yane Marques quer descansar, ou quem sabe respeitar os limites do corpo. Nem ela ainda sabe ao certo. A pentatleta falou em tom de despedida, prometeu cumprir a temporada de 2017 e quem sabe se aposentar depois.
- Acho que o legado que deixei para esse esporte já valeu a pena. Conseguimos lotar isso (estádio) para assistir o pentatlo, que até pouco tempo era um esporte que ninguém sabia o que era. Isso ficou. Hoje não era meu dia, não tinha que acontecer. Infelizmente não saí com a medalha que seria o reconhecimento maior, mas estou feliz, não vou ficar triste. Agora vou descansar um pouco. Não podemos sair do 10 para o 0 assim, faz mal ao corpo. O ano de 2017 será um teste, vou me sentir, se eu ver que não consigo viver sem o pentatlo, vou tentar Tóquio-2020. Se eu perceber que não tem o mesmo sentimento... Não está nada definido. Mas treino desde os 12. Isso significa não ter fim de semana, não poder dormir tarde, acordar cedo, não ter extravagâncias. Muita coisa que às vezes faz você pensar. A questão não é se vale a pena, é se eu ainda consigo encarar isso tudo. Não vou pata Tóquio só para participar. Vou para Tóquio só para escrever mais uma página na história? Eu já escrevi várias páginas. Basta. Sou eternamente medalhista olímpica e esse legado ninguém tira de mim- refletiu a brasileira.
Figura capaz de levantar a bandeira do pentatlo no Brasil, Yane não sabe o que esperar do futuro da modalidade em caso de aposentadoria. Mesmo assim, ela reconhece que o legado está feito, mas a missão ainda não está cumprida. Ela sabe que ainda pode oferecer mais ao esporte.
- Sou professora de Educação Física, vou continuar vivendo nesse mundo, depende das oportunidades. As portas que abrirem vou entrar. Tenho muito a contribuir e quero passar tudo o que vivi e aprendi. Quero dividir com as outras pessoas. Talvez o Brasil precise dar oportunidade para as pessoas. Muita gente quer treinar o pentatlo, mas e ai? Como faz? Não é simples. Tem que passar por seletiva, tem que ser escolhida ou então ter muita grana para poder pagar treino de equitação, corrida, natação. Não é um esporte muito acessível. Hoje é diferente, as pessoas falam na rua. Já foi pior. Queria que esse esporte fosse mais praticado, popular, acessível. Que as lições fiquem e que daqui dessa torcida meia dúzia de crianças na segunda-feira procurem como se faz para treinar pentatlo. Isso já vai ser uma grande vitória - contentou-se.
A medalha de ouro no pentatlo moderno ficou com a australiana Chloe Esposito (1.372 pontos), a de prata com a francesa Elodie Clouvel (1.356) e a de bronze com a polonesa Oktawia Nowacka (1.349)
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