Ao L!, conselheiro fala sobre Botafogo S/A: ‘Os melhores gestores não estão entre os nossos amigos’
Marcelo Guimarães, ex-diretor de marketing e candidato à presidência nas eleições de 2015 e 2017, comentou sobre a expectativa do projeto de profissionalização do Alvinegro
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Independentemente de qualquer resultado dentro de campo, a expectativa pela criação da Botafogo S/A é um fator que não foge do dia a dia do Alvinegro. Ainda em processo de construção, a cúpula alvinegra tem até dezembro para finalizar o plano de negócios e buscar investidores interessados. Se todos os passos forem bem sucedidos, o Conselho Deliberativo votará pela separação do departamento de futebol da parte social da instituição.
A ansiedade pelo sucesso do clube-empresa é uma marca registrada da torcida nesses últimos meses de 2019. O LANCE! entrevistou Marcelo Guimarães, conselheiro do Botafogo e ex-candidato à presidência nas eleições de 2015 e 2017, uma das primeiras pessoas que levaram o assunto da profissionalização do futebol ao cotidiano do Alvinegro.
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- Fico muito à vontade com o tema. Que tenha conhecimento, sou o único político da atual geração do clube que foi antes profissional. Fiz um caminho contrário: entrei como funcionário, saí e me transformei em político. Tenho uma compreensão das duas dinâmicas e sei o quanto a política atrapalha o desenvolvimento do clube. Essa relação do não-remunerado com o profissional é algo que despende muita energia. Fui executivo do clube e depois defendi, em 2014, as teses de profissionalização. Se falava de uma maneira pouco objetiva disto. Meu programa era claro: despolitizar a célula política-executivo do clube, colocar um CEO através de rigores de mercado, não uma indicação amiga - comentou, e complementou, dando detalhes dos elementos necessários além de separar o futebol da parte social:
- Além do CEO, é preciso ter um staff também de profissionais. Marketing, finanças, gestão de pessoas, a atividade-meio. A atividade-fim do Botafogo é praticar esporte em alto nível, com ênfase no futebol e no remo, atender bem o associado e a torcida. A atividade-meio não tem nada a ver com o Botafogo, tem a ver com gestão executiva. Apostei no modelo do Barcelona de manter o staff político, mas com a chegada de um departamento executivo completamente despolitizado. Esse modelo atual não é assim, ele vai dissociar o futebol, e tem meu total apoio - completou.
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A relação de Marcelo Guimarães com o Botafogo é antiga. Em 2009, ainda na gestão Maurício Assumpção, ele foi contratado para ser diretor de marketing, função que ocupou até 2011. Quatro anos depois, se candidatou à presidência do clube, mas ficou em terceiro quando Carlos Eduardo Pereira assumiu o posto. Na eleição seguinte, voltou, novamente, como candidato da oposição, mas viu Nelson Mufarrej vencer.
Em seu modelo de gestão, intitulado de "O Grande Salto", Marcelo Guimarães não trouxe à tona a separação do departamento de futebol da parte social, mas defendia a contratação de um CEO de mercado e a presença de mais profissionais na cúpula do clube. A intenção era diminuir os voluntários não-remunerados, se aproximando dos padrões de clubes europeus.
- Desde 2015, eles (grupo Mais Botafogo) optaram, como crença, o amadorismo. Sinceramente, não consigo entender como pessoas bem intencionadas, como o Mufarrej e o CEP, não descobriram que os melhores gestores para um clube para o Botafogo não estão entre os nossos amigos. É uma irresponsabilidade um presidente nomear amigos políticos para os cargos. A gente se mata para contratar o melhor lateral-direito possível e escolhe o gestor entre os colaboradores de campanha. A questão central é o modelo adotado. Não é um ato político, mas para falar do futuro é preciso uma reflexão do passado recente - analisou.
Marcelo Guimarães classifica o sucesso da profissionalização como uma questão de urgência para a sobrevivência do Botafogo, que passa por problemas do Botafogo e, atualmente, está com um mês e meio de salários atrasados com jogadores e funcionários, além de mais R$ 700 milhões em dívidas durante os últimos anos.
