E(L!)eições 2018 – Vera Lúcia: ‘A CBF e a farra dos cartolas têm que acabar’
Candidata do PSTU faz críticas ao Ministério do Esporte e à entidade nacional, e promete maior democratização do setor, com criação de Academia Nacional para formar atletas<br>
O discurso de tornar o esporte acessível a todos os brasileiros marca a postura de Vera Lúcia. Entre os planos da candidata à Presidência da República pelo Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), última entrevistada na série do LANCE! com os concorrentes ao cargo, estão baratear ingressos de novas arenas, transformar instalações deixadas como legado da Rio-2016 em uma academia para a formação de atletas e evitar a “farra dos cartolas”.
Foram feitas dez perguntas por e-mail - iguais para todos - a respeito de planos de desenvolvimento e futuro do esporte no país. Nesta quinta-feira, mostraremos o que os programas de governo de Cabo Daciolo, Ciro Gomes e Jair Bolsonaro, que não responderam aos nossos questionamentos, dizem sobre o assunto.
LANCE!: Quais são os seus planos para desenvolver o esporte no Brasil, tanto de base quanto de alto rendimento?
Vera Lúcia: O esporte nunca vai ser realmente um direito num sistema baseado na exploração de 99% da população em detrimento do lucro e da riqueza de 1%. Para nós, o esporte tem sua importância não apenas no condicionamento físico e saúde da população, em todos os setores e faixas etárias, mas é antes um elemento de realização humana, assim como a cultura e a arte. Não pode ser dissociado, por exemplo, das condições concretas de vida do povo e de nosso sistema educacional.
Desgraçadamente, o que vemos em nosso país é um descaso absoluto com o esporte, que simplesmente não faz parte do cotidiano da grande massa da classe trabalhadora e do conjunto da população. Desde o ensino público sucateado, com as aulas de educação física escasseando e professores precarizados, passando pelo desemprego em massa, a pobreza, a miséria e o salário de fome com que sobrevive grande parte da classe trabalhadora e que simplesmente priva a maioria do povo ao acesso a qualquer tipo de esporte.
As federações e confederações, por sua vez, estão dominadas por castas corruptas aliadas a grandes empresas multinacionais da área, cujo maior exemplo em nosso país é a CBF, e no mundo a Fifa. O ministério do Esporte e as secretarias nos estados e municípios se resumem a cabide de empregos para apadrinhados, fisiologismo e corrupção.
Uma condição fundamental para garantir o acesso ao esporte, portanto, passa pela mudança drástica das condições de vida da população, com pleno emprego e salário digno. Mas isso, por si só, não basta. É necessário que o esporte seja tomado como uma política de Estado, com investimento em educação pública, na formação e valorização de professores e equipamentos às escolas. É preciso investir no esporte amador dos bairros e periferias, levando o esporte ao dia a dia da população e da juventude brasileira. É necessário ainda garantir o acesso ao esporte para a melhor idade nos bairros e periferias.
"É preciso aumentar o acesso ao esporte nos bairros e periferias"
L!: A edição da Medida Provisória 846 assegurou aumento dos recursos das loterias para o esporte após uma grande mobilização do setor, insatisfeito com os cortes que a MP 841 causaria, devido ao plano do governo federal de priorizar a segurança pública. Se eleita, pretende mexer na distribuição dessas verbas destinadas ao esporte? Se sim, de que formas?
A grande medida para desenvolver o esporte no Brasil é a suspensão do pagamento da dívida pública. Só no ano passado, quase a metade do orçamento público foi destinado ao pagamento dessa dívida segundo levantamento da Auditoria Cidadã da Dívida. E quanto mais é paga, maior a dívida fica. Todo esse dinheiro vaio para meia dúzia de bancos nacionais e estrangeiros. Como é que você garante investimento na saúde, educação e esporte entregando metade do orçamento para os banqueiros todo o ano? Só a suspensão do pagamento dessa dívida vai assegurar a universalização do esporte para a juventude pobre que vive nas periferias.
LEm tempos de recessão econômica, como é possível evitar que o país caia em um declínio esportivo? Pretende manter o padrão brasileiro atual de investimentos no esporte?
