‘O homem do coração-bola’
Luiz Fernando Gomes fala sobre o adeus de Carlos Alberto Torres
No dia em que o Brasil massacrou a Itália e ganhou o tri no México, um tio meu estava sendo enterrado no cemitério São João Batista, na Zona Sul do Rio. Morrera de infarto.
Eu tinha dez anos.
Desculpe-me o tio Armando, mas mais importante para aquele moleque do que ter perdido um parente naquele dia era assistir e ganhar a final daquela Copa. A primeira que eu acompanhei de verdade, jogo a jogo, gol a gol, vitória a vitória até a goleada histórica de 4 a 1.
De verdade, e pode parecer uma certa estupidez dizer isso, mal me recordo da cara do tio Armando. Mas jamais esqueci aquele petardo de primeira que o capitão Carlos Alberto disparou para as redes de Albertosi depois de um passe magistral de Pelé. Segundo a segundo, toque a toque, aquela jogada está imortalizada na minha mente, no meu coração, no coração e na mente de várias gerações.
Como imortal é a imagem do beijo do Capita na Jules Rimet.
Carlos Alberto não foi apenas o maior lateral direito de todos os tempos – até Djalma Santos, seu maior “rival” reconheceu isso certa vez. Foi o capitão do maior time da história da seleção brasileira. Capitão de verdade, não daqueles que só colocam a braçadeira para tirar o cara ou coroa. Conseguiu ser líder, num time de feras dentro e fora de campo, como Pelé, Tostão, Rivelino, Gerson e Clodoaldo. Tarefa para poucos, carga pesada que raros ombros sustentariam com tamanha naturalidade.
Aquela Copa não foi tudo na vida do Capita. Jogar em grandes times – o super Santos ou a Máquina Tricolor dos anos 70 - estar na hora certa no lugar certo – até nos EUA ao lado de Péle e Beckembauer no Cosmos - sempre foram marcas de sua carreira. Conquistas não foram tantas, mas de peso: três campeonatos brasileiros, dois pelo Peixe como jogador e outro pelo Flamengo como treinador; dois cariocas pelo Fluminense e uma Conmebol pelo Botafogo, o time de sua paixão.
Paixão, aliás, é o que sempre alimentou o capitão. A tudo ele se dedicou com paixão. Como jogador, como técnico, como comentarista, era apaixonado pelo que fazia. Coisa que só os que têm um coração do tamanho de uma bola são capazes de entender.