- Os botafoguenses que tocaram o clube nos últimos tempos não compreenderam que a profissionalização não era um discurso político-eleitoral. Era, sim, uma urgência fundamental para que o clube tivesse uma chance de sobreviver diante de tantos desafios. Não entenderam isso, apostaram na gestão de voluntários e deu no que deu. Quero ajudar e não consigo saber como. Já me ofereci a contribuir e estou atento a tudo que acontecer - disse.
Apesar de conselheiro do Botafogo, Marcelo Guimarães divide seu dia a dia com uma empresa de marketing, no centro do Rio de Janeiro. O empresário se coloca à disposição para ajudar na profissionalização, mas entende, no momento, a maior contribuição é fazer aquilo que resulte em uma evolução rápida do projeto.
- Poucos conhecem o projeto. Gostaria muito de estar participando dessa etapa de constituição, mas se não posso ajudar, não quero atrapalhar. Adotar uma postura política para tentar me aproximar do projeto pode atrapalhar, e esse não é o momento. O que conto é que o projeto, a partir de um momento, seja revelado para que a gente possa compreender a sua amplitude. Que tenha transparência, seja elaborado por profissionais. Que as pessoas que estejam liderando essa dinâmica tenham a compreensão que os nossos amigos são os melhores nomes para tocar algo dessa magnitude - bradou.
ESTÁDIO NILTON SANTOS
Em 2019, a casa do Botafogo é mais lembrada por prejuízos de bilheteria do que por campanhas de sucesso. Os gastos excessivos do Estádio Nilton Santos são um dos assuntos mais polêmicos da atual gestão. Sobre a arena, Marcelo Guimarães analisa que a diretoria perdeu uma chance de transformá-la em um alvo para turistas.
- O Botafogo perdeu a oportunidade de transformar o Nilton Santos em um equipamento de apelo, visibilidade e atratividade internacional. Nós pulverizamos a passagem da Olimpíada pelo estádio. Qualquer arena olímpica no mundo está na rota turística das cidades. Não tivemos essa compreensão de reter legados, de constituir projetos de visitação turísticas e atrações relacionadas ao legado olímpico - afirmou.
Marcelo não acredita que os resultados inconstantes dentro de campo vão afastar possíveis investidores estrangeiros - caso, obviamente, o Botafogo não seja rebaixado. O empresário avalia o valor de mercado do Alvinegro como alto pela estrutura que o clube possui.
- Quero deixar uma mensagem de valorização ao equipamento do Nilton Santos. Sou muito otimista em relação ao valor de mercado do Botafogo. Esses resultados circunstanciais do futebol para um investidor com capacidade de enxergar além do momento atual. Se o time não ficar na primeira divisão será prejudicial. O Botafogo é uma marca espetacular, com ativos espetaculares: tem uma piscina olímpica na beira da Baía de Guanabara, um estádio de remo, o Nilton Santos. Quanto vale um equipamento com esta dimensão, se bem gerenciado? As dívidas serão avaliadas, mas o clube tem um potencial enorme - avaliou.
Durante sua passagem como diretor de marketing, em 2011, o Botafogo terminou o ano com um balanço positivo no que diz respeito às receitas de bilheteria. Marcelo afirma que o fechamento do Maracanã foi fundamental para este fator.
- Em 2011, a camisa do Botafogo rendeu mais do que a do Flamengo. Tivemos um episódio do fechamento do Maracanã, que valorizou o Nilton Santos, mas soubemos aproveitar esse fator. Foram criados produtos competitivos, como cotas de patrocínio, foi o primeiro no estádio a ter uma praça de alimentação multimarcas. Contrariamos a lógica de colocar apenas um fornecedor de alimentos - finalizou.
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Situação do Botafogo
- Comparo ao Botafogo a um doente que está numa cama de hospital. Quando você entra no ambiente, tem que fazer silêncio, não dá para contestar se a cama é boa ou não, tem que respeitar. Está todo mundo na expectativa do que virá e há uma compreensão generalizada de que o Botafogo não terá um bom destino do jeito que as coisas estão. Apostamos em um projeto que não conhecemos mas os sinais são melhores do que a realidade que vivemos.