A crise e a recessão só existem aqui embaixo, entre os trabalhadores pobres que amargam desemprego e baixos salários. No andar de cima, entre os banqueiros e grandes empresários, não há crise. Eles continuam lucrando, recebendo dinheiro público das chamadas isenções fiscais e ainda sonegam impostos. Os bancos, por exemplo, sonegaram R$ 124 bilhões em 2017. Por tudo isso, o padrão brasileiro atual de investimentos no esporte é ridículo. É preciso mudar radicalmente as prioridades. Deixar de pagar a dívida pública, acabar com a farra dos bancos e grandes empresas para investir nas áreas sociais. E o esporte é parte disso.
A CBF esteve envolvida nos últimos anos em uma série de escândalos de gestão. ex-dirigentes já foram banidos do futebol e até presos. Que avaliação faz da atual diretoria? O governo deve intervir na gestão do futebol e da entidade? Se sim, de que forma?
São todos bandidos que deveriam estar na cadeia. Em qualquer país sério Marco Polo Del Nero, José Maria Marin e Ricardo Teixeira estariam na prisão e teriam seus bens confiscados. Coronel Nunes, o atual presidente, também é dessa turma. Veja só, ele foi um agente da ditadura e se tornou prefeito biônico no Pará durante o regime Militar. No entanto, recebe R$ 15 mil como perseguido pelo regime. Como isso é possível? O homem combateu até a guerrilha no Araguaia! Tem que banir esses parasitas do futebol.
A CBF tem que acabar. É uma agência de corruptos cartolas que mantêm essa relação colonial do futebol brasileiro com os clubes da Europa. A gente vende barato jovens e promissores craques para os clubes de lá. Quem perde com isso é torcedor.
A CBF explora de forma ditatorial e corrupta um bem que pertence a todos os brasileiros, o futebol. O movimento Bom Senso F.C, criado por atletas, já mostrou que é preciso apostar na democratização e criar formas para que a população possa participar da gestão do futebol do país.
"O atual Ministério do Esporte é uma fonte de faturar dinheiro por corrupção"
O que acha da atuação do Ministério do Esporte? Pretende manter o investimento em planos de incentivo direto aos atletas, como o Bolsa Atleta?
Um desastre, como todo esse governo Temer. Leandro Cruz Fróes da Silva é cria de Leonardo Picciani que ocupou o cargo até pouco tempo atrás. A família Picciani é o que há de mais corrupto do Rio de Janeiro. Afundaram o estado na corrupção ao lado de Cabral e Pezão. Para esses ladrões, o Ministério do Esporte é mais uma fonte de faturar dinheiro por meio da corrupção. Aliás, sempre foi assim com esse ministério que é entregue aos grandes partidos corruptos no loteamento dos cargos.
Em um eventual governo seu, o Ministério do Esporte ficará a cargo de uma pessoa com forte conhecimento sobre o assunto ou utilizada em barganha?
A gestão do esporte do país precisa estar sob o controle da população trabalhadora. Por esse motivo nós defendemos que os trabalhadores governem por meio de Conselhos Populares, criados em locais de moradia, estudo e trabalho. Penso que não é apenas o Ministério que precisa realizar uma gestão executiva do esporte. Acredito que é necessário que essa gestão seja realizada também por um Conselho Popular que permita a participação efetiva do povo nas discussões e gestão do esporte brasileiro. É esse comitê que vai avaliar quais são as prioridades do esporte nacional, onde serão investidos os recursos financeiros.
O governo federal é responsável pela gestão de boa parte das instalações utilizadas nos Jogos Rio-2016, por meio da Autoridade de Governança do Legado Olímpico (AGLO). Como pretende administrá-las e que medidas tomará para que a população e os atletas do país usufruam do legado do megaevento? A AGLO será mantida caso seja eleito?
A AGLO serve para negociar com a iniciativa privada o uso das instalações esportivas criada com o dinheiro público. Ou seja, serve para que grandes empresários lucrem com aquilo que foi construído com o dinheiro do povo.
As instalações dos Jogos Olímpicos precisam ser usadas pelo povo trabalhador e de graça. Para que isso não vire um grande elefante branco, seria necessário fazer com que essa infraestrutura seja destinada ao uso de estudantes das escolas pública e universidades. As instalações esportivas precisam se tornam uma Academia Esportiva nacional para formação de atletas entre os estudantes do ensino público.