Conhecimento do projeto de profissionalização
- Em algum momento a gente vai ter e vai ser colocado em votação. É uma mudança muito dramática no estatuto. Fico, como conselheiro, empresário e torcedor, contendo a minha ansiedade para não atrapalhar. É óbvio que queria ter mais informações, mas não quero entrar para a história como um botafoguense que não conseguiu conter essa ansiedade e atrapalhou tudo. É isso que passa pela cabeça de todo mundo. Minha cabeça é chegar e perguntar o que está acontecendo, mas é um momento de recolhimento em nome do êxito. O sucesso desse projeto é a única saída do Botafogo. Lamento que a gente não tenha percebido lá atrás que o profissionalismo era a solução.
Última reunião do Conselho Deliberativo
- Sou mais ligado ao executivo do que a política. Sou pior conselheiro do que fui diretor de marketing, me ligo mais à execução. Não consigo me empolgar com o Conselho. Me emocionei muito quando consegui entrar, para mim foi um orgulho ter 25% de votos na eleição contra o Carlos Eduardo Pereira, que vinha bem avaliado da gestão passada. A experiência não me seduz. O ex-presidente Montenegro já havia falado que essa reunião não teria nada a dizer, e foi justamente o que aconteceu. O rapaz (Laércio Paiva) levou uma apresentação cheia de princípios, mas sem meios e fins. Apenas reproduziu o que a gente já sabia à imprensa. É difícil fazer uma apresentação sem poder revelar muitos detalhes do projeto.
Modelo de gestão
- Não quero desvalorizar o voluntariado, mas é preciso ter cuidado. Nós demoramos séculos para constituir a figura do gestor e do executivo remunerado, a que dá certo no mundo inteiro. Não pode se seduzir por isto. As pessoas são remuneradas, têm objetivos e metas e trabalham por elas. É isto que eu acredito no mundo do futebol.
Confidencialidade do projeto
- Parece que eu vou jogar contra mim mesmo, mas era necessário algum nível de confidencialidade. Não pode dar publicidade nos momentos iniciais do projeto. Me causa frustração não estar ajudando, até por eu ter vinculado essa luta pela profissionalização no clube, mas, por outro lado, não quero causar turbulência. Compreendo o sigilo. O Botafogo não aguenta até a próxima eleição do jeito que está. Estamos submetidos a um momento muito particular e todos devem ter boa vontade em relação a isto.
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Marketing do Botafogo
- O marketing não foi um completo desacerto nos últimos anos. O que é equivocado é o modelo adotado. Se voltássemos no tempo, lá em 2014, eu teria duas medidas. A primeira, reunir todos os candidatos e lideranças do clube, compartilhar as decisões iniciais, atrair os torcedores para dentro do clube e fazer um processo de reflexão, tamanha a complexidade do Botafogo. Logo em seguida, faria um processo de profissionalização com a contratação pessoas sem nenhuma influência política. O marketing do clube é uma consequência de tudo.
Últimas eleições
- Basicamente, o grupo que conseguiu 65% dos votos na última eleição começou a se reunir oito meses antes da eleição, no meu escritório. Constituímos a ideia de ter um candidato de oposição, que não era eu. Com um mês para as votações, eu não o candidato, era o Durcésio (Mello) com o Mauro Sodré de vice. Eu era o gestor da campanha. O Durcésio não pôde vir e aos 45 do segundo tempo, para que não tivéssemos uma campanha sem oposição, parte do grupo lançou meu nome. Não me arrependo, mas não era o que queria. Não tinha interesse na última, e muito menos nessa, mas nunca se sabe. Quero ajudar o clube, sempre mirando na profissionalização.
Você investiria no Botafogo S/A?
- Não é uma coisa que me ocorra no momento, mesmo antes de conhecer o projeto. Preciso ter noção primeiro. Ainda que eu tivesse essa pretensão de investir, precisaria ter conhecimento dos detalhes. Me interesso em ajudar nos bastidores, estou movido pela mesma ansiedade da torcida.
Clube-empresa é o futuro do futebol?
- Não tenha dúvida. É o que os clubes estão fazendo no mundo inteiro. Não dá para dar poder e autonomia em uma empresa com a complexidade de um clube de futebol para um correligionário. Esse cara tem ocupar um lugar no Conselho. Da mesma maneira que se busca o melhor centroavante, é preciso buscar o melhor gestor de mercado. Esse modelo dos não-remunerados é oriundo do século passado. Não há espaço para amadorismo. Lamento que pessoas esclarecidas e bem intencionadas, como o Carlos Eduardo e o Mufarrej, não tenham percebido isto.
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