"O futebol tem de ser devolvido ao povo. Somos contra a privatização das Arenas e preços altos"
Quais são seus planos para evitar que o legado da Copa do Mundo de 2014 seja abandonado?
A Copa do Mundo de 2014 foi uma roubalheira que beneficiou as grandes empreiteiras em enormes superfaturamentos. O caso mais absurdo foi o do estádio Mané Garrincha em Brasília. De um custo inicial estimado em R$ 631 milhões, acabou ficando em R$ 1,4 bilhão, mais que o dobro.
O superfaturamento das obras públicas não se limitou aos estádios, mas também às chamadas obras de mobilidade urbana. O exemplo mais trágico foi o viaduto que desabou em Belo Horizonte em 2014 matando duas pessoas. O Tribunal de Contas do Estado avalia que o custo do viaduto foi superfaturado em 350%.
Além disso, muitas obras foram realizadas medida a “limpeza urbana” realizada pelos governos. Bairros pobres e favelas foram removidas para dar lugar ao investimento do capital imobiliários. Tudo isso foi o legado dessa Copa.
Hoje, os estádios são destinados à iniciativa privada que realiza grandes eventos nas chamadas “Arenas”, como shows. Os jogos de futebol são praticamente inacessíveis ao trabalhador em razão do alto custo dos ingressos. Na verdade, a Copa também expulsou o povo pobre dos grandes estádios.
O futebol precisa ser devolvido ao povo. Somos contra a privatização das Arenas. É o Estado que deve assumir sua gestão. Aquelas que correm risco de se tornarem elefantes brancos, devem abrigar eventos esportivos realizado pelas escolas e universidades públicas. Também defendemos a redução do preço dos ingressos.
O governo brasileiro vem "socorrendo" clubes financeiramente em medidas como o Profut. O que acha do programa? O seu governo dará suporte aos clubes do pais? De que formas?
Esse programa é uma espécie de Lei de Responsabilidade Fiscal voltada para os clubes. O programa permite renegociar e reduzir o valor total das dívidas tributárias de vários clubes e incluiu punições esportivas para aqueles que continuassem a desrespeitar acordos financeiros.
No entanto, a lei não passou de uma peça de fantasia e que foi, até sua aprovação, toda modificada. Os clubes receberam um presentão com os descontos de dívidas sonegadas por décadas. Depois disseram que não tinham como pagar os impostos devidos. Como se não bastasse, continuaram a receber patrocínios de estatais como a Caixa Econômica e Petrobras. Foram mais de R$ 700 milhões em 2015.
É preciso acabar com a farra dos cartolas dos clubes e cobrar as dívidas tributárias. Também não devemos dar nem mais um tostão de dinheiro público para os clubes.
A partir de 2019, clubes que não tiverem um plantel de futebol feminino não poderão disputar a Libertadores. Acha que essa medida é um incentivo eficaz para o desenvolvimento da modalidade no país? Em um eventual governo seu, os esportes olímpicos e o futebol feminino terão alguma atenção?
Sou super a favor. No país do futebol, e que ainda tem Marta, uma das maiores jogadoras da história, a mulher não tem vez em campo. Isso é um absurdo. Alguns clubes, inclusive, já usaram as atletas para posarem seminuas para calendários.
O futebol feminino do Brasil é um dos melhores do mundo, apesar de não ter um décimo do incentivo do futebol masculino. Não é possível que o mundo todo saiba disso e nós, por aqui, não façamos nada. Está bem evidente que o machismo freia crescimento do futebol feminino no Brasil. Não interessa aos cartolas investirem nessa modalidade. Por isso é preciso fazer essa reparação histórica. Portanto, apoiamos qualquer medida que promova o futebol feminino e que combata nossa cultura machista.
QUEM É ELA
Nome completo: Vera Lúcia Pereira da Silva Salgado
Nascimento: 12-09-1967 - Inajá (PE)
Vice: Hertz (PSTU)
Partido: Partido Soclalista dos Trabalhadores Unificado (PSTU)
Ocupação declarada: Outros
Bens declarados: R$ 20.000,00
NO ESPORTE
Time de coração: Confiança-SE
Ídolo no esporte: Não respondeu